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Entrevista - Montek Ahluwalia

História será mais bondosa ao julgar o governo da Índia

De saída após derrota esmagadora nas eleições, ministro reconhece que fim de subsídio à gasolina influenciou resultado

PATRÍCIA CAMPOS MELLO ENVIADA ESPECIAL A NOVA DÉLI

O governo indiano, que levou uma surra nas urnas na sexta (16), tem problemas de política econômica muito semelhantes aos do Brasil. A Índia custou a retirar uma série de estímulos ao consumo criados para amortecer os efeitos da crise de 2008 e hoje sofre com piora do deficit; enfrenta baixo crescimento (o que, na Índia, é 5%) e inflação em alta, acima de 8%; segurou os preços dos combustíveis e agora tenta reajustá-los.

É o que conta Montek Singh Ahluwalia, 70, ministro do Planejamento e braço direito do premiê Manmohan Singh, que está de saída. Abaixo, trechos da entrevista concedida à Folha em Nova Déli:

Folha - Quais os principais desafios do próximo premiê?
Montek Ahluwalia - A economia passa por uma desaceleração. Parte disso reflete a desaceleração global dos emergentes, mas muito se deve a limitações domésticas. Tivemos oito anos de alto crescimento, de cerca de 8%, e aí batemos em um limite, justamente quando a situação global era desfavorável.
Não podemos fazer nada sobre a situação global, mas temos de resolver os problemas domésticos. A avaliação do novo governo vai depender de quão rápido ele conseguirá levar a Índia de volta ao alto crescimento. Muita gente espera que voltemos rapidamente ao crescimento de 8%.

Essa expectativa é realista?
Os fundamentos da Índia são fortes: alta taxa de poupança, setor privado dinâmico. Mas, quando há uma desaceleração, a percepção dos investidores demora a ser revertida. Acho que em um período de dois anos, 2014 e 2015, é possível levar o crescimento para acima de 7%.
Muita gente estava esperando as eleições acabarem para ver quanta incerteza política haveria no novo governo. Esta eleição deu um mandato muito claro [grande maioria], então o novo governo pode reduzir a incerteza.

O sr. acha que o governo que está de saída não será reconhecido pelo trabalho feito para "limpar" o sistema e o próximo é que colherá os frutos?
O premiê Manmohan Singh deu a entender isso, quando disse que a história será mais bondosa ao julgá-lo do que a mídia de hoje.

A Índia tem uma lei de responsabilidade fiscal inspirada na brasileira. Está funcionando?
A lei existe há anos, mas sozinha não garante responsabilidade fiscal. Ela só determina que o não cumprimento da meta fiscal precisa ser informado ao Parlamento e aceito. Infelizmente, se a meta fiscal não é cumprida, não há punição automática. O Parlamento não apoia medidas duras para manter a meta, como cortar os subsídios para a energia, por exemplo.

A meta fiscal chegou a ser cumprida?
No início do governo, foi, e o deficit do Orçamento caiu. Mas, quando veio a crise de 2008, permitiram que o deficit do Orçamento aumentasse porque a percepção era que precisávamos de estímulo fiscal. O estímulo funcionou bem durante dois anos, mas deveríamos tê-lo retirado gradualmente. Isso não foi feito.

No Brasil, medidas de estímulo ao consumo foram adotadas após a crise; depois, foi difícil eliminá-las, e elas causaram piora do problema fiscal. É isso que ocorreu na Índia?
Exatamente. No nosso caso, a alta do deficit não foi principalmente por aumento de gastos do governo, mas sim devido às reduções de impostos para estimular a demanda e à alta nos subsídios, principalmente da energia.

Há uma grande discussão no Brasil hoje sobre como o governo manteve os preços de gasolina e diesel controlados, abaixo do preço mundial, e como isso prejudicou a Petrobras e outros setores.
Aqui é o mesmo. Quando a cotação do petróleo subiu, o governo não deixou o preço dos derivados subir no país. Há cerca de dois anos, começamos a reajustar os preços internos porque a situação era insustentável. A gasolina deixou de ser subsidiada.

Então agora a gasolina é vendida a preços semelhantes aos internacionais?
Na verdade é até mais cara para o consumidor, por causa dos impostos.

Qual foi a reação da população ao reajuste da gasolina?
Inicialmente, muito negativa, mas depois de alguns meses as pessoas aceitaram.

E qual o impacto do reajuste de combustíveis na inflação?
O impacto foi grande nos últimos dois anos. E o impacto político de inflação mais alta é sempre negativo.
É importante, porém, refletir que, nos últimos dez anos, houve ganho real de renda bem maior que anteriormente, mas a inflação também era muito maior, e as pessoas veem isso de forma negativa.
Elas não se dão conta de que, se realmente começarmos a combater a inflação, é possível que o crescimento real da renda vá desacelerar por um tempo. É difícil explicar isso para o público.

O governo acaba de perder as eleições, e a insatisfação com crescimento e preços altos foi um fator. A eliminação dos subsídios à energia teve um grande custo político?
Quando os subsídios começaram a ser cortados, a maioria dos políticos disse que o custo político seria enorme. Mas não levaram em conta a consequência de não fazer isso. Se pudéssemos arcar com esse subsídio implícito, talvez tivéssemos mantido. Mas, se o deficit fiscal maior levasse à perda de confiança dos investidores, isso também teria enorme custo político.

Leia a íntegra
folha.com/no1456845


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