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Matias Spektor

O risco de atrapalhar

Nossa sociedade pode pagar um preço elevado caso "paz e segurança" fique fora de texto da ONU

Quando a ONU aprovou oito metas de desenvolvimento na virada do milênio, ninguém imaginou seu impacto no Brasil.

Esse acordo internacional deu a autoridades federais e estaduais de todos os partidos políticos um arcabouço comum para criar, medir, comparar, avaliar e comunicar ao público políticas inteligentes de inclusão social.

Como essas metas vencem no próximo ano, logo mais a Organização das Nações Unidas começa a definir suas substitutas.

A negociação será marcada pelo troca-troca típico de qualquer ambiente parlamentar, mas uma disputa já é certa: a decisão de incluir ou não as expressões "paz e segurança" e "acesso à justiça".

Quem defende a inclusão são os países desenvolvidos, enquanto a rejeição frontal fica por conta de Rússia e os países-membros da Liga Árabe.

Os africanos aceitam apenas em parte. Junto com Egito, Índia e o resto da América Latina, o Brasil trabalha para diluir o conteúdo das expressões ao longo do texto, sem dar-lhes o estatuto de objetivo formal.

Por quê?

O Brasil desconfia das intenções dos países ricos.

Teme que eles contabilizem o dinheiro investido em missões de paz e operações militares como se "ajuda para o desenvolvimento" fosse, um truque atrativo em tempos de contenção de gastos.

Teme ainda abrir uma brecha legal para que as grandes potências transfiram a agenda do desenvolvimento da alçada da Assembleia Geral, onde o Brasil tem influência, para o Conselho de Segurança, onde não tem.

A preocupação brasileira é legítima. No entanto, nossa sociedade pode pagar um preço elevado caso "paz e segurança" e "acesso à justiça" fiquem fora do texto final.

Isso ocorre porque os enormes avanços sociais dos últimos anos ainda esbarram numa realidade nefasta: temos taxas de homicídio típicas de uma nação em guerra, lideramos o ranking regional de mortes de jornalistas no exercício da profissão, nosso sistema prisional convive com a tortura e o abuso e o arbítrio das forças de segurança é exasperante a ponto de levar centenas de milhares de brasileiros à rua.

A distribuição desse horror é desigual, afetando a maioria pobre muito mais do que a minoria rica.

Assim como a chancela da ONU para "erradicação da pobreza", "acesso universal à educação" e "combate à mortalidade infantil" fez toda a diferença no ambiente de políticas públicas dos últimos quinze anos, "paz e segurança" e "acesso à justiça" dariam força a uma agenda urgente.

Sem essas expressões, ficará mais difícil o trabalho do próximo ocupante do Palácio do Planalto, seja Dilma ou a oposição.

Não se trata de seguir os países ricos a reboque nem de abdicar do esforço para impedir que o tema do desenvolvimento seja dominado pelos grandes.

Nos meses de negociação que vêm pela frente, haverá espaço para que a diplomacia brasileira encontre uma fórmula criativa capaz de alinhar suas prioridades geopolíticas às enormes necessidades internas.


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