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Diálogo à venezuelana
É sem dúvida animador que se tenha concretizado a primeira reunião de diálogo entre o governo e a oposição na Venezuela em 15 anos de regime chavista. Mas a boa notícia se apequena diante da insistência do presidente Nicolás Maduro e de seus colaboradores em negar a própria responsabilidade na grave crise do país.
Realizado no Palácio Miraflores, o encontro de anteontem à noite durou cerca de seis horas e foi transmitido ao vivo pela TV --condição imposta pela oposição, quase sem acesso a meios de comunicação. Entre os observadores internacionais estava o chanceler brasileiro, Luiz Alberto Figueiredo, que teve papel importante na presente aproximação.
Esse formato e os anos acumulados de radicalismo político impuseram ao diálogo um ritmo de debate eleitoral, com as previsíveis trocas de acusações e autoelogios.
Ainda assim, impressiona o aparente descolamento entre o governo e a realidade, simbolizado na declaração do ministro do Petróleo, Rafael Ramírez, segundo o qual o modelo econômico chavista "é profundamente bem-sucedido".
Trata-se de uma bazófia, quando se toma em conta a dura realidade de um país que vive de apenas um produto, o petróleo, registra inflação anual de 56% (a maior da América Latina) e tem crônicos problemas de desabastecimento.
O comportamento do presidente da Assembleia Nacional e número dois do chavismo, Diosdado Cabello, foi igualmente preocupante. Enquanto falava o principal líder da oposição, Henrique Capriles, Cabello o chamou de "assassino fascista" em uma rede social.
Na mesma toada, Maduro defendeu a ação dos "coletivos" --grupos paramilitares pró-governo-- e não tocou na hipótese de anistia a três líderes opositores presos sob a duvidosa acusação de buscar um golpe de Estado via protestos.
A oposição enfrenta problemas de outra ordem, internos. O setor mais radical, personificado pela deputada cassada María Corina Machado e que prega a renúncia de Maduro, se nega a participar do encontro. Prefere ater-se às manifestações, que já deixaram ao menos 41 mortos em dois meses.
A próxima reunião está prevista para terça-feira. Para que o novo encontro tenha mais sentido prático, é preciso mais objetividade de ambos os lados e, principalmente, uma admissão do governo de que as políticas do chavismo estão na origem da crise venezuelana.