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Análise

Existem "progressistas" no conclave que vai eleger o novo papa?

Hoje, chamamos de 'progressista' o católico que achar que são exageradas as opiniões de bento 16 sobre o uso da camisinha

MARCELO COELHO COLUNISTA DA FOLHA

Vejo a lista dos possíveis sucessores de Bento 16, com os rótulos de sempre: "conservador", "de centro", "progressista". Quase nenhum "progressista", aliás: dos nomes que vêm aparecendo na Folha, apenas o cardeal Maradiaga, de Honduras (ao lado do "liberal" Schönborn, arcebispo de Viena), quebra a hegemonia de centro-direita.

Existem ainda "progressistas" na cúpula da igreja? O conclave para escolher o próximo papa conhecerá um embate entre "conservadores" e "progressistas"?

A resposta parece ser predominantemente negativa. Depois de 30 anos de domínio de Ratzinger e de João Paulo 2º, nada indica que tenha chegado a hora de uma revanche da Teologia da Libertação, por exemplo.

Seria de esperar que, no Brasil pelo menos, a Teologia da Libertação ainda tivesse influência entre os bispos. Mas os tempos são outros, embora nem sempre as mudanças teológicas sejam perceptíveis para quem não é religioso.

Tome-se um documento importante da CNBB (Conferência dos Bispos do Brasil), lançado não faz muito tempo. São as "Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil", para o período de 2011 a 2015.

Aparentemente, estamos diante de pura fraseologia católica: o objetivo geral da CNBB é "evangelizar, a partir de Cristo e na força do Espírito Santo, como igreja discípula, missionária e profética, alimentada pela palavra de Deus e pela Eucaristia, à luz da evangélica opção preferencial pelos pobres, para que todos tenham vida, rumo ao Reino definitivo".

Nada de novo, pode-se imaginar -e a manchete preferida por um jornalista seria provavelmente a de que a CNBB "mantém a opção preferencial pelos pobres", sem subordinar-se ao direitismo de Ratzinger.

Toda a diferença, entretanto, está em outro ponto. Por incrível que pareça, a marca de Bento 16 está na frase "a partir de Cristo". A "opção preferencial pelos pobres" não é problema do ponto de vista teológico.

O problema é que, antigamente, o "progressismo" falava que a ação evangelizadora surge "a partir da realidade", e não "a partir de Cristo". Tanto que uma das palavras de ordem da Ação Católica era "ver, julgar, agir".

Ou seja, se formos capazes de "ver" a realidade, saberemos o que há a fazer para torná-la mais cristã. A ênfase mudou com Bento 16 -a realidade não se oferece sozinha como "errada" ou "certa". É à luz dos ensinamentos de Cristo que podemos julgar e agir.

A sutileza, eminentemente teórica, ainda alimenta discussões. Mas o fato de que tenha entrado no documento da CNBB, com a "opção preferencial pelos pobres" posta no fim da frase, demonstra o predomínio de Ratzinger sobre o que se julgaria "progressismo" na Igreja brasileira.

Progressismo, aliás, em relação a quê? Há 30 anos ou mais, a questão era saber qual a atitude da igreja diante de revoluções de esquerda. Hoje, chamamos de "progressista" o católico que achar exageradas as opiniões de Bento 16 sobre a camisinha.

Tudo indica que as cisões do próximo conclave não são as mesmas que opõem a Igreja Católica ao conjunto da opinião leiga.

Camisinha, casamento gay, celibato dos padres e aborto podem afastar muita gente do catolicismo. Mas será que resolver esses problemas está na agenda de algum cardeal?

Se há cisões entre os eleitores do novo papa, certamente passam por outros assuntos e outros critérios (o geográfico, a importância ou não de um nome "popular", o peso da Cúria) que não esses.


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