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patrícia campos mello
A cartilha do Consenso de Brasília
Nem tanto à direita, nem tanto à esquerda. O receituário do consenso de Brasília mistura políticas que poderiam facilmente estar na agenda neoliberal com medidas de arrepiar os cabelos dos ortodoxos.
Na semana passada, a Folha publicou uma matéria sobre o avanço do chamado consenso de Brasília, termo cunhado por Michael Shifter, presidente do centro de pesquisas Inter-American Dialogue (longe de ser de esquerda, veja bem).
A vitória de Ollanta Humala no Peru é um sinal claro da consolidação de regimes de esquerda moderada na América Latina --governos que combinam inclusão social com nacionalismo na exploração de recursos naturais e estabilidade macroeconômica.
Mas afinal, o que têm em comum Brasil, Uruguai e El Salvador, os maiores símbolos do consenso, Argentina e Paraguai, países híbridos, e Chile e Colômbia, países de centro-direita que estão se movendo para o modelo brasileiro?
Todos apostam nos cânones da estabilidade macroeconômica --independência do Banco Central, estabilidade fiscal, câmbio flutuante.todos compartilham da preocupação com a inclusão social e adotam, em maior ou menor extensão, programas de transferência condicional de renda e de valorização do salário mínimo.
E aí entram os aspectos menos palatáveis ao pessoal do consenso de Washington.
Alguns países apostam na política de reindustrialização , com ecos da substituição de importações defendida por Raul Prebisch, que é anátema para os neoliberais. Humala manifestou que irá apostar em iniciativas nessa área e a Argentina também vai nesta direção. E até a iniciativa de exigir conteúdo local dos fornecedores para plataformas da Petrobrás no Brasil pode ser visto como parte de um programa de substituição de importação.
A ampliação do papel do Estado na economia é outro dos mandamentos do consenso de Brasília. Tudo isso ainda passa bem longe das expropriações chavistas, claro.
No Brasil, o aumento colossal da participação do BNDES em várias empresas é uma amostra disso.
No Peru, Humala defende (ou pelo menos defendia, até o primeiro turno da eleição)mudar aspectos da Constituição peruana que reservam ao Estado um papel apenas secundário na economia, não permitem que o governo assuma participações em empresas ou participe diretamente de licitações.
O nacionalismo em relação à exploração de recursos naturais é outra constante. No Peru, tanto Keiko Fujimori quanto Humala defendiam aumento de impostos na mineração. O Chile negociou com as mineradoras um aumento nos impostos. E no Brasil, o marco regulatório da mineração, que está parado no Congresso, prevê aumento das royalties na exploração.
O consenso de Brasília ainda se restringe a uma série de preceitos comuns e um desejo de emular o crescimento econômico com inclusão que o Brasil atingiu. Mas ainda não existe uma receita única, e alguns pendem mais para o bolivarianismo, como Argentina, enquanto outros ainda estão mais para o modelo de Washington, como a Colômbia.
![patrícia campos mello](http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/122231486.jpeg)
Patrícia Campos Mello é repórter especial da Folha e escreve para o site, às sextas, sobre política e economia internacional. Foi correspondente em Washington durante quatro anos, onde cobriu a eleição do presidente Barack Obama, a crise financeira e a guerra do Afeganistão, acompanhando as tropas americanas. Em Nova York, cobriu os atentados de 11 de Setembro. Formou-se em Jornalismo na Universidade de São Paulo e tem mestrado em Economia e Jornalismo pela New York University. É autora dos livros "O Mundo Tem Medo da China" (Mostarda, 2005) e "Índia - da Miséria à Potência" (Planeta, 2008).
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