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Ecos da guerra fria

JAIME SPITZCOVSKY COLUNISTA DA FOLHA

Herdeiros dos czares e dos ditadores soviéticos enfrentam uma das situações geopolíticas mais adversas da história russa. Ficaram para trás os tempos de bonança territorial, quando a Rússia contava com "zonas-tampão" polpudas para garantir ganhos políticos, econômicos e, sobretudo, uma vantagem militar a defender seus centros de poder, como Moscou e São Petersburgo.

No século 21, o Kremlin lamenta perdas de satélites na Europa oriental, testemunha o avanço da influência de EUA e Alemanha na Europa e ainda teme a ascensão do vizinho oriental, a China.

Vladimir Putin chegou ao poder com a missão de estancar a decadência, após os turbulentos anos de Mikhail Gorbatchov (1985-91) e Boris Ieltsin (1991-99). Colheu bons resultados econômicos, graças a petróleo e gás, e domou a instabilidade política ao fazer recuar a incipiente democracia russa. Atravessa agora fase difícil de seu reinado.

Putin se gabava de ter recuperado peso internacional para Moscou e de ter sufocado o separatismo e o terrorismo no Cáucaso. A sangrenta guerra da Tchetchênia tornou-se marca do putinismo.

Mas a mão pesada do Kremlin se mostra inútil contra o avanço de rivais ocidentais em solo europeu.

Desde o fim da Guerra Fria, EUA e Alemanha implantam a estratégia, via União Europeia e Otan, de empurrar a influência russa para trás. Sob liderança germânica, o bloco europeu encampou 13 países de 2004 a 2013, em sua maioria na Europa oriental, como Romênia, Polônia e Bulgária. Flerta agora com a Ucrânia.

Do Kremlin, sinais de incômodo profundo substituíram as esperanças de cooperação estratégica com Washington e Berlim. A opção inicial russa era uma aproximação dos rivais da Guerra Fria, para obter investimentos e tecnologia. Desistiram de aguardar.

Responsável pela pá de cal na moribunda URSS, Ieltsin esperava ser recompensado por um Plano Marshall para a cambaleante economia russa dos anos 90. Adotou uma diplomacia pró-Washington, apesar de momentos de atrito. Seu sucessor, Putin, foi o primeiro chefe de governo a dar solidariedade a George W. Bush no 11 de Setembro.

A Casa Branca rejeitou as investidas russas. Vê Moscou mais como ameaça do que como parceiro, e mesmo Barack Obama não conseguiu livrar o establishment dos EUA das lentes da Guerra Fria.

Com as negativas em inglês, Moscou passou a privilegiar laços com a China. O comércio bilateral decolou, as relações políticas se aqueceram. Os russos fornecem aos chineses armas e petróleo, numa estratégia que provoca calafrios em diversos setores da elite moscovita.

Pululam na capital russa as avaliações sobre ameaças vindas de Pequim. O histórico dos dois países exibe mais rivalidade que cooperação. Em 1969, por exemplo, quase protagonizaram uma guerra nuclear, devido a disputas territoriais no leste asiático.

Regiões siberianas e do extremo oriente da Rússia avistam a trepidância das reformas econômicas da China. Seus líderes advertem o Kremlin da "invasão silenciosa" chinesa, por meio de comerciantes que atravessam a fronteira e lotam mercados.

No jogo triangular entre os grandes protagonistas das últimas seis décadas, a Rússia enfrenta seu momento mais adverso. EUA e China crescem, direta ou indiretamente, nas fronteiras de um império que, do ponto de vista geopolítico, já viveu dias bem mais confortáveis.


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