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Mario Mesquita

 

27/06/2012 - 03h00

De volta à meta

Os meses de junho são importantes na liturgia do atual regime de política monetária. Neste mês, o CVM (Conselho Monetário Nacional), isto é, o governo, estabelecerá a meta para a inflação no segundo ano à frente, ou seja, 2014.

Mediante autorização presidencial, o CMN também poderia alterar a meta para o ano que vem, originalmente estabelecida em 2011. Esse tipo de alteração não é comum, mas tampouco é inédito, e ocorreu pela última vez em 2003.

Ocorre que a meta para a inflação está congelada em 4,5%, com tolerância de dois pontos percentuais para mais ou para menos, desde 2006. Há razões estruturais e táticas para que o governo, repetindo o que fez na questão da remuneração da poupança, ataque mais esse tabu.

Em primeiro lugar, 4,5% ao ano não é coerente com o conceito de estabilidade de preços. De fato, se a inflação ficar exatamente na meta, o poder de compra da moeda cairia pela metade em 16 anos --ou em apenas 11 anos se a inflação ficar no topo do intervalo de tolerância.

Sendo assim, não surpreende que a sociedade relute em abrir mão por completo de mecanismos de indexação, o que tende a tornar a dinâmica dos preços menos sensível a flutuações da atividade e, consequentemente, a reduzir a eficácia da política monetária --se meta não protege o poder de compra dos assalariados, então estes vão à luta, buscando segurança na indexação.

Além disso, 4,5% ao ano parece exceder qualquer margem para acomodar diferenciais de crescimento de produtividade, que explicam em parte a inflação mais elevada nas economias emergentes do que nas maduras. Chile e Peru, por exemplo, economias que tendem a ter crescimento mais acelerado do que o Brasil, perseguem metas de 3% e 2%, respectivamente.

Note-se, também, que uma meta inflacionária elevada e com intervalo de tolerância amplo implica maior grau de incerteza macroeconômica e, assim, prêmios de risco maiores. Isso contribui para deprimir o investimento, que o governo, corretamente, quer acelerar.

A inflação relativamente alta e instável contribui, ademais, para o viés de curto prazo que ainda caracteriza o comportamento dos investidores locais, limitando a oferta doméstica de recursos para o financiamento de projetos de longo prazo.

Finalmente, com quase um terço da dívida pública federal indexada à inflação, uma meta menor poderia propiciar economias ao Tesouro ao longo do tempo.

Há também aspectos da conjuntura que favorecem a redução da meta. Nas atuais circunstâncias, assim como em 2009, a meta de 4,5% limita as perspectivas de redução da inflação, mesmo em um ambiente inflacionário mundial benigno.

Sendo assim, a meta elevada contribui diretamente para a persistência de taxas de inflação e, dessa maneira, para a manutenção de uma estrutura de taxas de juros nominais altas, não apenas perante as economias maduras, mas mesmo diante de outras economias da região.

As expectativas de inflação, que por muito tempo teimavam em se manter elevadas, passaram a retroceder nas últimas semanas, o que também caracteriza um contexto favorável à redução da meta.

Uma transição rápida para 3%, que pode ser vista como a melhor prática entre as economias emergentes, poderia ter um efeito importante sobre as expectativas, mas um movimento gradual pode ser mais viável politicamente.

Sendo assim, e com vistas a ajudar o Banco Central na batalha para domar as expectativas inflacionárias, o governo poderia optar por uma trajetória gradual de declínio da meta para a inflação, acompanhada por um, também gradativo, estreitamento do intervalo de tolerância --estreitar o intervalo de tolerância, sem alterar o ponto central de 4,5%, contribuiria para reduzir a incerteza macroeconômica, mas ao custo de elevar ainda mais o "piso" da inflação brasileira.

Perseguir algo como 4,25% --com tolerância de 1,75 ponto percentual para mais ou para menos-- de inflação deveria ser um objetivo razoável, a julgar pelo próprio diagnóstico oficial, para 2014 (ou 2013?), com metas sucessivamente menores até atingir 3%, lá por 2016.

O importante seria dar o primeiro passo.

Mario Mesquita

Mario Mesquita, doutor em economia pela Universidade de Oxford, ex-diretor de Política Econômica do BC e ex-diretor setorial de economia da Febraban.

 

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