Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Descrição de chapéu Apple

Mercados nos tribunais

Agências reguladoras e tribunais devem atuar para reduzir assimetrias de informação

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Corre na Justiça uma ação contra a Apple por vender telefone sem carregador. No ano passado, o Senado aprovou lei determinando que planos de saúde cubram tratamentos fora da lista da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). No início do ano, a ANS incluiu um medicamento cuja dose custa R$ 6 milhões no rol de procedimentos cobertos pelos planos.

Esses são alguns dos muitos exemplos de intervenções do Legislativo, Judiciário e de agências reguladoras nos mercados. Qual o papel dessas intervenções?

A princípio, pode parecer que estão em jogo o ganho das empresas e os gastos das famílias. Ao decidir a favor dos consumidores, leis, tribunais e agências estariam tornando os produtos mais baratos e reduzindo os lucros das companhias.

Conectores de iPhone
Conectores de iPhone - Frederic J. Brown - 12.set.2023/AFP

De fato, o efeito imediato de uma ação na Justiça é esse mesmo. Se a Apple tiver que entregar um carregador para quem comprou iPhone nos últimos tempos, haverá uma transferência de recursos da empresa para os compradores.

Contudo, essas intervenções têm outros efeitos que se sobrepõem a esse último —e, portanto, finalidades diferentes da divisão de recursos entre empresas e consumidores.

Preços de bens e serviços dependem de muitos fatores, mas dois são particularmente importantes em quase todas as situações: o custo e a reação da demanda ao preço.

Quando há muita concorrência, a demanda reage fortemente ao preço. Nesses casos, um pequeno aumento no preço de venda reduz fortemente a demanda. Um banco que tentar vender dólares 5% acima do valor de mercado não conseguirá vender nada.

Quando a concorrência é acirrada, o preço de venda fica próximo do custo porque uma pequena redução no preço leva a um grande aumento nas vendas. Assim, é mais lucrativo praticar preços próximos do custo (o lucro da venda de dólares a um preço alto é zero, pois ninguém compra). Quando há pouca concorrência, é mais lucrativo vender com uma margem maior.

Ainda assim, em todos esses casos, mudanças nos custos se refletem nos preços de venda. Essas mudanças podem demorar a ocorrer e podem aparecer só no lançamento da próxima versão do produto, mas acontecem. Pois se não houve mudança no nível de concorrência, a margem de lucros esperada pelas empresas não tem por que mudar.

Se mais tratamentos precisam ser ofertados pelos planos de saúde, mais caros eles ficarão. Se o carregador precisa ser vendido com o telefone e o custo do carregador for relevante, o preço da próxima geração do aparelho refletirá esse aumento no custo.

Além disso, se a empresa atribui uma chance de ação na Justiça que aumentará o custo futuro, ela considerará esse custo na hora de escolher o preço.

Pensando assim, pode parecer que essas leis e ações são inócuas. Não são. Elas têm efeitos importantes —positivos ou negativos.

Empresas são muito mais bem informadas que consumidores sobre os produtos que vendem. Quero que o restaurante tome as necessárias precauções com a higiene. Quando preciso da cobertura do plano de saúde, quero o atendimento que acreditei ter comprado.

Só que eu não sei se as precauções de higiene foram tomadas, nem tenho ideia sobre quais tratamentos de saúde são importantes, valem o custo, e eu gostaria de estar coberto.

A regulação tem o papel de reduzir essas assimetrias de informação. As empresas devem entregar o que as pessoas acreditam estar comprando. No caso de planos de saúde, essa é uma tarefa particularmente complicada.

Agências e tribunais devem atuar com esse propósito em mente. Intervenções restritas a esse objetivo ajudam o funcionamento dos mercados.

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