Quando eclodiu a Segunda Guerra Mundial, Miriam Brik Nekrycz viu seu mundo ser colocado em uma carroça. Nas ruas por onde a família passava, deixando a cidade de Lutsk, na Ucrânia, ela ouvia: "Oh, judeus! Não adianta fugir! Os alemães vão matar vocês todos!".
Aos sete anos, aqueles dias de 1939 marcavam o começo dos anos mais difíceis de sua vida. Mais velha de quatro filhos, ela teve de virar adulta antes do tempo.
A infância, quando deveria estar brincando, Miriam passou fugindo por aldeias, florestas, aprendendo a ser católica para sobreviver. Viu o pai ser levado para nunca mais voltar. Viu a mãe, os irmãos gêmeos e os tios serem assassinados em um bunker. Viu o irmão do meio ser entregue aos alemães.
Acabou sozinha no mundo, uma das últimas judias de Lutsk para contar a história.
Antes de migrar para o Brasil, onde morava uma tia, Miriam foi para Israel. No caminho, o navio em que ela estava foi capturado por ingleses, e ela acabou como refugiada no Chipre. O Brasil foi sua última tentativa de vida nova.
Em São Paulo, virou professora em escolas judaicas. No trem que pegava todos os dias para ir trabalhar, conheceu o marido, o jornalista Ben Abraham, que esteve em Auschwitz. Juntos, os dois passaram a contar em palestras dentro e fora do Brasil sobre os horrores aos quais sobreviveram.
No último dia 18 de novembro, aos 86 anos, Miriam morreu por falência de múltiplos órgãos. Três anos antes, ela havia perdido Ben e o filho Jacques. Deixou a filha Edith, genro, nora, netos e bisnetos.
"Ela deixa uma enorme lição de vida, coragem, amor e determinação. Era uma guerreira", afirma a filha.
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