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Opinião

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Ficções legais

Obras e edificações em situação irregular são a norma no país, que convive com casos de corrupção e falta de fiscalização adequada

Pouco depois de um acidente grave em obras em construção ou em espaços públicos, não raro se descobre que o empreendimento desobedecia algum requisito legal.

Uma construção notória pelo tamanho e significado, o Itaquerão, palco do jogo inicial da Copa do Mundo de 2014, era realizada segundo um projeto que não teria sido autorizado pela prefeitura. Foi o que esta Folha noticiou dias depois do acidente durante a instalação da cobertura do estádio, em que morreram duas pessoas.

Também na semana passada, um incêndio destruiu parte do Memorial da América Latina. A prefeitura afirma que o alvará do auditório incendiado estava vencido desde 1993. A direção da instituição pondera que tinha uma licença especial de funcionamento.

Em outro desastre paulistano, muitíssimo mais grave, dez operários perderam a vida quando um edifício em construção desabou em São Mateus (zona leste), no final de agosto. A obra fora embargada, mas, por negligência ou outros motivos, estava em andamento.

Recorde-se enfim que, em janeiro deste ano, um incêndio na boate Kiss, de Santa Maria (RS), provocou a morte de 242 pessoas. A casa noturna era devidamente licenciada mesmo sem cumprir as normas de segurança.

É mais do que ingênuo dizer que os desastres ocorrem justamente em obras e edificações em situação irregular, pois a irregularidade é a norma --a contradição em termos é o problema.

Em seguida ao horror da boate gaúcha, houve uma azáfama fiscalizatória. Em São Paulo, menos de uma semana após o incêndio, vistorias identificaram problemas legais em dois terços de 39 casas noturnas visitadas.

Estimativas do Ministério Público dão conta de que 60% desses estabelecimentos funcionam de forma irregular. A regularização formal, porém, não parece condição de segurança ou de cumprimento de outros dispositivos normativos.

O caso da boate Kiss, as frequentes denúncias acerca de licenças obtidas de forma corrupta e escândalos como o da máfia do ISS na Prefeitura de São Paulo põem sob dúvida a fiabilidade desses carimbos e papelórios legais.

Nas recorrentes anistias que a prefeitura concede a proprietários de imóveis e empresas, vê-se com desânimo que vastas extensões da cidade funcionam em caráter precário e sob licenças provisórias.

Dado o nível de corrupção, desconfia-se da eficácia da fiscalização. O processo para o perfeito licenciamento de um empreendimento, de resto, pode levar anos, com o que se torna perfeitamente inútil, para dizer o menos.

São provas terminais de que os governos toleram uma burocracia propiciadora de crimes de corrupção, ineficaz no seus propósitos e, não raro, assassina.


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