Espírito utilitário toma passarelas masculinas de Paris e Milão

FRANCESCA ANGIOLILLO
ENVIADA ESPECIAL A MILÃO
PEDRO DINIZ
ENVIADO ESPECIAL A PARIS

Regras de vestimenta não fazem mais parte do vocabulário da moda masculina.

O guarda-roupa restrito de dez anos atrás, com variações de uma mesma silhueta e cartela de azul, cinza e preto saíram de cena para abrigar um leque de possibilidades de tecidos brilhosos, alfaiataria esportiva e cores vivas nos desfiles das semanas de moda de Milão e Paris.

Hermès e Ermenegildo Zegna, duas das grifes que merecem olhar mais atento na programação, selaram um futuro de casacos esportivos produzidos com tecidos tirados do armário de neve que foram mesclados a propostas de alfaiataria. O tênis de corrida, do guarda-roupa de academia, ganhou status de luxo.

A italiana Ermenegildo Zegna fez nevar sobre o público e a passarela montada num prédio brutalista em Milão, estabelecendo o clima ao ar livre pretendido para sua coleção.

Alessandro Sartori reitera seu apreço pelo cruzamento de sportswear e alfaiataria nas criações inspiradas na neve e nas cores de Trivero, região montanhosa onde a tecelagem da empresa familiar produz há mais de cem anos seus apreciados tecidos.

Jaquetas curtas de couro e lã e suéteres com relevos e jacquard se combinaram a calças ajustadas de alfaiataria; pulls e casacos longos ganharam grafismos coloridos remetendo ao triplo X com que a grife evoca o aspecto artesanal das peças, repetido como bordado em peças de couro.

No lado mais urbano, Sartori renova sobretudos acinturados embutindo o cinto no interior de casacos feitos na levíssima lã batizada de "Oasi cashmere" –em referência ao Oasi Zegna, reserva natural mantida pela família em Trivero–, tingida com pigmentos orgânicos.

Já a Hermès, grife francesa que é epítome do luxo e da selaria sob medida, desmembrou clássicos de seu portfólio, como estampas impressas em seda, o cashmere e o couro de crocodilo para misturá-los a itens funcionais, com parkas e os trench coats com capuzes removíveis.

O esforço de transformar o armário clássico em roupa de trabalho produziu peças de apelo para o cotidiano, sem resvalar para o simplório.

Ao contrário. Como na Ermenegildo Zegna, a graça é encontrar, numa peça aparentemente simples, detalhes de costura, bolsos e zíperes estratégicos.

A estilista Véronique Nichanian olhou paisagens naturais e técnicas de estamparia das Terras Altas da Escócia, berço do tartan, para imprimir contornos de montanhas costuradas sobre o couro e grafismos delicados em blusas e camisetas.

Como se convidasse os homens a respirar ar puro e se desgarrar de julgamentos sobre a roupa que veste, a grife levou seu desfile de inverno a um prédio histórico das Forças Armadas –ambiente mais masculino, impossível– e ateou fogo em estruturas de madeira, como se queimasse cartilhas do passado.

Não houve a enxurrada de moda "street" que toma as passarelas e as vitrines, mas, sim, um meio entre o utilitário, o clássico e o esportivo, fórmula inovadora no balaio urbano das temporadas de desfiles do circuito europeu.

Os jornalistas FRANCESCA ANGIOLILLO e PEDRO DINIZ viajaram a convite das grifes Ermenegildo Zegna e da Hermès, respectivamente.

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