Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu União Europeia

'Guerra civil' da eleição francesa afeta política aqui e pelo mundo

Embora mais fraca, aliança contra ultradireita se recuperou nos últimos dias

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O resultado da eleição legislativa da França depende das alianças que se formaram ou ainda vão se formar até o segundo turno, no domingo. Isto é, depende em boa parte da soma dos votos dos eleitores que não querem o partido Reunião Nacional (RN) no poder: do "voto útil".

A frente contra a ultradireita se recuperou nos últimos dias, apesar de bem mais fraca do que em eleições realizadas de 2002 a 2022. Em tese, voltam a diminuir as chances de que o RN, de Marine Le Pen, consiga maioria absoluta na Assembleia, ainda que seja o partido maior.

Pelas últimas projeções, a soma dos eleitos pela esquerda e pelo centro macronista poderia até ser majoritária. Há quem sugira, assim, uma aliança precária, mas bastante para aprovar um ou outro projeto e evitar crise maior, pelo menos até a convocação de outra eleição, possível apenas daqui a um ano.

A líder da ultradireita da França, Marine Le Pen, chega à sede do partido, em Paris
A líder da ultradireita da França, Marine Le Pen, chega à sede do partido, em Paris - Dimitar Dilkoff - 2.jul.2024/AFP

Jamais houve coalizão de ideologia mista na Quinta República (desde 1958). O presidente Emmanuel Macron detesta o França Insubmissa (LFI), partido maior da aliança de esquerda. O LFI tem dito que apenas entrará em governo de coalizão que siga o seu programa. Hum.

Por que prestar atenção à política francesa? Apesar dos pesares crescentes da França, a aliança franco-alemã é o pilar da enorme União Europeia. Um tumulto político-econômico por lá teria repercussão mundial, até financeira, aqui inclusive.

De resto, não é de hoje que a política de países relevantes, ainda mais os ocidentais, serve de estudo de caso ou inspiração para elites, as nossas inclusive. Vide o caso de Trump, Brexit e até da pequena Hungria sob Viktor Orbán.

Pense-se nas ideias suscitadas pelo desmoronamento de partidos centristas. Nos planos da esquerda intelectual e política francesa para gastos sociais e tributação de ricos, que inspiram Lula 3 e PT.

Além do mais, a conjuntura tem combustível para queimadas. França e países maiores da Europa crescem muito pouco. O déficit francês apenas é menor que o da Itália. A aversão contra imigrantes ferve. Etc.
Fim de parênteses.

Apesar dos buracos no muro da "frente republicana" contra o RN, formou-se coalizão considerável. Candidatos de esquerda e de centro desistiram de concorrer no segundo turno a fim de favorecer seus adversários com mais chances de vencer os nomes do RN.

Apenas no domingo vai se saber se a maioria do eleitorado também votou "útil". A recomendação de voto tem sido mais ignorada. Pode ser que eleitores se abstenham no segundo turno se o candidato deles desistiu.

Os líderes do que restou da direita tradicional não recomendaram desistência e menos ainda "voto útil" na esquerda, coalizão do Partido Socialista, dos Ecologistas, do suave Partido Comunista e do radical França Insubmissa (LFI). Isto quando não se bandearam para o RN.

Macron, de centro, recomendou voto contra o RN, mas praticamente vetou o LFI, que, disse, seria capaz de levar a França à "guerra civil" (assim como o RN). Os partidos centristas aliados de Macron foram mais explícitos no veto. Na coalizão de esquerda, Nova Frente Popular (NFP), foi maciça a adesão ao "voto útil".

Elege-se um deputado em cada um dos 577 distritos eleitorais. Vão para o segundo turno aqueles que tiveram menos de 50% dos votos e mais de 12,5%.

No domingo, foram eleitos 76 deputados. Em 190 distritos, haveria disputa entre dois candidatos no segundo turno. Em 306, haveria três qualificados. Em 5, quatro candidatos. Mas as 306 disputas "triangulares" foram reduzidas a 89, dadas as desistências em nome do "voto útil".

Os candidatos do RN chegaram em primeiro lugar em 297 distritos, ante 159 da NFP (esquerda) e 70 da coalizão de Macron.

A eleição francesa ainda vai dar pano para a manga política, econômica e ideológica.

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