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Análise - Vaticano

'Opostos', novos santos têm semelhanças

Nem João 23 era tão modernizador nem João Paulo 2º tão inflexível; Francisco pretende superar essa dicotomia

REINALDO JOSÉ LOPES COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

É preciso um esforço considerável para não enxergar certo simbolismo político na canonização conjunta de João 23 e de João Paulo 2º. Afinal, faz tempo que esses papas têm sido usados como estandartes de duas correntes opostas no seio da Igreja Católica, respectivamente conhecidas (de forma imprecisa) como a dos "progressistas" e a dos "conservadores".

Segundo essa leitura política do pontificado dos dois, João 23 é o papa da "revolução que não terminou".

Responsável por iniciar, em 1962, o Concílio Vaticano 2º, reunião dos bispos de todo o planeta que abriu o catolicismo ao diálogo com o mundo moderno, o italiano João ficou conhecido como "il papa buono" ("o papa bondoso").

Dizia que era preciso perceber "os sinais dos tempos" e que a igreja não podia se render aos "profetas da desgraça", que só viam decadência na modernidade.

João morreu enquanto o concílio ainda estava em sessão, o que, segundo os participantes mais radicais, acabou fazendo com que os resultados fossem mais tímidos do que se antevia.

Desse ponto de vista, João Paulo 2º às vezes é visto como o pontífice que refreou de vez as energias renovadoras do Vaticano 2º (ou, para defensores, como o papa que deteve a anarquia dos excessos conciliares).

Enquanto, nos anos 1960 e 1970, havia um movimento crescente em favor da colegialidade (maior autonomia para as igrejas locais) e teólogos católicos passaram a desenvolver ideias menos ortodoxas sem grandes represálias, o papa polonês foi um defensor vigoroso da autoridade central de Roma e deu puxões de orelha célebres nos grandes nomes da Teologia da Libertação (que defende um compromisso político "de esquerda" para a igreja).

CARICATURA E VERDADE

Essas descrições opostas dos dois "novos" santos, embora se baseiem em fatos, também têm algo de caricatura. É importante lembrar o que tinham em comum, tanto no espectro "progressista" quanto no "conservador".

João 23, por exemplo, era um católico italiano tradicional até a medula em sua piedade pessoal, e nunca cogitou acabar com a liturgia da missa em latim -decisão que acabaria vindo do Concílio.

Por outro lado, se ele foi o primeiro papa a "quebrar o gelo" do diálogo com os não cristãos, abençoando pessoalmente a principal sinagoga de Roma, João Paulo 2º foi o primeiro pontífice a rezar tanto dentro de uma sinagoga (depois do judeu são Pedro, é claro) quanto dentro de uma mesquita e, de quebra, a se unir até ao dalai-lama em oração na cidade italiana de Assis, terra de são Francisco.

Os dois papas também se assemelham nas demonstrações físicas de ternura com os fiéis, descendo do pedestal no qual a figura do pontífice costumava ficar; e na condenação de toda forma de violência (nesse ponto, João Paulo 2º foi mais radical, ao chegar perto de afirmar que nenhum tipo de guerra ou de sentença de morte eram justificáveis).

O que significa, então, canonizar os dois juntos?

Para o papa Francisco, que já condenou tanto os excessos "à esquerda" quanto os "à direita" na igreja, que é preciso superar esse tipo de dicotomia se o catolicismo deseja, de fato, manter sua vitalidade.


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