Portos de Santos e Paranaguá viram rota de exportação de madeira ilegal após operações da PF

Investigações constataram menor fluxo no porto de Manaus; MPF cobra do presidente do Ibama presença de fiscais em vistorias

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Brasília

A rota de exportação de madeira ilegal se deslocou do porto de Manaus para Belém, Santos (SP) e Paranaguá (PR) após a Operação Arquimedes da Polícia Federal e do MPF (Ministério Público Federal) desbaratar um esquema de lavagem de madeira na capital do Amazonas. O terminal do estado era um entreposto praticamente obrigatório para saída das cargas.

Investigações mostram que, a partir de meados de 2019, a madeira ilegal extraída da Amazônia passou a ser enviada a outros portos com finalidade de exportação.

Nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ameaçou revelar os países compradores de madeira ilegal, cujas importadoras constam das apurações de PF e MPF. No entanto, em live em rede social nesta quinta-feira (19) ele não cumpriu a promessa.

Antes, a madeira extraída ilegalmente em Roraima, por exemplo, era escoada pela BR-174 até Manaus. Agora, segundo as investigações, o produto desce pela mesma rodovia, não para em Manaus, segue pela BR-319 (que conecta a Porto Velho) e chega, por terra, até os portos ao sul do país.

A pulverização da madeira dentro do Brasil, antes de embarcar para empresas compradoras nos Estados Unidos e em países da Europa, principalmente, é uma realidade que levou o MPF a cobrar do presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, uma maior presença do órgão nos portos brasileiros.

Bim se reuniu nesta quinta-feira (19) com integrantes do MPF. Na ocasião, os procuradores cobraram por mais fiscalização nos portos.

O presidente do Ibama também vem sentindo a necessidade de se explicar sobre dois despachos internos que provocaram uma maior recirculação da madeira ilegal.

Reportagem publicada pela Folha nesta quinta mostrou que um despacho de novembro de 2019 proibiu que compradores de madeira ilegal sejam autuados caso fique constatado que os DOFs (Documentos de Origem Florestal) são fraudados, sem a ciência do comprador. Os DOFs são as guias necessárias para o transporte de uma madeira de origem legal.

O despacho foi ampliado no Ibama para que também ficasse vetada a apreensão da madeira. O resultado foram uma maior recirculação de madeira ilegal, uma menor cautela por parte dos compradores e um menor poder de fiscalização.

Em fevereiro, um novo despacho interpretativo de Bim eliminou a necessidade de autorização de exportação de madeira, sendo necessário apenas o DOF.

A flexibilização incluiu espécies ameaçadas de extinção na Amazônia e vigorou por pelo menos 45 dias. No caso dessas espécies, o presidente do Ibama voltou atrás.

A reportagem mostrou que houve uma queda expressiva de vistoria de madeira pelos fiscais do Ibama nos portos. A fiscalização tem se resumido a uma análise dos documentos de exportação inseridos no sistema eletrônico.

Nas investigações da Operação Arquimedes, foram usadas conversas telefônicas entre madeireiros a partir de quebras de sigilo autorizadas pela Justiça Federal. Esses diálogos mostram a despreocupação de madeireiros com a fiscalização a cargo dos órgãos ambientais.

Nas conversas, os investigados demonstram como é fácil extrair a madeira na Amazônia. A preocupação deles reside na tentativa de fazer essa madeira circular por dentro do sistema. Para isso, créditos fictícios são inseridos no sistema de DOFs, de forma a tornar legal uma madeira ilegal. Com o DOF, o produto é transportado até os portos.

A fraude permite que uma madeira extraída de terras indígenas e de unidades de conservação seja tratada como proveniente de áreas de manejo legais.

Nas investigações, ficou comprovado, por exemplo, que uma área de manejo estava intacta, enquanto parcelas importantes de uma terra indígena vizinha estavam desmatadas.

Para o MPF, é necessário que o Ibama tenha um plano de fiscalização de madeira nos portos, com presença constante dos fiscais. O entendimento é que não há controle sobre a validade ou mesmo sobre a existência de DOFs em carregamentos de madeira.

A Operação Arquimedes já resultou em condenação na Justiça por lavagem de madeira a partir de fraudes nos DOFs. O MPF já propôs ações civis públicas e ações penais desde o início das investigações, em 2017.

Quando disse que divulgaria países compradores de madeira ilegal da Amazônia brasileira, Bolsonaro se referia ao trabalho da operação.

As investigações se concentraram nos madeireiros ilegais no Brasil e numa tentativa de identificar empresas compradoras fora do país, e não em governos de outros países.

Em live nesta quinta (19), o presidente disse que tem a relação de empresas que compram a madeira ilegal e os países que a sediam. Diferentemente do discurso anterior, porém, Bolsonaro buscou acusar as companhias de importarem a carga, e não os países.

"Nós temos aqui os nomes das empresas que importam isso e a que países elas pertencem. A gente não vai acusar o país A, B ou C de estar cometendo um crime, mas a empresa desses países, sim. E isso já tem um processo", afirmou.

O discurso é similar ao do vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB), que minimizou a ameaça de Bolsonaro nesta quinta-feira (19) mais cedo. "Não é o país, é a empresa. O presidente deixou claro que são as empresas, ele deixo muito claro isso aí", disse Mourão, que coordena o Conselho da Amazônia.

Colaborou Julia Chaib

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