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Opinião

Líder venezuelano era o Monty Python da América Latina

JOÃO PEREIRA COUTINHO COLUNISTA DA FOLHA

Confesso: vou ter saudades de Hugo Chávez. Na longa galeria de líderes populistas, ele era uma espécie de Monty Python latino-americano.

E desconfio que o seu programa de TV, "Alô, Presidente", terá um dia o "best of" que merece.

Só um grande comediante, como Chávez, seria capaz de atribuir ao capitalismo a ausência de vida em outros planetas (juro). Ou culpar os Estados Unidos pelo terremoto no Haiti em 2010 (idem).

Verdade que o designado sucessor, o vice Nicolás Maduro, pretende trilhar o caminho do patrono: o câncer que matou o presidente, disse ele, também foi um complô de Washington.

Mas Maduro, coitado, não tem a inteligência do original.

Disse inteligência? Repito. Porque Chávez não era, contrariamente ao que se pensa ou escreve, um apedeuta e um tosco.

Pelo contrário: depois de tentar chegar ao poder pelo clássico golpe de Estado em 1992 (como um certo cabo austríaco na Alemanha da década de 1920), Chávez entendeu que era possível chegar ao mesmo fim por via eleitoral (o cabo austríaco também aprendeu essa lição).

Assim foi a partir de 1998. Mas não bastava conquistar o poder nas urnas. Era preciso consolidá-lo, de preferência vitaliciamente, o que implicava três coisas.

Primeiro, comprar apoio popular com programas assistencialistas sustentados por altos preços do petróleo.

Em segundo lugar, submeter as Forças Armadas, o Legislativo, o Judiciário e a mídia independente ao seu unificado comando.

Finalmente, era preciso também temperar tudo isso com uma retórica ferozmente antiamericana, mas não com uma prática antiamericana: nunca a Venezuela vendeu tanto petróleo ao Grande Satã como nos 15 anos de Chávez. Inimigos, sim, mas não idiotas.

Moral da história? Sim, sabemos que a pobreza caiu para a metade com os bilhões de petrodólares que Chávez despejou sobre os miseráveis nativos. Mas o gesto, por si só, nada significa: Pinochet fez melhor no Chile e nem por isso a sua ditadura deve ser elogiada.

Além disso, a redução da pobreza não garantiu uma economia saudável (a Venezuela está economicamente arruinada) nem sequer uma sociedade civil autônoma e pujante (a criminalidade em Caracas faz de São Paulo uma cidade quase suíça).

Sem falar das amizades que Chávez foi cultivando durante o seu reinado: de Ahmadinejad a Gaddafi, de Saddam Hussein a Bashar Assad, sem esquecer o terrorismo das Farc e a ditadura dos Castro, praticamente não faltam psicopatas nessa lista.

Uma história triste? Sem dúvida. Mas há uma lição a retirar do chavismo -uma lição especialmente importante para a direita e para a esquerda democrática: líderes populistas e autoritários como Hugo Chávez não nascem do vazio.

Eles precisam de uma cultura de pobreza material e mental para prosperar.

Essa cultura existia antes de Chávez. Continuou com ele. E, venha quem vier, irá sobreviver a ele.


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