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Régis Andaku

Elegância de Federer dentro e fora de quadra fará falta na era da lacração

Tenista deixa vitórias históricas e comportamento exemplar nas derrotas

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Régis Andaku

Formado em jornalismo, escreveu sobre tênis para a Folha de 2000 a 2010

São Paulo

Roger Federer ainda jovem aos 26 anos, mas já o indiscutível número um do mundo. Dez Grand Slams àquela época e dezenas de milhões de dólares na conta. Pete Sampras, Andre Agassi e Lleyton Hewitt aposentados. Rafael Nadal com "só" dois Grand Slam, e Novak Djokovic, três títulos inexpressivos. Federer reinava absoluto.

Quem ousava desafiar Federer? "Não há o que fazer", dizia Andy Roddick, que perdera o número um do ranking para o suíço havia quatro anos. "Fiz o que dava para fazer", falou o bom James Blake, depois de perder seu sexto jogo seguido para o número um –perderia outros quatro nos anos seguintes.

Mas, naquela terça-feira em Miami, tudo desafiava o suíço: do outro lado da quadra, o argentino Guillhermo Cañas, um dos jogadores mais casca-grossa do circuito, tenista talentoso que sofreu ao longo da carreira com contusões e cirurgias. Do lado de fora, milhares de argentinos (e latinos em geral), eufóricos, ruidosos, no limite do (des)respeito.

Roger Federer durante duelo com Alexander Zverev no México - Edgard Garrido - 23.nov.19/Reuters

Enquanto Federer penava e perdia chances de quebrar o saque de um Cañas inspirado e incansável, nas arquibancadas sobravam gritos e provocações que em nada lembravam uma quadra de tênis. Cañas havia conseguido ganhar o primeiro set por muito pouco, Federer levara o segundo fácil, e o terceiro caminhava para o tie-break, depois de quase três horas de "inferno" para o suíço.

Mas esta história não é sobre virada de jogo, nervos, raça ou superação do suíço. Federer perdeu esse jogo, inclusive. É sobre Federer ter simplesmente "jogado tênis": sacado, batido, rebatido, voleado e silenciosamente sido eliminado do torneio, um dos mais importantes do circuito mundial, ainda nas oitavas-de-final.

Naquela partida, talvez na situação mais hostil que enfrentou em quadra em toda a sua longa carreira, Federer não se dirigiu a ninguém: não reclamou ao juiz, não devolveu provocação aos torcedores, não parou o jogo, não atirou a raquete ao chão, nem usou qualquer desculpa para atrapalhar o jogo do adversário.

Mais: logo depois do jogo, em conversa com jornalistas, entre os quais este então colunista de tênis da Folha, disse entender que ali era o torneio dos "sul-americanos", e que era justo que se manifestassem. "Esse é o torneio deles [sul-americanos]. Eles não têm um Masters Series lá, então viajam para cá e assumem que este é um torneio deles, e é assim", falou, sem qualquer tom de reclamação ou crítica ao público.

Mas o ambiente não influenciou o resultado do jogo, insistiam os jornalistas? "Não. É normal que eles [torcedores latinos] apoiem os jogadores deles. Ele [Cañas] nitidamente melhorou bastante o saque dele e também o backhand. Quando jogam [tenistas em geral] contra mim, acho que pensam que têm menos a perder e jogam melhor. Infelizmente hoje eu perdi."

Em um tênis (e um mundo esportivo) que caminha cada vez para a "lacração", para a reclamação escandalosa, para o piti e o uso das artimanhas mais deploráveis (como inventar idas ao banheiro no meio do jogo para atrapalhar o adversário), com atletas em busca da fama instantânea ou apenas um videozinho barato para as redes sociais, vamos sentir falta não só dos golpes elegantes e das vitórias históricas de Roger Federer, mas daquelas poucas derrotas também.

Erramos: o texto foi alterado

Foi grafado incorretamente o nome do tenista James Blake, derrotado seguidas vezes por Roger Federer.

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