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Vice de Covas reuniu secretário, perito e creches ligadas a ele para discutir aluguéis

Grupo político de Ricardo Nunes administra creches conveniadas e tem faturamento milionário com a prefeitura

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São Paulo

Para discutir um reajuste no valor pago pela prefeitura no aluguel de creches, o vereador Ricardo Nunes (MDB) promoveu uma reunião com representantes de entidades ligadas a ele, o secretário municipal de Educação e um perito que avalia o valor de imóveis. Nunes é o vice na chapa de Bruno Covas (PSDB).

Como a Folha mostrou em reportagens, Nunes mantém uma teia de conexões entre empresas, parentes e indicados políticos com cargos na gestão que envolvem creches contratadas pelo município e pessoas que têm contratos de aluguéis onde funcionam esses espaços.

O dinheiro para alugar as creches é repassado pela prefeitura às gestoras que, por sua vez, pagam aos locadores. Por terem valores considerados altos em regiões pouco valorizadas da cidade, o aluguel de creche passou a ser visto como um bom negócio.

A prefeitura vem sofrendo resistências ao tentar reduzir os valores dos aluguéis após uma portaria de 2017 que estabeleceu 0,8% do valor venal de referência do imóvel como limite da mensalidade.

Foto da reunião de agosto de 2019 em que aparecem o vereador e candidato a vice-prefeito Ricardo Nunes (segundo da esquerda para a direita, de barba), o secretário municipal de Educação, Bruno Caetano (de camisa branca ao lado de Nunes), o perito Antonio Souza (segundo da direita para a esquerda) e Luiz Baldo, presidente da Sobei (de paletó claro, ao centro) - Facebook/Reprodução

A reunião em questão, realizada em 28 de agosto de 2019, tratava justamente dos aluguéis. Além do vice de Covas e do secretário Bruno Caetano, estavam no encontro Antonio Souza, perito, e Luiz Baldo, presidente da Sobei (Sociedade Beneficente Equilíbrio de Interlagos), entre outros.

A mantenedora (Sobei) queria reajustar os valores dos aluguéis, em meio a um imbróglio envolvendo uma ação de um proprietário de imóvel contra a entidade que culminou no bloqueio de uma conta bancária dela, segundo a reportagem apurou.

“Nenhum pleito foi atendido, já que o pedido já havia sido judicializado, e a Secretaria Municipal de Educação apenas orientou a mantenedora sobre os procedimentos que foram implementados para que fossem revistos os aluguéis dos prédios que abrigam creches na cidade”, afirma a gestão Covas, em nota.

A reportagem apurou que este tipo de reunião, em que vereadores aparecem com diversos membros de entidades gestoras de creches, é comum. Como é uma das funções do secretário prestar contas ao Legislativo, ele é alvo de pressões envolvendo vereadores e as entidades ligadas a ele.

A Sobei é uma das principais entidades da rede conveniada e atende quase 5.000 crianças na cidade. Segundo o site da prefeitura, ela recebe R$ 2,7 milhões por mês em repasses, dos quais R$ 363 mil são para aluguéis.

Nunes é ex-conselheiro da Sobei e costuma ciceronear políticos na entidade. Ele também tem ou teve ao menos três servidores que pertencem à Sobei como assessores. Um dos locadores de prédios da entidade é próximo do vereador e já doou para a sua campanha.

Questionado sobre a reunião, Nunes afirmou que os participantes "foram definidos pela direção da entidade, essa sim convidada por mim”. Também disse que se trata de uma grande entidade, que tem participação de vários políticos, incluindo a ele.

O vereador afirmou que a reunião em questão tratava de um assunto que devia ser levado à secretaria.

“A Sobei teve parte do valor de sua conta corrente bloqueado por conta de uma ação judicial de um proprietário de imóvel, que ingressou cobrando as correções por alguns anos, que não foram realizados. Como a entidade repassa ao proprietário o valor recebido da Secretaria de Educação e estava com esse problema, era necessário apresentar a questão à secretaria”.

Outro participante, o perito Antonio Souza faz avaliações imobiliárias, incluindo pareceres com o valor que a prefeitura deveria pagar de aluguel de imóveis.

Além de ter participado da reunião com a Sobei, ele já prestou serviço para locador de imóvel relacionado à entidade Acria (Associação Amiga da Criança e do Adolescente), ligada a Nunes.

Souza publicou foto da reunião em uma rede social que, segundo ele, teve como tema “avaliação imobiliária”. À reportagem ele afirmou que foi "discutir com o Bruno [Caetano, secretário] uma situação bastante peculiar dos valores venais dos imóveis, com base neles são feitos os valores de locação e tudo mais."

Segundo ele, a reunião foi para esclarecer aspectos técnicos. "Acabam sendo feitas algumas cobranças talvez de forma indevida, pagamento de forma indevida, para menos, então dado o meu profissionalismo me pediram para fazer alguns trabalhos", diz.

Souza e Ricardo Nunes aparecem juntos em uma série de fotos publicadas em redes sociais desde pelo menos 2015. Em uma foto de abril de 2019 também aparece o prefeito Bruno Covas.

Além da presença em eventos, Nunes afirmou que já contratou os serviços de Souza "para fazer avaliação em quatro imóveis que estavam alugados para UBS e o seu laudo demonstrou que os valores estavam acima do mercado e utilizei esse material para notificar a Secretaria e representar no MP".

A reportagem questionou Souza se houve pressão da Sobei para aumentar o valor que recebe da prefeitura, o que foi negado pelo perito.

"Não entendi dessa maneira em hipótese nenhuma. O que existe é que na região onde estavam sendo feitas as avaliações são regiões onde não existe praticamente o valor venal dos imóveis, porque são áreas que não tinham valor venal. Nessa posição eu atuei para que determinasse o valor do imóvel."

Uma das demandas de entidades da periferia é que os os valores de referência da prefeitura, mais baixos nessas regiões, não refletem a realidade desses locais.

A reportagem procurou a Sobei para comentar o assunto, mas não localizou nenhum responsável.

Para Marco Antonio Carvalho Teixeira, professor de gestão pública da Fundação Getúlio Vargas, a participação de Ricardo Nunes nesse tipo de reunião é inadequada.

"A função do vereador enquanto eleito não é esta, muito pelo contrário. Ele é um fiscal da administração pública, um representante da defesa do interesse pública. No caso, ele parece ter agido muito mais como um representante de uma parte interessada", diz.

A gestão Covas enviou nota afirmando que o secretário da Educação, Bruno Caetano, já recebeu 27 vereadores em 70 encontros, “que são atividades inerentes ao cargo para abordar questões referentes ao desenvolvimento das políticas públicas ligadas à pasta”.

A nota da prefeitura também que mais de 300 creches que apresentaram irregularidades foram descredenciadas. Além disso, há medidas como site para cidadãos cadastrarem imóveis para locação de creches e contratação de engenheiros para fazer vistorias nos prédios.

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