Descrição de chapéu The New York Times

Com 62 luas recém-descobertas, Saturno derruba Júpiter de seu pedestal

Astrônomos já identificaram 145 satélites naturais no planeta dos anéis e acreditam existir muitos mais

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Jonathan O'Callaghan
The New York Times

No canto vermelho do ringue está Júpiter, o maior planeta que orbita nosso Sol e aquele que moldou nosso sistema solar com seu volume gravitacional.

No canto azul, Saturno, o magnífico mundo anelado com misteriosas tempestades hexagonais em seus polos.

A luta entre esses dois mundos gigantescos pela primazia em matéria de satélites já está avançada. Mas agora a disputa para saber qual planeta tem mais luas em sua órbita pendeu decisivamente a favor de Saturno.

Baseada em um conjunto de objetos descobertos por astrônomos, neste mês a União Astronômica Internacional vai reconhecer 62 luas adicionais de Saturno. Os pequenos objetos darão a Saturno 145 luas ao todo, superando de longe o total de 95 luas de Júpiter.

Saturno com seus majestosos anéis e quatro de suas 145 luas descobertas pelos astrônomos
Saturno com seus majestosos anéis e quatro de suas 145 luas descobertas pelos astrônomos - Nasa/JPL/USGS via NYT

"Os dois planetas possuem muitas, muitas luas", disse Scott Sheppard, astrônomo do Instituto Carnegie de Ciência, em Washington. Mas, por motivos que não são inteiramente compreendidos, Saturno "parece ter muito mais".

As luas de Saturno recém-descobertas não se parecem em nada com o objeto luminoso visto no céu noturno da Terra. Seu formato é irregular, como batatas, e seu diâmetro não passa de três ou quatro quilômetros. E elas orbitam o planeta a uma grande distância, entre 10 e 30 milhões de quilômetros, diferentemente das luas maiores, como Titã, a maioria das quais orbitam a até 1,6 milhão de quilômetros de Saturno. Mas essas luas pequenas e irregulares são fascinantes. Elas se acumulam em grupos e podem ser remanescentes de luas maiores que se despedaçaram enquanto orbitavam Saturno.

"Essas luas são fundamentais para o entendimento de algumas das grandes perguntas sobre o sistema solar", disse Bonnie Buratti, do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, na Califórnia, e vice-diretora científica de projeto da missão futura Europa Clipper a Júpiter. "Possuem as impressões digitais de eventos que ocorreram no sistema solar primordial."

O número crescente de luas também chama a atenção para possíveis divergências sobre o que constitui uma lua.

"A definição simples de uma lua é que ela é um objeto que orbita um planeta", afirmou Sheppard. O tamanho do objeto não vem ao caso, por enquanto.

As novas luas foram descobertas por dois grupos, um encabeçado por Sheppard e o outro, mais recentemente, por Edward Ashton, do Instituto de Astronomia e Astrofísica da Academia Sinica, em Taiwan. Em meados dos anos 2000 o grupo de Sheppard usou o telescópio Subaru, no Havaí, para procurar mais luas em volta de Saturno.

Em março deste ano, Sheppard também foi responsável por encontrar 12 novas luas de Júpiter, elevando o planeta temporariamente acima de Saturno na disputa para ver quem possui mais luas. Mas esse recorde parece ter tido vida curta.

Entre 2019 e 2021 o grupo de Ashton usou o telescópio Canadá França Havaí, vizinho do telescópio Subaru, em Mauna Kea, para procurar mais luas de Saturno e verificar algumas das descobertas de Sheppard. Para uma lua ser dada como autêntica, precisa ser avistada múltiplas vezes "para certificar que se trata de um satélite e não simplesmente um asteroide que está perto do planeta por acaso", disse Mike Alexanderson, responsável pela confirmação oficial de luas na União Astronômica Internacional.

A maioria das luas irregulares de Saturno orbita o planeta em grupos batizados pelos astrônomos como inuítes, nórdicos e gauleses. Os objetos que integram cada grupo podem ser resquícios de luas maiores, de até 240 quilômetros de diâmetro, que orbitaram Saturno no passado, mas foram destruídas por impactos de asteroides ou cometas ou por colisões entre duas luas. "Sua existência aponta para uma história longa de colisões em volta desses planetas", afirmou Sheppard.

Essas luas originais podem ter sido capturadas por Saturno "em um momento muito inicial do sistema solar", explicou Ashton, possivelmente nas primeiras centenas de milhões de anos após sua formação, 4,5 bilhões de anos atrás. Porém nem todos orbitam nesses grupos. Algumas poucas luas rebeldes orbitam em sentido retrógrado —ou seja, oposto às órbitas das outras luas.

Esses objetos podem ser singulares. Podem ser os derradeiros resquícios do que se formou na região dos planetas gigantes. São provavelmente objetos muito ricos em gel

Scott Sheppard

Astrônomo do Instituto Carnegie de Ciência

"Não sabemos o que está acontecendo com essas luas retrógradas", disse Sheppard. Ashton desconfia que possam ser remanescentes de uma colisão mais recente.

É difícil obter mais informações sobre as luas novas, devido a seu tamanho pequeno e suas órbitas distantes. Elas parecem constituir uma classe particular de objeto, diferente dos asteroides que se formaram no sistema solar interno e dos cometas do sistema solar externo. Mas não se sabe muito mais que isso.

"Esses objetos podem ser singulares", afirmou Sheppard. "Podem ser os derradeiros resquícios do que se formou na região dos planetas gigantes. São provavelmente objetos muito ricos em gelo."

Até sua destruição em 2017, a sonda Cassini da Nasa conseguiu observar cerca de duas dúzias de luas em volta de Saturno. Embora não tenha chegado suficientemente perto para estudá-las detalhadamente, os dados que colheu permitiram a cientistas determinar o período de rotação, o eixo de giro e até o formato de algumas das luas, segundo Tilmann Denk, do Centro Aeroespacial Alemão em Berlim, que chefiou as observações. A Cassini também encontrou gelo em abundância na superfície de uma das luas irregulares maiores, Phoebe.

Observações mais detalhadas das luas minúsculas de Saturno podem proporcionar aos cientistas um vislumbre de um momento turbulento do sistema solar primordial. Durante esse período, as colisões eram mais comuns e os planetas disputaram posições. Acredita-se que Júpiter teria migrado de uma posição mais próxima do Sol para uma mais distante, perto de sua órbita atual. "Isso nos traz informação adicional sobre a formação do sistema solar", disse Denk.

Mas as luas irregulares que estamos vendo até agora podem ser apenas o começo. "Estimamos que haja potencialmente milhares" em volta de Saturno e Júpiter, afirmou Ashton. Também Urano e Netuno podem ter muitas dessas luas irregulares, porém sua distância vasta do Sol as torna difíceis de descobrir.

Saturno, apesar de ser menor que Júpiter, parece possuir muito mais luas irregulares. É possível que tenha três vezes mais que Júpiter, as menores medindo cerca de três quilômetros. A razão disso não está clara, disse Ashton.

As luas originais de Júpiter podem ter sido maiores, menos propensas a se despedaçar. Ou Saturno pode ter capturado mais objetos em sua órbita que Júpiter. Ou as luas de Saturno podem ter seguido órbitas mais propensas a se sobrepor e colidir, produzindo luas menores, irregulares.

Seja qual for a razão, o resultado está claro. Júpiter está na defensiva e é pouco provável que recupere seu título de planeta com mais luas. À medida que aumentar a capacidade dos astrônomos de localizar satélites cada vez menores, "Saturno vai sair ganhando de longe", disse Andersen. "Acho que nem é mais uma competição."

Tradução de Clara Allain

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