Siga a folha

Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.

Descrição de chapéu Eleições 2018

Aposta de alto risco

Decisão de Lula não foi um passo inédito, nem resultado, sobretudo, da indignação com o drama palestino

Assinantes podem enviar 5 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

O maior problema criado pelo apoio brasileiro à denúncia contra Israel, feita pela África do Sul na Corte Internacional de Justiça (CIJ) não é a adesão aberta à ideia controversa de que em Gaza ocorre um genocídio. Afinal, há espaço para discutir como designar o massacre de civis palestinos pelo Exército israelense, que sobrepassa o legítimo exercício do direito de defesa do país diante do selvagem ataque do Hamas, em 7/10.

A decisão do presidente Lula não foi um passo inédito, nem resultado, sobretudo, da indignação com o drama palestino. Outras tragédias humanitárias correm mundo —e o entorno do país— sem que ele julgasse necessário manifestar seu repúdio.

O apoio à iniciativa sul-africana se segue a outros gestos que denotam uma guinada mais ampla na política externa brasileira: parece indicar uma aposta para além de nossa tradicional preferência por um mundo multipolar, no qual a hegemonia dos Estados Unidos seja compensada pela existência de outros centros de poder.

Lula durante reunião nacional do Conselho de política do Ministério de Minas e Energia - Gabriela Biló/Folhapress

Na realidade, há sinais de que o Palácio do Planalto e os conselheiros diplomáticos do seu atual titular possam estar pensando em como situar o país numa ordem internacional "pós-ocidental", como se designa o sistema que resultaria da decadência dos Estados Unidos; do surgimento de países intermediários na escala de poder como a Índia e outras nações do Leste Asiático; e, sobretudo da ascensão da China, para além da esfera econômica.

Só assim se explicariam os rapapés do presidente Lula ao autocrata russo Vladimir Putin, condenado por crimes de guerra pelo Tribunal Penal Internacional. Ou a prioridade dada aos Brics, que passaram a incluir países notórios por seus governos autoritários e, aos poucos, transformados em caudatários do projeto global de poder de Pequim. Ou ainda, o endosso à iniciativa de Pretória.

Se for essa a aposta que inspira a política externa de Lula-3, embute riscos óbvios para o país, no curto e no longo prazo.

De imediato, dá margem a críticas que apontam a inconsistência de uma atuação ora pautada no prudente realismo que sustenta o princípio da não intromissão em decisões internas alheias —e fundamenta a leniente atitude de Lula diante de Cuba e da Venezuela— ora na invocação dos direitos humanos para condenar a invasão de Gaza.

No longo prazo, na ordem pós-ocidental, o Brasil, cujas instituições políticas seguem o figurino da democracia liberal, teria dificuldade de encarar investidas internas, quando lá fora governos autoritários ditarem as regras do convívio internacional.

Pode até ser esse o destino do mundo, mas apostar nele é insensatez.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas