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Qual será o impacto para a economia em um governo Trump-Vance

Escolha de vice-presidente mostra mudança do conservadorismo de livre mercado para o populismo econômico

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James Politi
Washington | Financial Times

A escolha do senador JD Vance para ser vice-presidente de Donald Trump na chapa que disputa a presidência dos Estados Unidos consolida a mudança do Partido Republicano do conservadorismo de livre mercado das eras Reagan e Bush para o populismo econômico do movimento Make America Great Again (Faça a América grande de novo), slogan adotado pela campanha trumpista.

E se os republicanos vencerem em novembro, o impacto da agenda econômica Trump-Vance em tudo, desde o comércio global até os impostos corporativos, pode ser enorme —e perturbador para os negócios e aliados dos EUA.

Donald Trump e J.D. Vance participam da convenção do Partido Republicano, nos Estados Unidos - Reuters

"As pessoas como JD Vance... estão sendo realistas sobre a economia global do século 21. Ela tem desafios diferentes dos que ocorriam na época de Ronald Reagan", disse Nick Iacovella, do think thank Coalizão por uma América Próspera.

Mas o que realmente fará o Maganomics (termo usado para a economia do Make America Great Again)?

MAIS GUERRAS COMERCIAIS?

O desprezo de Trump pelo comércio global tornou-se mais evidente após sua saída do cargo e é compartilhado por Vance. O ex-presidente propõe uma tarifa abrangente de 10% sobre todas as importações, além de uma taxa de 60% sobre produtos da China.

Analistas acreditam que as tensões comerciais com aliados europeus e asiáticos, e possivelmente até com o Canadá, voltarão a surgir. Trump também quer um dólar mais fraco para ajudar a impulsionar as exportações, o que pode trazer atritos na política cambial com parceiros comerciais.

Durante seu primeiro mandato, as batalhas comerciais de Trump foram raivosas, mas erráticas: ele alternava ameaças e medidas punitivas com esforços para negociar acordos bilaterais, inclusive com a China.

Ele gerenciou as repercussões dentro dos EUA subsidiando algumas vítimas de tarifas retaliatórias, incluindo agricultores em estados como Wisconsin, que está sediando a convenção republicana nesta semana.

Havia algumas divisões até mesmo dentro da própria administração de Trump sobre até onde ir com os impostos, bem como resistência de alguns republicanos no Capitólio.

Mas o Partido Republicano está hoje muito mais alinhado com as visões anti-globalização de Trump sobre o comércio e abraçou seus planos de reprimir a imigração. Os negócios nos EUA estarão cautelosos com ambas as posturas, temendo a perda de mercados estrangeiros e trabalhadores imigrantes.

"A principal força da ordem americana pós-guerra de globalização tem envolvido confiar cada vez mais em mão de obra mais barata. A questão do comércio e da imigração são dois lados da mesma moeda", disse Vance ao jornal The New York Times no início deste ano.

ATÉ ONDE VAI A REDUÇÃO DE IMPOSTOS?

Diminuir impostos tem sido um pilar da economia republicana por décadas. Em 2017, um Congresso republicano e Trump promulgaram um pacote abrangente de cortes de impostos corporativos e individuais de US$ 1,7 trilhão.

Eles estão previstos para vencerem no próximo ano, a menos que Trump os torne permanentes. Ele também quer reduzir a taxa corporativa, que hoje é de 21%.

Os democratas dizem que o plano é mais um enorme presente para os ricos. Portanto, os republicanos querem estruturar o pacote para não parecer tão benéfico para as famílias e empresas mais ricas. Vance afirmou ter dúvidas sobre alguns dos cortes de impostos.

"Eu não acho que isso será uma extensão direta, haverá algumas visões concorrentes", disse Doug Holtz-Eakin, diretor da think thank de direita American Action Forum. "Há conversas abertas sobre talvez até aumentar a taxa corporativa, porque não nos importamos com grandes empresas, e usar esse dinheiro para perseguir outros objetivos."

Outra questão paira sobre os bilhões de dólares em incentivos fiscais aprovados pelo presidente Joe Biden para impulsionar a indústria nacional. As medidas —especialmente aquelas para energia limpa— foram criticadas pelos republicanos. Mas muitas regiões dos EUA estão se beneficiando dos novos empregos, e os republicanos estão cada vez mais simpáticos a uma noção antes considerada maldita no partido: a política industrial americana.

"Eles não votaram por elas. Eles não as projetaram, mas muitos de seus eleitores estão recebendo-as. Veremos quando a realidade bater o quão fácil será remover algumas delas", disse Holtz-Eakin.

A FAVOR OU CONTRA OS NEGÓCIOS?

A convenção republicana deu um lugar de destaque a um orador inesperado na noite de abertura: o chefe do sindicato dos Teamsters, Sean O’Brien. Ele criticou as grandes empresas, com Trump e Vance sentados a poucos metros de distância.

"Lembrem-se, as elites não têm partido, as elites não têm nação. Sua lealdade é ao balanço patrimonial e ao preço das ações às custas do trabalhador americano", disse ele.

É improvável que Trump abrace repentinamente a sindicalização ou os direitos trabalhistas, mas a aparição de O’Brien mostra como o apoio republicano às grandes empresas e multinacionais como criadoras de empregos benéficas não é mais garantido.

A fúria contra a América corporativa nos últimos anos tem sido amplamente direcionada à promoção de objetivos sociais progressistas, alimentando confrontos como o que ocorre na Flórida, entre o governador Ron DeSantis e a Walt Disney.

Mas uma recente pesquisa FT-Michigan Ross mostrou que os americanos acreditam que as corporações, ainda mais do que os políticos, são responsáveis por seus problemas econômicos —mais munição para líderes populistas.

Os aliados de Trump e grandes empresários doadores provavelmente escaparão de sua ira pública, mas a disposição do partido de atacar diretamente os executivos cresceu de forma acentuada.

No mês passado, o senador republicano Josh Hawley, que compartilha as visões de Vance sobre negócios, criticou o chefe da Boeing, Dave Calhoun, por falhas de segurança no grupo aeroespacial e seu pacote de remuneração. Os republicanos costumavam pensar que o dinheiro recebido pelos executivos era uma questão para as empresas e seus conselhos.

"Você está sendo compensado como nunca antes", disparou Hawley.

REGULAMENTAÇÕES SERÃO AFROUXADAS?

A desregulamentação tem sido um mantra republicano por anos. Em alguns setores, como energia e clima, uma nova administração Trump tentaria rapidamente reverter medidas antipoluição e anti-emissão, enquanto promove a produção de combustíveis fósseis.

Mas em outras áreas a resposta não é automática. Vance fez alianças incomuns com parte da esquerda ao apoiar as políticas antitruste rigorosas de Lina Khan, a presidente da Comissão Federal de Comércio nomeada por Biden e odiada em Wall Street.

"(Khan é) uma das poucas pessoas na administração Biden que eu acho que está fazendo um trabalho muito bom", disse Vance.

Sua postura poderia colocar as empresas de tecnologia na mira de uma segunda administração Trump, dado os questionamentos que elas têm recebido das autoridades de concorrência.

Mas outros setores também poderiam enfrentar um ambiente regulatório mais rigoroso do que o usual sob uma nova administração Trump.

Por exemplo, Vance se juntou a vários democratas, incluindo Elizabeth Warren, ao pedir que os reguladores recuperem a remuneração em caso de falências bancárias. Ele se juntou ao senador democrata Sherrod Brown ao pedir melhores protocolos de segurança ferroviária após o descarrilamento de um trem de carga no estado.

Ele também expressou certa admiração pelo senador democrata Bernie Sanders. "As pessoas da esquerda, eu diria, cuja política estou aberto — são os Bernie Bros", disse Vance ao The New York Times no início deste ano.

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