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Janio de Freitas

A lição do lixo

Em vez de polícia dissolvendo piquetes, apareceu polícia na proteção à limpeza pelos garis dispostos a trabalhar

As numerosas mas imprecisas centenas de garis que persistiram em greve no Rio tentaram obter, das chamadas autoridades, uma reação daquelas que emporcalham a democracia. Criaram grupos de agressão aos que aceitaram o acordo entre o seu sindicato e a estatal de limpeza urbana, apelaram para passeatas e perturbação do trânsito, e prometeram mais e maiores agitações.

O efeito foi exemplar. Em vez de polícia dissolvendo com armas os piquetes agressores, apareceu polícia na mais pacífica proteção à limpeza da cidade pelos garis dispostos a trabalhar. Até o momento em que escrevo, nem um só dos costumeiros incidentes. Espera-se para hoje a retirada final das toneladas de lixo e sujeira acumuladas, e não é improvável que, até lá, haja algum incidente. Apesar disso, não se diminuirá o valor exemplar do tratamento inteligente dado, afinal, a uma greve perturbadora, por si mesma, e agravada por provocações de grevistas violentos. Uma resposta do poder, suponho, sem precedente em casos semelhantes: resposta democrática.

Não se comprovou que os políticos dados como incitadores dos supragrevistas o fossem de fato, embora não haja dúvida quanto à incitação política. E aí se completa o efeito exemplar da condução compreensiva do problema: a continuação da greve não causou a pretendida corrosão eleitoral do governador Sérgio Cabral e do prefeito Eduardo Paes. Se é que não lhes deu algum ganho, com a derrota política dos que investiram no prejuízo sentido pela cidade.

Pode ser que outros prefeitos e governadores venham a notar o que e como se passou no Rio.

IMPUNIDADE

Alguns tipos de violação de direitos humanos recebem, nos meios de comunicação, o tratamento combativo à altura, como se passa com os atos contra gays e lésbicas. O racismo ainda não merece o empenho proporcional à sua gravidade. O futebol o demonstra muito bem.

Os casos se sucedem, as páginas esportivas os noticiam, a cada um seguem-se críticas em partes de colunas, e logo se passa à espera do próximo episódio. Muito cômodo para as consciências, mas também resulta em uma forma de conivência com a continuidade da agressão desumana.

O que houve com o brasileiro Tinga no Peru exigia que a imprensa esportiva se lembrasse de que também ela tem compromissos com a democracia. De sua parte, o mínimo seria movimentar-se para mostrar que, contra o racismo, o futebol brasileiro não poderia voltar ao Peru durante um longo período. Mas a atitude foi transferida para a arapuca chamada Conmebol, quando agredidos foram o futebol brasileiro e os direitos humanos universais.

Agora, no Rio Grande do Sul, o juiz Márcio Chagas da Silva foi vítima de agressões raciais da torcida do Esportivo. Saíram as notícias de praxe em alguns jornais, saem os comentários de praxe em partes das colunas de praxe. No RS, o Ministério Público tomou suas providências para colaborar com a permanência das praxes: propõe que o Esportivo perca os três pontinhos de sua vitória no jogo do incidente.

Se a imprensa esportiva se dedicasse a mostrar a necessidade de medidas eficazes, como seria a proibição de jogo na gaúcha Bento Gonçalves por um ano, ou em cidades paulistas onde alguém sofra o que o santista Arouca sofreu, o futebol deixaria de ser oportunidade, senão incentivo, para o racismo.

A história de mais de cem anos do jornalismo esportivo inclui escassos momentos de contribuição ao desenvolvimento humano e ético do esporte brasileiro.


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