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Teste do pezinho detecta risco de câncer
Pesquisa do Paraná mostra que análise do sangue colhido em bebês leva ao diagnóstico precoce de tumor raro
Mas o uso do teste é questionado pela raridade da doença; Estados do Sul e do Sudeste têm mais casos
Uma pesquisa de médicos do Paraná usou o teste do pezinho para diagnosticar a predisposição ao câncer em recém-nascidos.
O exame, obrigatório no país todo, detecta doenças que podem levar a deficiências intelectuais.
O resultado do trabalho, realizado entre 2006 e 2010, foi publicado nesta semana no "Journal of Clinical Oncology" e mostra que o diagnóstico precoce feito com o teste contribui decisivamente para a cura da doença.
Os médicos usaram a mesma gota de sangue colhida para o exame comum para procurar uma mutação genética que indica predisposição ao câncer, em especial ao tumor de córtex adrenal.
Trata-se de um tipo raro de câncer da glândula adrenal e cuja incidência é maior na faixa que vai do Rio Grande do Sul ao sul de Minas Gerais, onde atinge quatro crianças por milhão, 15 vezes a média mundial. As causas disso estão em estudo.
Das cerca de 500 crianças com resultado positivo para a mutação, 17 tiveram câncer, com taxa de sobrevivência de 80%. O comum é de 50%.
No caso dos pacientes que fizeram o acompanhamento com regularidade, o percentual de cura foi de 100%.
Entre os casos, destaca-se o de Kauan Barros Gomes, 5, que recebeu o diagnóstico aos dez meses de idade. Na época, o tumor tinha 0,6 cm --é o menor já relatado na literatura médica até hoje.
Segundo o coordenador da pesquisa, o médico Bonald Figueiredo, do Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, outros 700 casos de câncer foram identificados.
"É uma multidão que passa a ficar atenta a qualquer sintoma, o que aumenta as chances de diagnóstico precoce e de cura", diz.
Para os pesquisadores, o estudo abre caminho para que sejam implantados outros programas de vigilância em saúde pública a partir do teste de DNA. No Paraná, o governo estuda decretar a obrigatoriedade do exame.
"Dá para estender a mesma rotina a outras doenças, de acordo com a incidência regional", afirma a pediatra Maria José Mastellaro, do Centro Infantil Boldrini, de Campinas (SP), que realiza uma pesquisa semelhante.
O rastreamento genético, porém, é questionado. Críticos ponderam que é preciso assegurar que os benefícios do teste compensem os impactos do rastreamento.
"O teste não identifica a doença em si, mas uma predisposição. Vai submeter um grande número de pessoas a um estresse que, para a maioria, será desnecessário", diz o endocrinologista Daniel Freire, do HC da USP.
Das crianças testadas no Paraná, só 0,27% apresentavam a mutação. Destas, só 3% tiveram câncer.
Para Figueiredo, os benefícios do aconselhamento genético e da prevenção do câncer na família compensam os impactos. "Um quarto dos membros da família terá a mutação", diz.