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Morre Mozart Vianna, secretário-geral da Câmara por 25 anos e promotor da transparência no Legislativo

Braço direito de 12 presidentes da Casa, ele queria ser padre, mas acabou abandonando o seminário e virando peça-chave da estrutura técnica de Brasília

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Brasília

Secretário-geral da Câmara dos Deputados por 25 anos e braço direito na área legislativa de 12 presidentes da Casa, Mozart Vianna de Paiva morreu nesta segunda-feira (7), aos 70 anos, em Brasília.

A família não divulgou a causa da morte.

Mozart Vianna em 2011, quando deixou a secretaria-geral da Câmara para se tornar assessor especial do senador Aécio Neves - Marcelo Camargo 24.jan.2011/Folhapress

Mozart foi peça importante na estrutura de comando legislativo da Câmara, desde a época da Constituinte de 1988 até 2015, quando deixou a função. Ligado a políticos como Ulysses Guimarães (1916-1992), Aécio Neves (PSDB) e Michel Temer (MDB), tinha profundo conhecimento do regimento interno da Casa e era bastante querido pelo corpo técnico que chefiou de 1991 a 2015.

Além de demonstrar extremo zelo pela confiabilidade dos dados que administrava e pelo cumprimento das regras legislativas, tinha como característica atender de forma ágil, não importava a hora do dia e mesmo em fins de semana, às constantes demandas por informações das dezenas de jornalistas que fazem a cobertura diária da Câmara dos Deputados.

Prática que se manteve mesmo depois que ele deixou o cargo e passou a ser fonte de consulta de vários jornalistas que continuaram o procurando devido à sua experiência e conhecimento técnico.

"Era uma pessoa excepcional, um profissional exemplar, com uma longa ficha de trabalho prestado à Câmara. Um amigo, com um coração enorme. E tinha uma paciência de Jó para ouvir as pessoas, mesmo nos momentos mais atribulados", lembra Francisco da Silva Cardozo, conhecido na Câmara apenas como Chico, colega de trabalho por vários anos e um de seus amigos mais próximos.

A Folha conversou nesta segunda com vários ex-funcionários de Mozart. Todos repetiram, com pequenas variações, a manifestação positiva de Chico.

Natural de Corinto, no interior de Minas Gerais, Mozart morou dos 10 aos 18 anos em um internato franciscano em Santos Dumont, na Serra da Mantiqueira, também em Minas, antes de se mudar para Brasília.

"Saí do seminário porque precisei ajudar a família. Eu tinha vocação, queria ser padre, sim; não saí por falta de vocação. Deixei o seminário e vim enfrentar a luta", disse no depoimento que prestou ao projeto "História Oral da Constituinte 1987-1988".

Em Brasília, começou a trabalhar na Câmara em 1976 como assistente legislativo.

A partir da Constituinte seu trabalho ganhou projeção, o que o levou para o comando da Secretaria-Geral da Mesa, que é a responsável pela coordenação da área legislativa da Casa, em 1991.

Nos 25 anos em que comandou a secretaria-geral, Mozart passou a ser figura fácil ao lado dos presidentes da Câmara, nas sessões deliberativas. Ficava em pé, ao lado deles, soprando fora do microfone orientações sobre, à luz do regimento, qual deveria ser a decisão a ser tomada pelo político nas muitas vezes acaloradas sessões de votação da Câmara.

Só em 2005 o então presidente Severino Cavalcanti (PP-PE), morto no ano passado, arranjou-lhe uma cadeira fixa.

A história é contada por Mozart em seu depoimento à Câmara: "Ele [Severino] estava em casa, e a Dona Amélia, a senhora dele, uma pessoa muito distinta, perguntou a ele: 'Severino, quem é aquele deputado que não larga do seu pé, fica em cima de você o tempo todo, não dá sossego. Como é que você permite isso?'", relata Mozart.

Segundo sua memória, Severino respondeu a ela: “Não, é um funcionário que me assessora lá”.

"Daí ela mudou o discurso na hora: 'Severino, um funcionário trabalhar tantos horas em pé? Você vai arrumar uma cadeira para ele semana que vem!'. Então, graças à dona Amélia e ao deputado Severino, passei a ter uma cadeira para sentar no plenário."

Mozart deixou a Câmara pela primeira vez em 2011 para assessorar Aécio Neves no Senado. Mas voltou novamente à função da chefia legislativa da Casa pouco depois, com Henrique Eduardo Alves (MDB-RN). Em 2015, na gestão de Eduardo Cunha (MDB-RJ), aposentou-se da Câmara.

Ele teve breve passagem pelo setor de relações institucionais da TV Globo em Brasília e, depois, como assessor da Presidência da República, na gestão Temer (2016-2018), sua última atividade profissional.

No seu depoimento à Câmara, foi-lhe pedida uma avaliação sobre seu próprio trabalho.

"Não gosto de avaliar a mim mesmo. Sempre digo que quando é para avaliar o meu trabalho aqui é sobre o que eu fiz e o que eu fiz com outras pessoas, e não fiz só. Então, qualquer coisa que eu posso falar do meu trabalho é que foi muito trabalho, sim, trabalho que exigia muita atenção. Em um ambiente político, um erro pode gerar um problema. Então, requer-se muita atenção. Pelo que ouço das pessoas, muitas pessoas dizem, com sinceridade, que fiz um bom trabalho. Eu agradeço. E, se várias pessoas dizem isso, não tenho por que dizer que não."

Mais adiante, acrescentou: " Eu amo a Câmara. Esta será sempre a minha Casa".

Mozart deixa mulher, Áurea, e quatro filhos, Marcelo, Diego, Thiago e Danielle.

Políticos se manifestaram sobre a morte.

"Acabo de ser avisado do falecimento do meu amigo Mozart Vianna. Como Secretário-Geral da Câmara dos Deputados, dr. Mozart prestou relevantes serviços a mim, ao Congresso Nacional e ao Brasil. Descanse em paz", escreveu Michel Temer em suas redes sociais​

"O Brasil perde um servidor público exemplar. Altamente preparado, dedicado e discreto, por onde passou Mozart deixou amigos e admiradores entre os quais me incluo. Me orgulho muito dos vários anos em que trabalhamos juntos. Que Deus possa confortar seus familiares e amigos", disse Aécio Neves, por meio de nota.

"Quero externar os meus mais sinceros votos de pesar pela perda desse grande profissional que sempre atuou com dedicação, lealdade e eficiência", afirmou Eduardo Cunha. "Perdemos hoje o maior exemplo de servidor público. Dedicado à Câmara, ao interesse do Brasil, ao interesse público. Perdermos um grande exemplo para todos nós", escreveu em suas redes sociais o ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) afirmou, também nas redes sociais, que, em nome de todos os funcionários da Câmara, lamentava a morte "do mais longínquo e respeitado secretário-geral da Mesa, notadamente um dos maiores conhecedores do regimento interno".

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