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Clóvis Rossi

Finanças e gente, incompatíveis

Portugal sai de um programa supostamente de salvamento, que causou três anos de grave retrocesso

O governo português anunciou domingo que, no dia 17, sai do programa dito de salvamento implementado pela chamada troika (União Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional).

Só é uma boa notícia no mundo contemporâneo, em que o importante não são pessoas, mas finanças.

Para as finanças, o fim do programa sinaliza que Portugal pode vender papéis no mercado sem pagar juros obscenos. Hoje, o título português de 10 anos paga apenas 3,6%, o mais baixo da história, praticamente um terço dos 10,6% que o papel alcançou em 2011, ano em que o país foi obrigado a pedir resgate.

Em parte, ao menos, os juros mais baixos devem-se à redução do deficit público, que caiu, no ano passado, para 4,9% do PIB, contra 6,4% em 2012.

Mas aí terminam as boas notícias. O programa dito de salvamento não salvou os portugueses, especialmente os jovens. E, ainda por cima, deixou a dívida pública em 129% do PIB, quando era de 108% em 2011.

O desemprego para quem tem menos de 25 anos atinge estonteantes 35%. O nível geral é menor (15,3%), mas, mesmo assim, é insuportável. E foi crescente nos anos de "salvamento": em 2010, último ano completo antes da troika, era de 11,7%. Era inevitável que o desemprego aumentasse com o programa de austeridade extrema imposto a Portugal: a economia foi amarrada a ponto de ter retrocedido 1,3% em 2011, outros 3,2% no ano seguinte e mais 1,4% em 2013.

Se se preferir um olhar a mais longo prazo, desde o início da crise global em 2008, Portugal perdeu 7,1% de sua riqueza até 2013, uma porcentagem mais própria de países que passam por guerras ou por fenômenos naturais devastadores.

Sair do programa acertado com a troika significa o fim dos problemas? Não necessariamente. "O país regressa aos mercados, mas os portugueses têm que suportar mais sacrifícios e isso só acontece porque o programa falhou nos seus objetivos fundamentais", diz, por exemplo, António José Segura, secretário-geral do Partido Socialista, hoje na oposição, mas que iniciou o programa de austeridade (e foi derrubado nas primeiras eleições após o começo da história).

É claro que a oposição tem mesmo que criticar, mas, no caso, não dá para discordar do líder socialista quando ele diz que "o país está mais endividado, tem mais desemprego, tem mais pobreza, está mais desigual e voltou a ser um país de emigração".

A propósito de emigração, o demógrafo Mário Leston Bandeira diz que Portugal "está a iniciar ciclo semelhante ao do final dos anos 50, quando os portugueses se lançaram à Europa". Agora, saem também para outros lados, inclusive Angola, a antiga colônia africana da qual os portugueses fugiram quando da independência em 1975.

Até os brasileiros aderiram à fuga: só em 2012, quase 8.000 dos 111 mil brasileiros residentes em Portugal deixaram o país.

Como o crescimento previsto para 2014 é de magro 1,3%, fica claro que levará anos, ou décadas, para Portugal se curar do salvamento.


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