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Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

Aumentou o preço do golpe

Se houver um golpe, ele já começa contrariando inclusive nomes de peso da elite econômica e política

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A "Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito" aumentou o preço do golpe. Se houver um golpe, ele já começa contrariando setores importantes da sociedade brasileira, inclusive nomes de peso da elite econômica e política. Em 1964, por contraste, os golpistas tinham vários desses setores do seu lado.

Talvez os bolsonaristas sejam tão fanáticos que topem pagar esse preço: mas ele subiu.

Após três anos de notas de repúdio, entendo quem suspeitava que a carta seria só mais um pedaço de papel. Essa suspeita não se confirmou: um pedaço de papel com 1 milhão de assinaturas não é qualquer pedaço de papel.

Se entre essas assinaturas houver gente da Fiesp e da Febraban, assim como de inúmeros populares, como se pode ver pelos dados de "ocupação" dos signatários, estamos falando de um pedaço de papel muito particular.

A Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco, no centro de São Paulo, onde ocorreram as leituras de manifestos pela democracia - Eduardo Knapp - 11.ago.2022/Folhapress

Há duas coisas que Jair Bolsonaro nunca fez na vida: trabalhar e entrar em briga do lado mais fraco. Que Bolsonaro não trabalha, já demonstramos na coluna de 24 de julho. Mas também é verdade que nunca entrou em briga contra gente poderosa: na ditadura, entrou no Exército, na democracia, entrou no centrão, na Barra da Tijuca, apoiou as milícias. Sempre apoia os mais fortes contra os mais fracos, e nada disso é por preconceito ou por ideologia, é por medo de levar porrada.

Por isso, inclusive, Jair não decide direito se é católico ou evangélico, porque ainda não sabe que lado vai ser capaz de oprimir o outro.

Por isso seu ídolo militar é um torturador: o torturador só entra em cena quando o inimigo já foi preso, desarmado, amarrado e não tem mais qualquer chance de se defender. É só nesse tipo de briga que Jair Bolsonaro tem coragem de entrar.

Por isso o presidente da República foi chorar no chuveiro quando viu na carta pela democracia as assinaturas da Febraban, da Fiesp, de ex-presidentes de diferentes colorações políticas, enfim, de gente que tem mais poder do que o coitado do morador de Jacarepaguá, na zona oeste do Rio de Janeiro, que tem que pagar taxa de gás para as milícias.

As adesões empresariais à carta são, enfim, uma notícia excelente. Ficou mais difícil para Jair Bolsonaro mentir que seu golpe de Estado será contra o comunismo, ou contra a venezuelização do Brasil. Os bancos viraram comunistas? A Fiesp virou comunista?

Do dia da leitura da carta para cá, ouvi gente razoável com medo de que, enquanto a esquerda e o centro democrático discursam sobre democracia, Bolsonaro ganhe a eleição com o auxílio emergencial.

Entendo o argumento, mas discordo. O risco de Bolsonaro ganhar eleição com o auxílio existiria com ou sem carta, e ninguém, espero, parou de fazer campanha junto aos pobres para assinar documento.

Mas é mais do que isso.

O auxílio, criado na última hora quando Bolsonaro teve medo de perder para Lula, prova o quanto os pobres dependem da democracia. Foi só porque teve medo de ser julgado pela imensa maioria de eleitores pobres que Bolsonaro inventou uma política social faltando três meses para a eleição.

Talvez valha a pena dizer para os brasileiros que o plano de Bolsonaro é dar um golpe para nunca mais precisar pensar em pobre, como não pensava antes de ter medo de perder para Lula.

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