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Opositora compara governo Maduro à ditadura no Brasil

Em visita ao Congresso, venezuelana María Corina Machado diz que Caracas vive regime 'militarista' e que memória dos 50 anos do golpe de 64 une os dois países

FABIANO MAISONNAVE ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA AGUIRRE TALENTO DE BRASÍLIA

Em visita a Brasília dias após ter perdido o mandato de deputada, a líder opositora venezuelana María Corina Machado comparou o governo de Nicolás Maduro à ditadura militar brasileira (1964-1985) e defendeu a renúncia do presidente como a melhor saída para a crise política e econômica do país.

"Que então avancemos até aí [a renúncia]", disse Corina, em entrevista à Folha, pouco antes de visitar o Congresso, a convite do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES).

Ferraço a recebeu no aeroporto de Brasília. Na saída, ambos foram cercados por um pequeno grupo de manifestantes do MST. Aos gritos, disseram que ela não era "bem-vinda" e evocaram o presidente venezuelano Hugo Chávez, morto em 2013.

Na Comissão de Relações Exteriores do Senado, Corina também presenciou um protesto de manifestantes do MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), que a chamaram de "golpista". Eles foram retirados da sala para que ela pudesse falar.

Na audiência, Corina afirmou que o sentimento "das famílias destruídas e da tortura" durante o regime militar brasileiro é "o que a Venezuela vive agora".Ela fez o mesmo paralelo, antes, à Folha. Corina também pediu ajuda de governos da América Latina, inclusive o Brasil, aos quais acusou de "dar as costas" à crise venezuelana.

Após passar pelo Senado, Corina foi ao plenário da Câmara, onde ouviu aplausos de deputados da oposição e vaias dos governistas.

Corina foi cassada na semana passada pela Assembleia Nacional, controlada pelo chavismo. A alegação foi de que ela representou outro país (Panamá) em sessão da OEA (Organização dos Estados Americanos) sem autorização prévia do Parlamento, o que é inconstitucional.

Abaixo, os principais trechos da entrevista.

Folha - A sra. encabeça um movimento cujo slogan é #LaSalida ("A Saída") e afirma que a Venezuela está "em transição à democracia". A solução é a renúncia de Maduro?
María Corina Machado - "A saída" é a mudança rumo à democracia, é terminar um pesadelo que está gerando muitas perdas humanas, institucionais e físicas a cada dia que passa.
A Venezuela despertou. Até dois meses atrás, o mundo acreditava que havia uma Venezuela satisfeita, resignada ou aterrorizada. Mas o chamado dos estudantes gerou um movimento cívico sem precedentes.

É possível fazer a transição com o chavismo no poder?
O regime Maduro tem demonstrado que não vai mudar suas políticas. Havia opções, mas o que decidiu? Radicalizar e reprimir. Por isso, exigimos, para um espaço de diálogo, que não seja uma armadilha para desmobilizar o povo e ganhar tempo.
Está na hora de chamar a coisa pelo nome. Há um regime que persegue todos que pensam diferente, não importa se dirigente estudantil ou político, sindicalista ou jornalista. Está aí o caso do [líder oposicionista preso em fevereiro] Leopoldo López e de dois prefeitos presos por se negaram a reprimir atos.
É um governo que dispara contra estudantes, tortura, censura. Como se chama um regime assim? Ditadura. Diante disso, temos o direito de exigir uma mudança de regime no marco da Constituição, que nos oferece vários instrumentos.

Por exemplo?
Em primeiro lugar, o referendo revogatório; em segundo, uma emenda à Constituição; terceiro, uma Assembleia Nacional Constituinte; em quarto, a exigência de renúncia.

Qual sua opção preferida?
A que possa ocorrer da maneira mais rápida e que, com isso, possamos evitar violência, morte e destruição.

A saída mais rápida seria a renúncia de Maduro.
Que então avancemos até aí. Todas as saídas, todas as opções constitucionais requerem uma grande mobilização coletiva, pacífica e organizada na rua. E isso é o que ocorre hoje na Venezuela. E a comunidade internacional é importante, pois tem sido um dos pilares do regime de Maduro. Ele cruzou uma linha vermelha com sua política de violação e tortura.

A sra. não mencionou a via eleitoral como uma das quatro opções para mudar de regime.
Não, todas levam a uma via eleitoral, no fim das contas. Se há uma renúncia, a Constituição estabelece uma eleição em 30 dias. Vamos à via eleitoral porque somos democratas.

Por que a oposição não consegue reunir multidões nos bairros mais pobres de Caracas?
As zonas populares estão submetidas a um controle político e pessoal pelos "coletivos do terror", que são grupos paramilitares.
No bairro 23 de Janeiro [tradicional reduto chavista, em Caracas], nas últimas semanas, soou uma forma de protesto contundente e comovedora que são os panelaços. Sabe o que fizeram os paramilitares? Dispararam contra as janelas de onde se ouviam as panelas. Marcaram com pintura as portas das moradias onde suspeitavam que houvesse manifestantes.

Policiais também foram mortos nos atos. Há um setor da oposição que usa a violência?
Testemunhos e as fotografias revelam que os que têm disparado provêm do regime ou são induzidos pelo regime.

Uma comissão da Unasul esteve em Caracas, onde foi proposto um grupo de três chanceleres (Brasil, Colômbia e Equador) para facilitar o diálogo. Isso pode ajudar?
A Unasul se colocou ao lado do regime. Antes dessa visita, houve declarações de chanceleres da Unasul manifestando seu apoio incondicional a Maduro. Essa é uma instância objetiva, que gera confiança no povo venezuelano? A resposta é não.

O Brasil coassinou nota do Mercosul que criminaliza as manifestações. A sra. acredita ser possível mudar a posição do governo Dilma Rousseff?
Tenho certeza de que isso ocorrerá. E a mudança virá pelo povo, pelos brasileiros. Sei que vocês entendem o que ocorre na Venezuela. Vocês valorizam o respeito aos direitos humanos, ao trabalho, à propriedade, à liberdade de expressão, ao pluralismo.
É o momento em que se completam 50 anos do golpe de Estado no Brasil. Sei que isso recorda o drama de viver submetido a uma ditadura. O medo, a humilhação, a dor, como a família se degrada. Este momento une o povo brasileiro ao venezuelano.
Hoje, vivemos um governo militarista, que pretende repetir torturas, perseguição, violação dos direitos humanos. É por isso que, mais do que nunca, os dois países precisam se unir.

A sra. se comunicou com alguém do governo brasileiro? Há algum encontro previsto?
Não nesta visita. Enviei cartas à presidente Dilma, mas ainda sem resposta.


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