Ampliação de lei para incluir homofobia é abuso de autoridade
Criminalização da discriminação contra o grupo deve ser feita pelo Poder Legislativo
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Como qualquer tipo de discriminação, a homofobia é reprovável e deve ser reprimida. No entanto, no estado democrático de direito, há regras claras que devem ser respeitadas, especialmente aquelas que estão na Constituição Federal.
O Supremo Tribunal Federal (STF) está prestes a confirmar a criminalização da homofobia com fundamento em interpretação da Lei de Racismo (Lei Federal 7.716/89). A lei, expressamente, reconhece os “crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Em nenhum lugar, entretanto, há referência à orientação sexual.
Para incluir o preconceito contra homoafetivos sem mudar a lei há somente uma saída: interpretá-la extensivamente, para alcançar conceitos que não estão em seu texto. Quer dizer, ao interpretar a lei, deve-se inserir a expressão “orientação sexual” onde não existe.
Acontece que esse método é proibido no Direito Penal por aumentar o alcance de uma norma incriminadora. A lei penal, nesse caso, deve ser interpretada literalmente, por uma questão de segurança jurídica.
De acordo com o princípio da legalidade, não há crime sem lei anterior que o defina. Logo, sem a definição na lei, o fato não pode ser criminoso.
Ademais, qualquer modificação em lei federal, segundo a regra constitucional, deve ser realizada exclusivamente pelo Poder Legislativo federal, ou seja, via aprovação da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. É o que diz o princípio da reserva legal, que estipula que ninguém poderá ser punido por algo sem que haja uma lei aprovada em conformidade com as regras do processo legislativo —um dos pilares da democracia ocidental.
A ampliação do texto da lei pelo Poder Judiciário é uma afronta à divisão de poderes da República, por mais nobre que seja o motivo. Dilatar a criminalização por decisão judicial é verdadeiro abuso de autoridade.
A inclusão da orientação sexual como motivo de discriminação ou preconceito deve partir de projeto de lei apresentado por uma das casas do Congresso Nacional, pois somente assim o princípio da reserva legal será obedecido.
Ser contrário à criminalização da homofobia por meio de decisão judicial não significa ser homofóbico. O que se quer é a preservação dos preceitos constitucionais e o equilíbrio entre os poderes.
A homofobia é moralmente reprovável, mas só pode ser combatida dentro das regras da democracia. A pressão pela criminalização deve ser feita sobre o Poder Legislativo, e não sobre o Judiciário. Escapar à regra — em nome de boas intenções — é um precedente perigoso e indesejável. Que o bom senso impere no STF.
João Paulo Martinelli é advogado criminalista, doutor em direito pela USP e professor da Escola de Direito do Brasil (EDB)
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