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Jornalista revela tortura com cobra durante a ditadura
Em depoimento inédito divulgado por site, Míriam Leitão conta como foi torturada por militares, nua e grávida
'Ainda aguardo um pedido de desculpas das Forças Armadas', diz jornalista, que afirma não cultivar ódio
Em texto divulgado nesta terça (19) no site "Observatório da Imprensa", o jornalista Luiz Cláudio Cunha publicou pela primeira vez um depoimento da também jornalista Míriam Leitão em que ela conta como foi torturada com uma cobra, nua e grávida, durante a ditadura (1964-1985).
Estudante de filosofia, Míriam foi presa em Vitória, no final de 1972, quando passeava na praia com o então companheiro, Marcelo Netto.
Opositores do regime instaurado em 1964 e com ligações com o PC do B, partido banido pela ditadura, eles passaram por diversas sessões de tortura no período em que ficaram presos.
Mantido por nove meses em uma solitária, Marcelo Netto também sobreviveu.
No depoimento, a jornalista narra o período que passou numa unidade do Exército no Espírito Santo. Além de espancamentos, simulações de fuzilamento e ameaças de estupro, Míriam foi torturada com cães pastores alemães e uma cobra jiboia, colocada numa sala escura com ela após a então estudante, grávida de seu primeiro filho, ser despida pelos militares.
"Me davam tapas, chutes, puxavam pelo cabelo, bateram com minha cabeça na parede. Eu sangrava na nuca, o sangue molhou meu cabelo. (...) Não recebi um único telefonema, não vi nenhum advogado, ninguém sabia o que tinha acontecido comigo, eu não sabia se as pessoas tinham ideia do meu desaparecimento", diz o depoimento da jornalista de "O Globo".
Míriam Leitão disse à Folha que a decisão de trazer a público sua história em reportagem do "Observatório da Imprensa" está relacionada ao atual momento político --uma Comissão Nacional da Verdade, que deve concluir os trabalhos no final do ano, apura os crimes do período-- e à insistência do jornalista Luiz Cláudio Cunha em convencê-la a falar.
"O país está olhando para seu passado. Estou convencida de que ainda falta um passo: as Forças Armadas devem reconhecer que erraram. Isso ajudaria o país a seguir adiante", afirmou ela.
Miriam contou que havia relatado a violência diante de um tribunal militar, em 1973.
Meses após ser libertada, ela compareceu à 2ª Auditoria da Aeronáutica, no Rio, onde prestou depoimento. "Ali, falei sobre a cobra, os cachorros, denunciei a tortura que sofri quando estava grávida, na prisão", relatou.
No fim do depoimento, Míriam conta como conviveu com o episódio: "Minha vingança foi sobreviver e vencer. Por meus filhos e netos, ainda aguardo um pedido de desculpas das Forças Armadas. Não cultivo nenhum ódio. Não sinto nada disso. Mas, esse gesto me daria segurança no futuro democrático do país".