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Roberto Muylaert

O Maracanã não existe mais

Sem obedecer à proibição de mexer nas estruturas, o Maracanã foi derrubado e encolheu para 78 mil pessoas. Acabou a majestade

Em 16 de julho de 1950, o Brasil perdeu para o Uruguai a final da Copa do Mundo no Rio (2 a 1). Ainda não havia televisão e o Cineac Trianon passava filmes dos jogos com alguns dias de atraso. Só quem estava no estádio tinha credibilidade para contar detalhes da partida. O resto era transmissão pelo rádio.

O centro do Rio era só alegria, com as vitrines exibindo o pôster oficial da Taça do Mundo, um meião de jogador com 28 bandeiras de países participantes. Vieram 12, o resto desistiu. Premonitório, o pé do jogador não chutava, já pisava na bola.

O jogo Brasil x Suécia (7 a 1) foi de euforia total, o público vibrando com a goleada imposta ao civilizado país nórdico. A próxima vítima seria a Espanha, que levou de 6 a 1. Parecia que o complexo de vira-lata, a que se referia Nelson Rodrigues, tinha acabado.

No jogo final, só era possível sentar na arquibancada de concreto forçando a traseira como cunha entre dois torcedores já espremidos. Dez por cento da população do Rio no estádio, um prodígio de dimensões e de público, 200 mil pessoas, ou 14 mil toneladas de gente. Na mesma proporção, São Paulo precisaria hoje de um estádio para 1 milhão.

As fundações recalcaram naquele único dia o que estava previsto para afundar em meses de ocupação. O resto se sabe: o único registro do segundo gol do Uruguai, de cinegrafista ignorado, é exibido à exaustão na TV brasileira.

O excelente Museu do Futebol de São Paulo comete uma injustiça contra a Copa de 50, mostrada numa sala escura, como um funeral, onde o filme do gol de Ghiggia roda sem parar. Nada sobre a emoção das goleadas anteriores, como no jogo contra a Espanha, onde a multidão afinada cantou sem ensaio a marcha "Touradas de Madri" enquanto acenava com lenços brancos, como a se despedir do país derrotado.

O cartaz oficial de 2014 parte da mesma ideia do anterior, mas é andrógino. Exibe duas pernas meio femininas de meiões rendados disputando com delicadeza uma bola no mesmo padrão.

Em 1954, na Suíça, a revanche não aconteceu --a mágica Hungria ganhou do Brasil, em Berna. A redenção só chegou em 1958, na Suécia, quando surgiu um menino fenômeno chamado Pelé.

Em 2014, a final será de novo no Maracanã. Agora, o estádio tombado pelo Iphan só tem o nome em comum com o original: encolheu para 78 mil pessoas, jogando fora a recente reforma de 2007 feita para os Jogos Pan-Americanos.

A ideia da Fifa era ter um estádio onde fosse menor a distância do torcedor até o campo de jogo. Sem obedecer à proibição de mexer nas estruturas, o Maracanã foi derrubado, deixando um espaço oco por dentro, mantidas apenas as características colunas externas de concreto e as rampas de acesso.

Ali foi construído um anel concêntrico, de diâmetro menor que o original, onde ficam as novas arquibancadas. Acabou a majestade: a cobertura agora é de fibra de vidro, com luzes azuis, vermelhas, amarelas, como num circo.

As reformas de 2007 e 2014 somaram R$ 1,4 bilhão. Com metade desse dinheiro, o Rio construiria um novo estádio: "Pague um e leve dois". Preferiu o "pague dois e leve um". E o Maracanã de tantas emoções, nesta segunda Copa do Mundo no Brasil, não existe mais.


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