Descrição de chapéu mudança climática

Pouquíssimas espécies de árvores dominam metade das florestas tropicais, conhecidas por sua biodiversidade

Na amazônia, somente 2,2% das espécies arbóreas respondem por 50% das árvores da mata, entre elas o açaí

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São Paulo

Cientistas descobriram que um percentual relativamente pequeno de espécies constitui metade das árvores nas grandes florestas tropicais do mundo, entre elas a amazônia. Cerca de 50% dessas selvas é ocupada por aproximadamente 2,2% das espécies achadas nessas matas. E os pesquisadores não pararam por aí e deram nomes às árvores.

Estima-se que somente 1.053 espécies compõem metade dos 800 bilhões de árvores tropicais com troncos com diâmetro de pelo menos 10 cm. Na outra metade estão 46 mil espécies. Os dados foram publicados na revista Nature, nesta quarta-feira (10).

Os pesquisadores também estimam um número extremo de espécies raras: as 39,5 mil espécies mais incomuns respondem por 10% das árvores existentes nas grandes florestas tropicais.

Vista aérea de uma área com densa floresta
Vista aérea do rio Kabitutu proximo aldeia Kato, na Terra Indigena Mundurucu, no Pará - Lalo de Almeida - 22.set.2023/Folhapress

Outro ponto que chama a atenção na pesquisa é a semelhança de padrões entre regiões distantes e independentes.

As florestas tropicais são associadas a uma enorme biodiversidade, não só de fauna, mas também da flora. O artigo da Nature busca dimensionar isso com um tipo de comparação que é frequentemente feita: é possível encontrar, em somente um hectare de floresta tropical, tantas espécies de árvores quanto em toda a flora nativa da Europa Ocidental.

Em meio a tamanha biodiversidade, logicamente, uma listagem ou compreensão total dessas florestas se torna uma possibilidade distante.

Exatamente por essa dificuldade, os autores da pesquisa publicada na Nature —colaboração de 356 cientistas liderados por pesquisadores da UCL (University College London)— se concentraram nas espécies mais comuns de árvores.

O estudo levou em conta dados de inventário de 1.003.805 espécies de árvores com tronco com, pelo menos, 10 cm de diâmetro, em 1.568 áreas de mata fechada, preservadas, com florestas maduras na amazônia, na África e no Sudeste Asiático.

A partir das bases de dados existentes, foi analisado o número de espécies chamadas hiperdominantes —uma definição autoexplicativa. Levando em conta um mesmo tamanho de amostra (77.587 árvores) para cada uma das três regiões, os pesquisadores observaram 77 espécies hiperdominantes na África, 174 na amazônia e 172 no Sudeste Asiático. Nas duas últimas regiões, o número total de espécies na amostra era consideravelmente maior: respectivamente, 2.565 e 2.585, contra 1.132 na África.

Com base nisso, os pesquisadores conseguiram fazer dois tipos de extrapolação. No primeiro, estimaram que 104, 299 e 278 espécies de árvores compõem 50% das matas tropicais da África, da amazônia e do Sudeste Asiático.

Vale mencionar, porém, que esses números são relativos a áreas consideravelmente diferentes; por exemplo, o universo amazônico, mostra a pesquisa, é de 344 bilhões de árvores em áreas de floresta fechada, enquanto o africano é de 113 bilhões.

Percentualmente, isso significa que, na África, 2,2% das espécies respondem por 50% de todas as árvores —sempre considerando aqui aquelas com troncos com, pelo menos, 10 cm de diâmetro; na amazônia, também 2,2%; e, no Sudeste Asiático, 2,3%.

A outra extrapolação que fizeram foi em relação a todas as áreas tropicais do mundo. Nesse caso, a hiperdominância ficaria em torno de 2,24%, o que os pesquisadores estimaram ser equivalente às cerca de 1.053 espécies citadas no início do texto.

Os pesquisadores ainda, com as bases de dados disponíveis, conseguiram ir em busca dos nomes, propriamente ditos, das espécies hiperdominantes.

Algumas das espécies candidatas a hiperdominantes

  • África

    Gilbertiodendron dewevrei; nome popular: Limbali, otabo, agbabu, ekpagoi-eze

  • África

    Greenwayodendron suaveolens; nome popular: atorewa, ẹ́wáé, nchua, eleku, agudugbu

  • África

    Strombosia pustulata; nome popular: itako, afina, poé, mba esogo

  • Amazônia

    Eschweilera coriacea; nome popular: matamatá

  • Amazônia

    Euterpe oleracea; nome popular: açaí

  • Amazônia

    Astrocaryum murumuru; nome popular: murumuru

  • Sudeste Asiático

    Cotylelobium melanoxylon; nome popular: Resak hitam; Khiam khaao; Resak tempurong; Giam tembaga

  • Sudeste Asiático

    Dehaasia caesia; nome popular: Magasil, Medang

  • Sudeste Asiático

    Elateriospermum tapos; nome popular: Perah, Buah Perah, Pogoh Nut, Tapos

Os cientistas chegaram ao valor de 1.119 espécies candidatas à hiperdominância nas florestas tropicais, das quais um elevado percentual possui diferentes tipos de informações e características já conhecidas e registradas.

"Portanto, apenas dados adicionais limitados podem ser necessários para abrir novas abordagens para uma melhor compreensão das florestas tropicais por meio de suas espécies arbóreas mais comuns, incluindo como elas podem reagir à atual era de rápida mudança ambiental global", escreveram os autores.

Impacto da pesquisa

As observações feitas são importantes, entre outros motivos, pela relevância das florestas tropicais como sumidouros de carbono, ou seja, como locais importantes no sequestro de CO2. A pesquisa em questão aponta que essas matas, que ocupam 10% do planeta, são responsáveis por cerca de 40% do carbono estocado em vegetação viva.

Lembrando que a crise climática vem se aprofundando conforme o corte de emissões de gases-estufa pelos países ainda está muito distante do que é necessário. Na terça (9), foi anunciado algo que já se desenhava desde os últimos meses do ano passado: 2023 foi o ano mais quente da história.

Esse tipo de pesquisa ajuda a fechar o foco em um número consideravelmente menor de espécies de interesse para, assim, conseguir facilitar a busca por informações relacionadas a serviços ecológicos prestados, por exemplo. Tais dados também podem ajudar a prever melhor as possíveis mudanças florestais futuras, considerando que estamos falando de espécies que compõem 50% das árvores ali presentes.

Isso, porém, não significa esquecer as espécies mais raras. "É claro que se esforçar para entender e proteger espécies raras e não-hiperdominantes continua sendo crucial, especialmente à medida que enfrentam um maior risco de extinção e provavelmente também contribuem para o funcionamento dos ecossistemas, especialmente quando mais funções, escalas de tempo mais longas e mudanças ambientais impostas são consideradas, e levando em conta que os hiperdominantes do futuro podem ser mais raros hoje", concluem os cientistas.

Tão longe, mas próximas

Os pesquisadores ressaltaram a proximidade entre as informações encontradas nas três diferentes regiões florestais, apesar da "substancial variação intercontinental na história biogeográfica, ambiente contemporâneo, estrutura florestal e composição de espécies".

Os diferentes momentos de ocupação humana nessas regiões também são ressaltados pelos cientistas, que apontam uma chegada mais recente de seres humanos na amazônia, em comparação às duas outras áreas.

"Como histórias humanas tão diferentes podem resultar em padrões quase idênticos de dominância de espécies de árvores? A explicação mais parcimoniosa é que o sistema tende a retornar a um estado com um padrão de abundância de espécies semelhante", afirmam os cientistas.

Segundo os cientistas, é possível supor que "mecanismos biológicos influenciam a montagem da comunidade de árvores para produzir uma proporção consistente de espécies comuns em todos os continentes".

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