Siga a folha

Descrição de chapéu paralimpíadas

Movimento paralímpico nunca esteve tão forte, diz presidente do Comitê Internacional

Brasileiro observa maior interesse nos Jogos Paralímpicos e prevê continuação da festa olímpica vista em Paris

Assinantes podem enviar 7 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Paris

"La fête continue", brincou Andrew Parsons, 47, dizendo que "a festa continua". "Essa é a única frase que vocês vão me ouvir dizer em francês."

É com seu bom humor característico que o brasileiro, presidente do IPC (Comitê Paralímpico Internacional, na sigla em inglês) desde 2017, define sua expectativa em relação aos Jogos que começam nesta quarta-feira (28) em Paris. Com um recorde de 168 delegações, três delas estreantes –Eritreia, Kiribati e Kosovo– e a volta do público, três anos após a edição de Tóquio, impactada pela Covid-19, Parsons acredita que o movimento paralímpico "nunca esteve tão forte".

Dono de uma trajetória incomum até o topo do esporte paralímpico –formado em comunicação pela UFF (Universidade Federal Fluminense), passou de assessor de imprensa do Comitê Paralímpico Brasileiro a presidente da entidade, de 2009 a 2017, antes de assumir o posto atual–, Parsons deseja que os Jogos transmitam, além da mensagem de inclusão, a de esperança de paz. Por isso, ele lamenta que a situação mundial tenha "piorado" desde seu discurso pela paz no encerramento dos Jogos de Inverno de Pequim, em 2022.

A poucas horas da abertura dos Jogos, Parsons falou à Folha sobre seu ponto de vista em relação ao futuro do movimento paralímpico.

Andrew Parsons exibe a chama dos Jogos Paralímpicos - Xinhua

O senhor disse que os Jogos Paralímpicos de Paris serão os mais espetaculares da história. O que o leva a acreditar nisso?
É uma combinação entre o esporte paralímpico, que está mais forte do que nunca em termos da performance dos atletas —a gente tem visto isso no último ciclo—, e as instalações, que a gente viu durante os Jogos Olímpicos, do lado de locais icônicos, Torre Eiffel, Grand Palais, Versalhes etc. E a atmosfera durante os Jogos Olímpicos também foi incrível.

A gente imagina que isso vai ficar para os Paralímpicos. E o impacto. Nós temos mais acordos com televisões no mundo inteiro, 165 [emissoras], o maior número desde sempre. Então, o esporte paralímpico está mais forte do que nunca, com uma atmosfera sensacional, chegando a mais lugares do mundo, isso faz com que seja a edição mais espetacular da história.

A poluição do Sena ainda é motivo de preocupação, depois de toda a controvérsia durante os Jogos Olímpicos?
A gente tem monitorado todos os dias, hoje a situação é boa, do ponto de vista tanto da qualidade da água quanto da corrente. É, como chamam, um "field of play" [campo de competição] que é de certa forma impactado por fatores externos, como o clima. Não é uma preocupação, mas um ponto de atenção. Nós vamos monitorar até o fim da competição de triatlo.

Tem um plano B?
A gente está preparado para todos os cenários. Então, você tem planos B, C e D, dependendo do cenário que aconteça.

Mas um dos planos inclui trocar o lugar da competição?
Vai depender muito, se a gente estiver falando da qualidade da água, se a gente estiver falando da corrente etc. Então, há alternativas para todos os cenários, num lugar que, de novo, é influenciado por chuva, vento, corrente. Não é um ginásio.

A prefeitura anunciou que fez um forte esforço para aumentar a acessibilidade da cidade como um todo. Mas ainda falta muito a ser feito, por exemplo, no metrô. O senhor está satisfeito com o esforço de Paris?
Estou muito satisfeito com o esforço de Paris e do governo nacional. A gente sempre compara com a Paris de sete anos atrás, não compara com outras cidades, não compara com o que é o desejo de todo o mundo, obviamente: uma cidade 100% acessível em todos os meios de transporte, prédios. E, obviamente, não é o caso de nenhuma cidade do mundo. Houve um investimento grande no transporte terrestre, melhorou muito. Então, hoje, uma pessoa com deficiência pode se mover por Paris de uma forma mais acessível e mais eficiente, perder menos tempo no trânsito.

Ontem, a gente ficou impressionado com o anúncio feito pela região de planos para o metrô, para tornar as estações mais acessíveis. É um longo processo. Eles anunciaram a intenção, mas com um terço do financiamento, esperando o governo nacional e o governo municipal. Seria incrível, porque tem relação com os Jogos Paralímpicos. E existe o legado dos Jogos, não só na questão do transporte. Ampliar oportunidades para as pessoas com deficiência no esporte. Na questão da educação, toda pessoa com deficiência vai ter uma escola a menos de 15 minutos de casa.

O senhor acha injusta a diferença de tratamento da mídia em relação aos Jogos Olímpicos?
Acho que a gente está crescendo. É natural que o movimento olímpico, comparado ao paralímpico, ainda tenha uma maior proeminência. São 120 e tantos anos de história [a primeira edição olímpica da era moderna ocorreu em 1896]. O nosso movimento começou em 1960. Mas as Paralimpíadas mais relevantes, expressivas, começaram em Seul, em 1988. Ainda é um movimento novo.

O que a gente gosta de comparar é o paralímpico com o paralímpico. Então, onde a gente estava cinco anos atrás? Há dez anos? A gente vem avançando. Como eu falei, em Paris, temos mais representantes de imprensa, mais países estão interessados nas Paralimpíadas. Então, o interesse vem crescendo.

O senhor não é um ex-paratleta. Acha que seu sucessor deveria ser um ex-paratleta? Isso aumentaria a representatividade simbólica do Comitê Paralímpico?
Eu acho que a gente precisa da pessoa certa. Anos atrás, em 2009, o meu predecessor [Philip Craven] me disse a mesma coisa. E ele tem deficiência, disputou cinco Paralimpíadas. E me perguntou se um dia eu pensava em ser presidente do Comitê Paralímpico Internacional. Naquela época, eu tinha acabado de ser eleito presidente do CPB. Eu disse algo semelhante ao que você me perguntou.

Falei: "Olha, eu acho que talvez depois de você, talvez esse conceito se cristalize, de ser um ex-atleta". Ele deu um murro na mesa e falou: "Isso é uma besteira! A gente precisa da pessoa certa". Ele falou: "Eu não sou a pessoa certa só porque eu fui um atleta. A minha experiência, a minha história de vida, tudo isso me levou a ser um bom presidente. Com você é a mesma coisa, mas você não tem deficiência".

Andrew Parsons acende a tocha dos Jogos Paralímpicos em Stoke Mandeville, na Inglaterra, ao lado do hospital em que surgiu a ideia da competição - AFP

Foi anunciada a participação de 88 atletas de nacionalidade russa como atletas neutros. Como tratar a possibilidade de manifestações políticas durante os Jogos?
A decisão de ter atletas de nacionalidade russa como neutros é nossa, da Assembleia Geral, quer dizer, não é uma decisão só do Comitê Executivo. A gente respeita o nosso próprio estatuto, é democracia, a gente implementou a forma de eles poderem participar por uma decisão da nossa Assembleia Geral. Existem regras muito claras no que diz respeito a manifestações políticas. Existem locais em que elas podem ser feitas e locais onde elas não devem ser feitas –o pódio, por exemplo.

Nas zonas mistas os atletas podem falar o que querem. Agora, obviamente, a gente tenta fazer com que os Jogos não sejam um palco para questões políticas. Ao contrário, a mensagem é para todo o mundo, e a Vila Paralímpica é um local simbólico disso para todos que vão competir, que são rivais no campo. Eles convivem em harmonia, debaixo do mesmo teto. Já tivemos atletas de países com guerra entre eles em outras edições. Nunca tivemos um histórico de briga. A gente imagina que não vai acontecer.

Alguns esportes, como atletismo e natação, vão ter estruturas próprias de organização internacional daqui a dois anos. Isso enfraquece de alguma forma o Comitê Paralímpico?
Não. Aliás, é uma decisão nossa. E é uma parte do ciclo de desenvolvimento. Quando o Comitê Paralímpico Internacional surgiu, éramos organizados em áreas de deficiência: amputados, cadeirantes, cegos, atletas com deficiências intelectuais e da área da paralisia cerebral. Com o tempo, esse modelo migrou para o que é o modelo esportivo, organizado por modalidades. E algumas ficaram dentro do Comitê Paralímpico Internacional.

Houve dois momentos importantes de transição. Um foi em 2008, quando algumas modalidades já saíram de dentro do guarda-chuva do IPC para federações internacionais. E todos, sem exceção, cresceram. E houve uma decisão do Comitê Executivo de transferir outros dez que a gente ainda tinha no nosso chapéu, para federações internacionais.

Em atletismo e natação, abrimos uma concorrência internacional, de constituí-los em federações internacionais específicas paralímpicas. Então, eles não vão para o World Athletics nem para o World Aquatics. Isso também elimina um conflito de interesse grande. Com isso, essas entidades vão dar um foco específico ao desenvolvimento dessas modalidades.

O que é preciso para o esporte paralímpico ter uma celebridade, como Simone Biles ou Teddy Riner?
A gente teve uma celebridade global só até o momento. Foi o Oscar Pistorius, e, obviamente, as questões pessoais levaram a um caminho negativo [condenado em 2014 pelo assassinato da companheira, o sul-africano ganhou liberdade condicional em janeiro passado]. Ainda não temos celebridades globais, mas celebridades nacionais. O Daniel Dias, no Brasil, é grande.

Eu acho que é, realmente, o crescimento dos Jogos [que vai formar as celebridades]. A Simone Biles, por exemplo, é muito conhecida exatamente pela performance dela nos Jogos Olímpicos. A gente tem que crescer, como evento, para que essas performances atinjam mais gente e eles possam se tornar ícones globais. A gente está no caminho, ainda não chegamos lá.


Raio-X

Andrew Parsons, 47
Formado em comunicação pela Universidade Federal Fluminense, assumiu a presidência do Comitê Paralímpico Internacional em 2017. Em 2021, foi reeleito, para um segundo mandato de quatro anos. Presidiu o Comitê Paralímpico Brasileiro de 2009 a 2017, depois de ter sido assessor de imprensa da entidade. É um dos dois brasileiros membros do Comitê Olímpico Internacional (o outro é o ex-jogador de vôlei Bernard Rajzman).

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas