A Constituição estabelece que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado. As políticas públicas nessa área devem ser universais e preparadas para garantir o acesso igualitário às ações e aos serviços de saúde, que devem ser organizados em um sistema único, hierarquizado e descentralizado, capaz de oferecer um atendimento integral, envolvendo medidas de prevenção, acesso a medicamentos e procedimentos de alta complexidade, tudo de forma a compreender a saúde como uma questão de cidadania.
O Judiciário tem sido chamado a garantir esse direito constitucional por diferentes demandas, seja para ampliar leitos hospitalares, garantir o financiamento para as políticas de saúde ou promover o acesso a medicamentos.
Esse último ponto em especial tem gerado intensos debates sobre os limites que os juízes deveriam ter frente a ações judiciais que pedem medicamentos. Todo e qualquer medicamento poderia ser concedido pela via judicial? Qual instância federativa deveria assumir esse compromisso, sabendo do impacto orçamentário que possui?
O Supremo Tribunal Federal procurou uniformizar a questão ao julgar duas ações com repercussão geral e que, portanto, deverão ser observadas por todas as demais instâncias da Justiça e pela administração pública.
A primeira ação se referiu a quais medicamentos podem ser concedidos judicialmente. Medicamentos sem registro na Anvisa, em regra, não devem ser concedidos, a não ser na hipótese de doenças raras ou se a Anvisa estiver em “mora irrazoável”, ou seja, em atraso na análise dos pedidos de registro. Em nenhuma circunstância, entretanto, os juízes poderão conceder medicamentos experimentais.
Já a segunda ação procurou definir as obrigações dos entes federativos nas demandas que pedem medicamentos, prevalecendo a posição de que municípios, estados e a união são solidariamente responsáveis.
Ainda não é possível perceber o impacto que tais ações terão na chamada judicialização da saúde, já que este tema exige a consideração de uma série de outras questões relativas à capacidade orçamentária do Estado, à eficiência das políticas públicas de incorporação de novos medicamentos, à pressão que indústria farmacêutica faz e aos preços muitas vezes abusivos de novas tecnologias.
Por isso, talvez mais importante do que o que foi decidido seja o que o Supremo deixou de julgar: foi retirada de pauta uma ação que tramita há 10 anos no tribunal e que questiona a concessão indevida de patentes a medicamentos que fizeram o poder público gastar a mais bilhões de reais, sobrecarregando um sistema de saúde que sempre teve seu orçamento subdimensionado.
O Supremo tem o papel fundamental de preservar o direito constitucional à saúde e tem todos os elementos para isso.
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