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New York Times

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Política prejudica Bienal de Moscou

Por STEVEN LEE MYERS

MOSCOU - Houve algumas complicações quando o artista conceitual americano John Baldessari levou seus trabalhos à Rússia para a quinta Bienal de Arte Contemporânea de Moscou. Para começar, o título de seu projeto, "Double Take", não se traduz facilmente para o russo. Foi mudado para "1+1=1".

Mais preocupante foi que dois colecionadores não cederam obras do artista para a exposição. Eles mostraram preocupação com o ambiente político na Rússia, o asilo a Edward Snowden, delator da espionagem dos EUA, a lei que proíbe a "propaganda gay" e a ação contra a banda punk Pussy Riot.

"Eu, pessoalmente, não tive nenhum problema", afirmou Baldessari, 82. "Mas sei que o clima está presente."

A bienal, que termina no dia 20, encarna esse clima. É moderna e dinâmica, recebe um público interessado, mas, aparentemente, procura se desviar das armadilhas políticas e burocráticas que podem causar a ira do governo de Vladimir Putin.

Desde seu início, em 2005, a bienal segue um caminho cuidadoso, considerando a ambição dos organizadores de transformar Moscou em um centro internacional de arte contemporânea e também o conservadorismo de um país onde a linha que divide o que é aceitável do que não é pode ser tênue.

Em setembro, autoridades apreenderam quatro telas de uma galeria em São Petersburgo na véspera da cúpula do G20. Uma delas mostrava Putin de camisola cor-de-rosa, arrumando os cabelos de seu antigo protegido, o primeiro-ministro Dmitri Medvedev, retratado de calcinha e sutiã.

O autor da tela, Konstantin Altunin, imediatamente fugiu para a França. Contrastando com isso, nenhum dos artistas escolhidos para a bienal tratou diretamente das questões da atualidade.

Em declarações surpreendentemente francas, o vice-ministro da Cultura, Ivan I. Demidov, disse que o patrocínio da bienal pelo Ministério é uma honra e também um peso.

"Me parece que, quando um governo, uma estrutura por definição conservadora, apoia a arte, especialmente tópicos de cultura e arte tão socialmente delicados, especialmente a arte moderna, há certo grau de risco. Possivelmente para ambas as partes."

A curadora da bienal deste ano é Catherine de Zegher, que hoje mora na Bélgica. Ela não é novata em política. Foi diretora do Drawing Center de Nova York, renunciando ao cargo quando foi rejeitado o plano de mudar o centro para o local antes ocupado pelo World Trade Center.

Algumas mostras do Drawing Center provocaram polêmica por seu teor e críticos argumentaram que a entidade era antipatriótica e não tinha lugar no Marco Zero.

Para a mostra principal da bienal, em Manezh, uma academia de equitação que virou um museu, Zegher reuniu trabalhos de 72 artistas. O salão central do prédio foi transformado em um labirinto de galerias, com vista que atravessa as janelas do lado sul das torres do Kremlin.

Num momento em que as restrições à liberdade de expressão são criticadas, Zegher disse que evitou tópicos abertamente polêmicos. "Não me impediram de fazer nada, mas para algumas coisas foi preciso negociar. Acho que há mais autocensura que censura."

A televisão estatal Kultura elogiou a bienal, citando seus "valores familiares, ambiente positivo e fantasia ilimitada". Outros, porém, disseram que o evento sacrificou força artística em prol do pragmatismo. O crítico de arte Dmitri Pilikin, de São Petersburgo, questionou as escolhas dos organizadores.

"A arte contemporânea se ocupa principalmente da negação", comentou. "Fazer um projeto que chega a uma conclusão tão positiva é um risco, porque impõe a pergunta: 'Em que medida é autêntico?'. Não será uma tentativa de recriar alguma espécie de kitsch glamouroso stalinista?"

Zegher contestou a crítica, mas reconheceu que prefere a sutileza à agressividade direta. "Na realidade, não gosto de provocação, porque ela cala tudo", explicou.

Alguns trabalhos de tema político presentes na bienal são tão discretos que podem até passar despercebidos. O artista irlandês Tom Molloy, por exemplo, fez uma montagem de minúsculas fotos de protestos em todo o mundo, disposta numa prateleira comprida, em algo que lembra uma miniatura de uma grande marcha de protesto.

"Se você olhar com cuidado, verá muito questionamento e crítica acontecendo", disse Zegher. "É para as pessoas que olham."


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