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Periferia ganhou voz com Arns, diz biógrafo

Cardeal vendeu o Palácio Episcopal e construiu 1.200 centros comunitários, nos quais a população passou a se reunir

Livro narra detalhes como o filósofo Roberto Romano foi salvo pelo cardeal quando tentou se matar na cadeia

RICARDO MENDONÇA DE SÃO PAULO

Em 1973, três anos após se tornar arcebispo de São Paulo --a maior arquidiocese do mundo naquela época--, dom Paulo Evaristo Arns tomou uma atitude que até hoje soa como surpreendente no meio católico. Simplesmente vendeu por US$ 5 milhões o Palácio Episcopal Pio 12, o imponente imóvel no bairro do Paraíso usado como residência oficial da autoridade católica, e mudou-se para uma casa mais simples no Sumaré.

O mais radical, porém, viria depois. Com o dinheiro arrecadado, determinou a construção de 1.200 centros comunitários na periferia de São Paulo para criar ambientes mais informais para reuniões que as paróquias locais.

Foram nesses barracos de madeira, muitos feitos em mutirão, que os moradores, sempre incentivados pela igreja de dom Paulo, passaram a se organizar para brigar por creches, escolas, transporte e postos de saúde, entre outras melhorias.

"Como a igreja atua em silêncio, pouca gente associou uma coisa a outra. Mas foi nesse instante que começaram a explodir reivindicações populares por toda São Paulo", diz o jornalista Ricardo Carvalho, repórter da Folha até o fim dos anos 70 e autor da recém-lançada biografia "O Cardeal da resistência -- as muitas vidas de dom Paulo Evaristo Arns" (314 páginas, editora Instituto Vladimir Herzog, R$ 49,90)

A transformação do palácio em centros comunitários são dois dos 65 capítulos "independentes" da obra.

Com a colaboração de Antonio Carlos Fester, Inês Caravaggi e Maria Angélica Rittes, Carvalho organizou a publicação de tal forma que o leitor pode começar a ler por qualquer capítulo.

Com 359 ilustrações, reproduções de cartas de amigos e parentes e muitos depoimentos exclusivos, o livro é uma seleção dos principais episódios vividos por dom Paulo desde 1966, quando chegou a São Paulo como bispo-auxiliar da zona norte, até 1998, quando se aposentou e se tornou arcebispo emérito.

Em tom de homenagem, o livro, de forma nem sempre muito bem organizada, funciona como uma espécie de retrospectiva do agitadíssimo período de dom Paulo no comando da arquidiocese.

Estão lá, entre outros episódios, a histórica celebração ecumênica da Catedral da Sé em 1975 em memória do jornalista Vladimir Herzog, morto dias antes nas dependências do DOI Codi do Exército; a invasão da PUC comandada pelo então secretário de Segurança, coronel Erasmo Dias, em 1977; e a operação panejada por dom Paulo para entregar ao presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, uma lista com os nomes de desaparecidos políticos.

O livro também narra detalhes e bastidores de episódios ainda hoje pouco conhecidos relacionados a dom Paulo.

Um deles é foi a tentativa de suicídio do então seminarista Roberto Romano, hoje filósofo e professor da Universidade de Campinas.

Romano foi preso na rodoviária de São Paulo no momento em que tentava embarcar para o Rio de Janeiro para um encontro com os pais de um frei que havia sido detido. Deprimido com as condições da prisão, ele tentou se matar cortando os pulsos.

A pedido do autor, Romano escreveu um texto para o livro em que narra como acabou sendo salvo por dom Paulo, que foi visitá-lo na cadeia.

Hoje, aos 92 anos, dom Paulo vive recluso num convento em Taboão da Serra, na Grande São Paulo.

Na semana que vem, Ricardo Carvalho pretende visitá-lo, junto com Clarisse Henzog, viúva do jornalista, para entregar um exemplar.


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