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Régis Rodrigues Bonvicino

TENDÊNCIAS/DEBATES

Mais um confisco aos brasileiros

É preciso retomar o debate sobre os depósitos judiciais. Os cidadãos não podem mais financiar, sem saber, atividades do Poder Executivo

Por trás dos debates sobre os depósitos judiciais no Brasil, discute-se o modelo econômico e institucional que se pretende para o país.

O depósito judicial é o dinheiro depositado pelas partes em qualquer processo. Eles ultrapassam a casa dos R$ 150 bilhões no país. O dinheiro segue para uma conta judicial e só pode ser sacado, via de regra, quando há o trânsito em julgado da decisão, que o atribui a um dos litigantes, que nem sequer recebem extratos mensais atualizados. Permanece, portanto, depositado por longo tempo. Apenas dois bancos podem recebê-los: Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.

Os depósitos judiciais constituem-se, há muito, passando por diferentes governos federais, em um dos aspectos visíveis de um Poder Executivo Federal que se assemelha ao Leviatã, de Thomas Hobbes, controlando os direitos de livre escolha do cidadão e os direitos da concorrência.

Cito o jurista Joaquim Falcão: "O atual modelo permite que os Executivos transfiram custos orçamentários e custos de legitimidade política para e mediante o Poder Judiciário. Estimula o financiamento compulsório invisível dos tesouros, verdadeiros impostos recônditos através dos depósitos judiciais e dos precatórios". Mais do que uma estratégia "garantidora" do governo, de "garantir" o dinheiro das partes, trata-se de ato que transfere ineficiências e obscuridades do Executivo à população por meio do Poder Judiciário, como afirma Falcão.

A Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil remuneram os depósitos feitos pelas partes por meio dos índices da caderneta de poupança, com juros de 0,5% ao mês mais a taxa referencial, e aplicam esses recursos no mercado interbancário, a taxas juros de 1% até 8% ao mês. Essa captação constitui-se em eventual ato de concorrência desleal, o que acentua uma cultura antidemocrática, resquício ainda da ditadura militar.

A Constituição estabelece, como princípios fundamentais, a valorização da cidadania, do trabalho e da livre iniciativa. A parte de um processo judicial é um cidadão, que, entretanto, se vê, de modo oculto, obrigado a receber remuneração bastante menor do que a de mercado e, com isso, financiar, sem saber, atividades do Poder Executivo e dos dois bancos mencionados.

Trata-se, em uma interpretação constitucional mais rigorosa, talvez de infração aos princípios da moralidade, da publicidade e da transparência. Outro prejudicado é o Poder Judiciário, que tem sua independência e seu direito à autogestão subtraídos parcialmente pelos bancos federais e pelo Executivo.

Os depósitos judiciais são utilizados até para permitir, como "receita atípica", estouros nos gastos do governo federal, que os utiliza para fazer superavit primário, e funcionam, então, como indutores da inflação já em alta, inflação essa que representa o pior confisco à renda dos brasileiros assalariados.

É mais do que necessário que, neste período eleitoral, seja pelo menos retomado o debate sobre a licitação de tais depósitos, nos termos da Constituição. Assim, eles poderão ser mais diretamente geridos pelos próprios tribunais, quer por bancos públicos, quer por bancos privados, que vençam legalmente os certames, eliminando-se a exclusividade compulsória deles e do governo federal.


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