Siga a folha

Professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.

O dilema da cobertura sobre fenômenos pequenos e perigosos

Cobertura exagerada da imprensa americana pode ter ajudado a difundir teoria da conspiração pró-Trump

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Há boas evidências de que o QAnon, uma teoria da conspiração pró-Trump, razoavelmente antiga e com pouca aderência, não desempenhava até pouco tempo um papel muito relevante na política norte-americana.

Em agosto, porém, quando o Facebook derrubou páginas ligadas à conspiração e os principais jornais e sites da imprensa americana fizeram coberturas extensas, a teoria foi colocada no centro do debate sobre o processo eleitoral nos Estados Unidos. O mesmo pode ocorrer no Brasil.

A imprensa enfrenta um desafio: a partir de que momento deve dar atenção e destaque a um fenômeno marginal potencialmente perigoso? Como saber quando não está mais apenas amplificando um fenômeno pequeno, mas alertando a sociedade de algo grave que pode advir?

Apoiador de Donald Trump segura letra 'Q' com a bandeira americana enquanto aguarda o presidente em um comício - Rick Loomis - 1º.ago.2018/AFP

A difusão e a crença no QAnon foi investigada por uma série de pesquisas: em agosto de 2019, o Emerson College investigou a crença na conspiração; em março de 2020, o Centro de Pesquisas Pew publicou pesquisa sobre a familiaridade da população com a conspiração; em junho de 2020, uma equipe da Universidade de Miami, liderada por Joseph Uscinski, tentou caracterizar quem acreditava na teoria.

Em agosto de 2019, 5% dos americanos acreditavam no QAnon, com o mesmo percentual entre democratas e republicanos (6%). Em março de 2020, 76% dos americanos nem sequer tinham ouvido falar do QAnon, mas a distribuição era surpreendente: enquanto 39% dos democratas liberais tinham lido ou ouvido falar da teoria, apenas 20% dos conservadores o tinham.

O resultado era contraintuitivo, porque o QAnon era uma teoria que beneficiava Donald Trump e estava sendo explorada politicamente por ativistas pró-Trump. O fato de liberais terem tido o dobro de exposição à teoria sugere que seu medo estava colaborando para disseminá-la.

E o medo nem sequer era fundado, já que a crença na conspiração não tinha coloração partidária.

Confirmando a pesquisa do Emerson College, a investigação da equipe de Uscinski descobriu que, numa escala de sentimento, na qual 0 é desfavorável e 100 é favorável, o movimento QAnon pontuava apenas 23 pontos, bem atrás de políticos controversos e com uma distribuição equilibrada entre democratas (25) e republicanos (26).

Após o amplo debate sobre o QAnon nos Estados Unidos, o conhecimento da conspiração pelo público deve ser agora bem maior —resta saber se também a crença. Na última semana, reportagens na Folha, no Globo e no Estado investigaram e destacaram a força do fenômeno no Brasil. Será que podemos aprender algo com a experiência americana?

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas