Deveria ter sido mais duro com quem estava comigo na Fifa, diz Blatter
Banido pela entidade, ex-presidente diz que errou por gestão sem transparência
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À frente da Fifa quando a entidade passou pelo maior escândalo de corrupção do futebol, em 2015, o suíço Joseph Blatter, 82, diz que o maior erro na sua gestão foi a falta de transparência. A federação era uma caixa preta, com apenas 25 integrantes do comitê executivo com acesso às contas e aos contratos.
O cartola deixou a Fifa em 2015. Depois, foi suspenso de atividades ligadas ao futebol pelo Comitê de Ética da federação, que o considerou culpado por "conflito de interesses" e de "gestão desleal".
Isso após decisão do procurador-geral suíço de iniciar procedimentos criminais contra Blatter pelo pagamento de 1,8 milhão de euros (R$ 8,3 milhões) em 2011 a Michel Platini, ex-jogador e ex-presidente da UEFA. Os dois dirigentes afirmaram que o pagamento do valor ocorreu como remuneração de um trabalho de Platini prestado à Fifa em 1998.
"Eu fiquei muito decepcionado na época. Durante um ano, mas me recuperei. Todo esse tema vai ser solucionado. A suspensão não é por corrupção, é por má conduta", afirmou à Folha.
Blatter lembrou a organização da Copa de 2014 no Brasil. Afirmou que o fato de o país ter uma oposição atrapalhou o evento, dando sinais da dificuldade da entidade em lidar com democracia. O Mundial de 2018 está acontecendo na Rússia e a de 2022, no Qatar --países sem democracias plenas.
O dirigente se recusou a falar sobre Ricardo Teixeira, ex-presidente da CBF, e diz desconhecer o coronel Antônio Carlos Nunes, atual presidente.
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O que o senhor pensa hoje sobre João Havelange (1916-2016), seu antecessor na presidência da Fifa?
Ele era uma pessoa excepcional. O senhor Havelange foi um mestre para mim.
E de Ricardo Teixeira?
Eu não quero fazer nenhum comentário sobre esse senhor.
Por quê?
Não, não, não. Estamos falando do futebol e minha presidência terminou, não quero entrar nesse tema.
O senhor imaginava que José Maria Marin e Marco Polo Del Nero eram corruptos?
Imagina [risos]. Na Fifa a situação era a seguinte: eu fui eleito no congresso, mas precisava trabalhar com o comitê executivo, que era escolhido pelas confederações. O presidente da Fifa está sempre em situação em que ele é eleito pelo povo, mas o governo não. Então, eu não sou responsável pelas pessoas que estavam na Fifa, nem pela atuação delas. E se elas são boas ou não, quem deve responder isso são as confederações.
O senhor acha que as investigações do FBI têm a ver com o fato de os EUA terem perdido em 2010 a eleição para sediar a Copa?
A Europa tinha organizado Copas nos últimos anos. A única solução seria a Rússia. De outro lado, para ter rotatividade, então vamos para os Estados Unidos. Quem queria 2018? A Inglaterra. Mas Inglaterra não teria chance, tinha só dois votos. Primeiro perdedor. O segundo foi uma intervenção política, de parte da presidência francesa, com Michel Platini, que me informou que teria problemas porque o chefe de Estado havia recomendado o Qatar. Segundo perdedor? Estados Unidos. O que aconteceu? Os ingleses tinham começado a dizer quem são as pessoas responsáveis pela derrota: Blatter, na Europa, e nos Estados Unidos, Platini. E acabou que quem foi suspenso? Blatter e Platini.
Quatro anos depois, como vê a organização da Copa do Mundo no Brasil?
A Copa no Brasil era muito difícil, não só pelo aspecto de organização, mas porque como em vários países havia oposição. A Copa das Confederações, em 2013, foi difícil. O Mundial também. No último dia, antes da final, recebi uma ameaça pelo telefone. Que havia uma bomba no Maracanã e que eu deveria ter atenção com a minha vida.
Como foi o processo de escolha da Arena Corinthians receber a abertura?
Esse tema faz parte de uma investigação da Justiça. O Brasil apresentou a sugestão de 17 estádios para a Copa. E eu disse: não vamos aceitar. A minha opinião era de 10, mas chegamos em 12.
O Palmeiras tem Mundial? O Mundial de 1951 é oficial?
Disse hoje para todas as pessoas que me perguntam há três dias: o Palmeiras é o primeiro campeão Mundial dos clubes. Eu posso dizer porque não sou mais presidente da Fifa. Para mim, é Palmeiras [risos].
É uma piada?
Não. Discutimos isso, para contestar os brasileiros. Em Moscou, ouvi o tempo todo "Palmeiras, Palmeiras, Palmeiras".
Em todo lugar te perguntam?
Sim, "Palmeiras". Isso é o futebol. A geração futura também vai discutir isso.
A imagem que a Fifa tem hoje é de uma entidade corrupta. Qual a sua responsabilidade?
Essa é a imagem que dão para a Fifa. Mas a Fifa não é corrupta, são pessoas que são corruptas. A Fifa não é corrupta. A Fifa é a mesma, que continua a viver e a organizar esse Mundial. Pessoas, sim. As pessoas agora estão na Justiça, para ver se serão ou não castigados.
O senhor está aqui como convidado da Rússia. Tem ido às partidas?
Eu estou suspenso, como um jogador, um árbitro, um técnico. Eu posso ir a todos os estádios.
Qual é o maior erro que o senhor cometeu na Fifa?
Erros ou faltas? Porque faltas têm punições. Naturalmente cometemos erros. Meu maior erro foi dirigir a Fifa com o principio da direção de confidência, sem transparência. Na minha opinião, isso não se pode fazer. Tinha que ter sido mais duro com as pessoas que dirigiam a entidade. Esse é meu caráter e não posso mudar. Depois do Mundial de 2014, eu deveria ter terminado [meu mandato]. Esse foi um erro grave. As pessoas que estavam ao meu lado, como a família, me disseram: stop, stop [pare]. Você tem uma idade em que todos os outros já estão aposentados. Vá embora. Havia um pequeno problema, porque ao final do ano, o senhor Platini, que era o sucessor normal, me disse para não ir. Outras pessoas também disseram que não havia outro presidente preparado ainda. Esse foi um erro, ou possivelmente uma falta.
O senhor acha que a CBF perdeu força política com o coronel Nunes na presidência?
Não me recordo desse senhor. Definitivamente não me recordo. Nunes?
É o presidente da CBF. Foi colocado pelo ex-presidente Del Nero.
[muda de assunto e fala sobre a seleção]Se o Brasil continuar jogando como hoje, não vai ser campeão. O futebol é um jogo rápido e o Brasil para ir ao ataque pensa que está num treino. Brasil precisa jogar mais rapidamente.
O senhor falou sobre tudo, menos de Ricardo Teixeira.
Não, não. De tudo? Sim.
Por que não fala?
Por que eu deveria falar de Teixeira?
O senhor trabalhou com ele na Copa de 2014 e falou sobre tudo.
Mas não quero falar sobre pessoas que estão nas investigações, em diferentes Justiças. Não quero que falem de mim.
Colaborou Fábio Aleixo, de Moscou
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