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Álvaro Rodrigues dos Santos

Houve avanço nas medidas antienchente?

NÃO

A responsabilidade municipal

Em que pesem as meritórias iniciativas que resultaram na aprovação da ótima lei que instituiu a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil e na mobilização de órgãos públicos para o apoio a ações de gestão de riscos geológicos e geotécnicos, efetivamente muito pouco se avançou na redução da probabilidade de ocorrência de novas e devastadoras tragédias associadas a deslizamentos de encostas e enchentes.

Essa grave constatação é ilustrada pelo fato de nem ao menos ter-se conseguido estancar o principal fator causal dos problemas, qual seja a continuidade da ocupação urbana de áreas de muito alto risco geológico, como encostas de alta declividade e margens de rios.

A persistir essa tendência -não há outro horizonte-, as tragédias tendem a se ampliar na intensidade, frequência e letalidade na mesma proporção do crescimento das populações das cidades afetadas.

Aspectos essenciais podem ser apontados como responsáveis por essa equação macabra. O primeiro que salta aos olhos é o perverso acomodamento de administradores públicos à adoção de sistemas de alerta pluviométrico -sirenes. São sistemas necessários, mas em caráter emergencial e de curta duração, justamente no intervalo de tempo suficiente para a implementação de medidas estruturais e resolutivas. A adoção de sistemas de alerta pluviométrico com caráter definitivo é uma medida desumana e ineficaz.

Com base em Cartas de Risco, cumpre, isso sim, proceder em caráter emergencial o imediato reassentamento dos moradores de áreas consideradas de muito alto risco. Não há o que tergiversar sobre esse assunto.

O segundo aspecto é de ordem estratégica. É fundamental que esses problemas, com especial suporte das Cartas Geotécnicas, passem a ser prioritariamente conduzidos sob a ótica do planejamento urbano e dos programas habitacionais, delegando à abordagem de defesa civil uma função complementar. Hoje, todas as responsabilidades são equivocadamente lançadas às costas de nossos heroicos sistemas de defesa civil.

O terceiro aspecto, talvez o mais crucial, é de ordem operacional. Todas as questões práticas, de campo, sejam de caráter emergencial ou permanente, dizem respeito à área de atuação municipal. E o fato real é que nossos municípios, especialmente os de médio e pequeno portes, não reúnem as condições necessárias para ao menos constituir um corpo técnico minimamente capacitado a implementar todo o arco de ações necessárias. Quando não por descompromisso social ou leniências éticas de suas administrações.

Sem dúvida, o gargalo crítico que impede avanços nos programas de gestão de riscos geológico-geotécnicos está na questão municipal. Sugere-se que os governos federal e estaduais organizem forças tarefas, com geólogos, engenheiros, arquitetos e urbanistas, que se instalem nos municípios mais críticos e deles se ausentem somente quando todos os problemas estiverem devidamente equacionados.

O quarto aspecto a ser considerado é de ordem tecnológica. Não possuímos no país uma cultura técnica arquitetônica e urbanística especialmente dirigida à ocupação de terrenos de acentuada declividade. Isso se verifica tanto nas formas empíricas de autoconstrução usadas pela população de baixa renda, como em projetos de maior porte.

Em ambos os casos, prevalece infelizmente a cultura técnica de produção artificial de áreas planas por meio de cortes e aterros executados por operações de terraplenagem, cacoete técnico invariavelmente presente na formação de áreas de risco de deslizamentos das cidades brasileiras que, de alguma forma, crescem sobre relevos acidentados.

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Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


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