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Barbárie no Egito
A situação política no Egito tornou-se ainda mais sombria depois do massacre praticado pelo governo militar que destituiu, em julho, o presidente Mohammed Mursi.
A repressão teve início logo após o golpe, quando forças do Exército mataram dezenas de simpatizantes da organização islâmica Irmandade Muçulmana, à qual o mandatário deposto pertence.
Episódios semelhantes se repetiram desde então, numa escalada que deixou um saldo de mais de 600 manifestantes mortos somente na última quarta-feira.
A carnificina indica que o Egito retroage a um estágio político anterior às revoltas da Primavera Árabe, que afastaram, em 2011, o ditador Hosni Mubarak. Apesar da promessa de eleições e da nomeação de um governante civil provisório, o Exército permanece como única força capaz de exercer o poder no país --e o faz nos conhecidos moldes ditatoriais.
A brutalidade oficial reduz a pó o argumento, esgrimido por alguns, de que a derrubada de Mursi seria uma espécie de correção de rumos para assegurar a democratização.
Na realidade, a mensagem dos militares do Egito é a de que eleições pouco valem quando os vencedores são islamitas.
A situação é análoga ao que se verificou na Argélia, onde a perspectiva de vitória eleitoral do partido religioso FIS (Frente Islâmica de Salvação), em 1992, levou o governo a cancelar o pleito, num golpe que deu início a longa guerra civil.
Pode-se argumentar que a situação atual do Egito difere em muitos aspectos da argelina --a Irmandade Muçulmana não é um grupo armado e o Exército egípcio mantém-se, ao que parece, unido em torno de princípios laicos.
Nada impede, porém, que o recrudescimento da repressão venha a alimentar uma dinâmica de ressentimentos e agressões bastante conhecida em países da região.
Embora seja verdade que, ao chegar à Presidência após vencer as eleições no ano passado, Mursi escolheu trilhar o caminho do sectarismo, não deixa de ser um contrassenso acreditar que sua deposição "manu militari" possa ser um ato de defesa da democracia.
A consolidação de um regime democrático num país com as características do Egito, de longa tradição autoritária, não é, por certo, tarefa trivial. Marchas e contramarchas são inerentes ao processo. O que ora se vê, entretanto, é o exercício da barbárie contra milhões de cidadãos.