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Alemanha enfrenta barreiras para energia limpa

Custo e logística travam energia limpa na Alemanha

Por MELISSA EDDY e STANLEY REED

BERLIN - É um empreendimento audacioso, que goza de amplo apoio na Alemanha: fechar as usinas nucleares, livrar o país do carvão e promover uma mudança geral para fontes de energia renováveis.

Mas o plano, aprovado pela chanceler Angela Merkel e também pelos partidos de oposição, enfrenta problemas em sua execução que obrigam os alemães a suportar custos e complexidades para pôr em prática seus princípios.

As famílias alemãs são atingidas por taxas de eletricidade em rápida ascensão, a ponto de que um número crescente não consegue mais pagar a conta. As empresas estão cada vez mais preocupadas que os custos da energia as coloquem em desvantagem com os concorrentes de outros países, enquanto outras começaram a deixar o país.

Fazendas eólicas recém-construídas em alto-mar aguardam ser ligadas à rede energética que precisa de expansão. E, apesar de todos custos, as emissões de carbono aumentaram em 2012, pois as usinas a carvão foram acionadas para fechar lacunas no abastecimento.

Uma nova expressão entrou no léxico: "pobreza energética". "Muitas vezes não vou para minha sala para economizar eletricidade", disse Olaf Taeuber, 55, que é gerente de uma frota de veículos em Berlim.

Taeuber conta com apenas uma lâmpada de 5 watts, que emite uma luminosidade "aconchegante", em sua cozinha quando chega em casa à noite. Se realmente precisar, acende um tubo de neon que consome 25 watts. Mesmo assim, ele teve de pedir ajuda para evitar que sua eletricidade fosse cortada.

Ele faz parte de um número crescente de alemães que enfrentam as realidades de pôr em prática o projeto mais ambicioso de Merkel e uma das iniciativas de transformação de energia mais abrangentes feitas por um país industrializado. Continuar a implantação do programa e manter o apoio da população serão desafios da chanceler alemã em seu terceiro mandato.

Merkel apresentou seu plano em 2011, depois do desastre nuclear na usina nuclear de Fukushima, no Japão. Ele prevê o fechamento de todas as usinas nucleares alemãs até 2020 e a mudança quase total para energia eólica e solar até 2050, com um custo de aproximadamente US$ 735 bilhões (R$ 1,62 trilhão), maior que as ajudas à zona do euro.

Os custos para o Estado, as grandes companhias e os consumidores aumentaram conforme surgiram complicações durante a transição.

Taeuber esteve recentemente em uma agência em Berlim que ajuda pessoas com dificuldade para pagar as contas de luz e conseguiu um adiamento para não ter sua energia cortada.

Cada consumidor é obrigado a pagar cerca de US$ 270 (R$ 600) adicionais este ano para subsidiar as novas operadoras de energia renovável. Segundo Sven Gärtner, funcionário do órgão, a população de baixa renda é a mais afetada.

"A transformação da energia tem sentido, mas sua implementação foi confusa, descoordenada", disse Gärtner. "Não se pode esperar que as pessoas continuem cortando em outras áreas. Elas ganham o suficiente para cobrir as necessidades energéticas básicas."

Parte da razão para que os preços ao consumidor tenham aumentado tanto é que, por enquanto, o governo poupou cerca de 700 empresas do aumento dos custos de energia, para proteger sua competitividade na economia global.

Os usuários industriais alemães ainda pagam mais pela eletricidade que no Reino Unido ou na França, e quase o triplo que os dos EUA, segundo um estudo feito pela gigante industrial alemã Siemens. O Instituto de Pesquisa Econômica de Colônia disse que houve um forte declínio no interesse do setor industrial por investir na Alemanha desde 2000.

Um terço das companhias de produtos eletrônicos e de automóveis aumentaram seus lucros com o plano, e 11% das indústrias químicas e metálicas tiveram prejuízos, segundo o instituto econômico alemão.

"Estamos chegando a uma etapa crítica, e todos os políticos estão conscientes disso", disse Udo Niehage, responsável pela transição na Siemens. "Os custos estão ficando altos, talvez demais, e você tem de ver as consequências para a competitividade de nossa indústria."

Além dos custos há os desafios logísticos de transferir 80% do consumo de energia para fontes renováveis, algo nunca tentado em escala tão grande. Um dos primeiros obstáculos encontrados é a inconstância da geração de energia por fontes renováveis, como o vento e o sol.

Ninguém inventou um modo de armazenar essa energia por muito tempo. Isso significa excedentes problemáticos em alguns dias e uma escassez paralisante em outros, que exige acionar as antigas usinas termelétricas a óleo e carvão.

No ano passado, fontes eólicas, solares e outras de combustíveis não fósseis forneceram 22% da energia da Alemanha, mas o país aumentou suas emissões de carbono em 2011 enquanto as usinas a óleo e carvão tiveram de suprir lacunas no sistema em evolução, segundo a associação de eletricidade da Alemanha BDEW.

"É ótimo que tenhamos alcançado uma porcentagem tão alta de energia renovável", disse Michael Hüther, diretor do Instituto de Pesquisa Econômica de Colônia. "Mas há repercussões negativas que hoje começamos a perceber que devem ser abordadas."

Grandes fazendas eólicas em alto-mar que foram construídas no norte menos povoado da Alemanha geram energia que deve ser transportada para indústrias e cidades no sul.

"Trabalhamos 24 horas por dia e nos fins de semana", disse Irina Lucke, que passou a maior parte do último ano na ilha arenosa de Borkum, no mar do Norte, supervisionando a montagem de 30 turbinas da maior fazenda eólica em alto-mar.

Essas turbinas provavelmente só vão gerar energia no próximo ano. Os trabalhadores devem remover do leito marinho equipamentos abandonados da Segunda Guerra Mundial para que possam instalar um cabo até o litoral. "É realmente frustrante", disse Lucke. O atraso ameaça acrescentar US$ 27 milhões (R$ 60 milhões) ao custo de US$ 608 milhões (R$ 1,34 bilhão) do parque eólico.

Em terra, a rede elétrica da Alemanha foi sobrecarregada pelos novos projetos eólicos e solares, obrigando o governo a investir até US$ 27 bilhões (R$ 60 bilhões) na próxima década para construir aproximadamente 2.700 quilômetros de linhas energéticas de alta capacidade e modernizar as linhas existentes.

O grande estado principalmente rural de Schleswig-Holstein, no norte do país, produz até 12 mil megawatts de energia com novas turbinas eólicas e painéis solares, mas só consegue consumir um sexto dela.

"Schleswig-Holstein é um microcosmo da Alemanha", disse Markus Lieberknecht, da operadora de rede Tennet. "Se antes a energia era trazida para o estado e distribuída para as pequenas comunidades, hoje essas comunidades produzem a energia e precisamos encontrar uma maneira de transmiti-la para as áreas urbanas maiores", disse ele, acrescentando: "Tudo está de cabeça para baixo".


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