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Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

Palavras que viram crimes

Não é preciso criatividade hermenêutica para ver ameaça de golpe nas falas de Bolsonaro

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Leitores me escreveram perguntando por que mostro tanta má vontade para com Jair Bolsonaro. Para eles, o presidente, quando fala do voto impresso, está apenas exercendo sua liberdade de expressão. Eu até concordaria, se Bolsonaro tivesse se limitado a comunicar o que pensa sobre a matéria, mas receio que ele tenha ido além disso.

É fácil defender a liberdade de expressão para quem diz coisas com as quais concordamos; mais difícil é fazê-lo em relação aos que alardeiam ideias que desprezamos. Modestamente, penso estar na segunda categoria. Sustento que bolsonaristas têm o direito de defender a volta do AI-5 e o fechamento do STF. Mas daí não decorre que tudo o que é dizível goze da proteção constitucional ao livre discurso.

A fonte da confusão é a própria dependência que humanos temos da linguagem. Tomemos o caso do estelionato. É obviamente um delito e é quase sempre cometido com auxílio de histórias fraudulentas que o criminoso conta à vítima, mas nenhum advogado que se preze vai defender um cliente acusado de estelionato proclamando seu direito de expressar-se livremente.

De modo análogo, o ladrão que anuncia o assalto bradando "a bolsa ou a vida" ou o mafioso que diz ao comerciante ter "uma proposta que ele não pode recusar" saem do terreno do livre uso da linguagem para incorrer em crime. O que marca a transição é a sugestão, velada ou explícita, de uso de violência. É isso o que Bolsonaro fez quando afirmou, em mais de uma ocasião, que, sem o voto impresso, não haveria eleições. Não é preciso muita criatividade hermenêutica para ver aí uma ameaça de golpe, algo que decididamente não está coberto pela liberdade de expressão.

Num país mais funcional, isso bastaria para deflagrar o impeachment do presidente e, dependendo do grau de credibilidade que atribuamos à ameaça, também para encarcerá-lo com base nas leis de proteção do Estado. Mas estamos no Brasil.

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