Descrição de chapéu Rio de Janeiro

Câmara Municipal do Rio cassa o mandato de Dr. Jairinho, acusado de matar o enteado

Decisão unânime se deu por quebra de decoro parlamentar; vereador está preso desde abril pela morte de Henry Borel

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Rio de Janeiro

A Câmara Municipal do Rio de Janeiro cassou na noite desta quarta-feira (30), por quebra de decoro parlamentar, o mandato do vereador Jairo Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho (sem partido). Preso desde o dia 8 de abril, ele é acusado de ter matado o enteado Henry Borel, 4, em março.

A cassação do parlamentar foi aprovada por unanimidade, com voto favorável de 49 dos 50 vereadores. O parlamentar Doutor Gilberto (PTC) está licenciado por motivos médicos e não participou da sessão. Essa foi a primeira vez em que um mandato foi cassado pela Câmara do Rio.

Vereador desde 2005, quando tinha 27 anos, Dr. Jairinho está em seu quinto mandato, após ter sido reeleito no ano passado com 16 mil votos.​

Jairo e a professora Monique Medeiros, sua namorada e mãe de Henry, são réus no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro por homicídio triplamente qualificado, tortura, fraude processual e coação no curso do processo.

O Ministério Público do Rio de Janeiro também apresentou outras duas denúncias contra o vereador por tortura contra filhos de ex-namoradas, sendo um menino de 2 anos e uma menina de 4 anos.

O relatório do vereador Luiz Ramos Filho (PMN), favorável à cassação do mandato de Dr. Jairinho, havia sido apresentado no dia 18 de junho.

O documento tem como base o inquérito policial sobre a morte de Henry e o depoimento do executivo da rede D’or, Pablo Menezes, que teria recebido pedidos de Jairinho para que o corpo da criança fosse liberado sem ser encaminhado para autópsia no IML (Instituto Médico Legal).

"A ligação do Dr. Jairinho para o executivo do hospital para evitar que o corpo do menino Henry fosse periciado pelo IML caracteriza quebra de decoro a ser punido com a perda do mandato”, apontou Ramos Filho.

Na sessão desta quarta-feira (30), o advogado de Dr. Jairinho, Berilo Martins, argumentou que não seria possível falar em quebra de decoro sem que houvesse uma sentença transitada em julgada contra o seu cliente.

"Não existem provas inequívocas dos fatos imputados a indicar os elementos de autoria e materialidade do delito. Algum de vocês viram algum vídeo do Jairinho torturando, dando uma banda contra o menino Henry? O que se tem notícia são os fatos narrados de uma forma unilateral, sensacionalista", disse.

Ao fim da votação, o vereador Tarcísio Motta (PSOL) leu uma mensagem que afirmou ter recebido do pai de Henry, Leniel Borel: "Estamos vendo a Justiça sendo feita. A quebra do decoro parlamentar e a respectiva cassação desse monstro é uma resposta à sociedade devido ao covarde assassinato do meu filhinho".

HISTÓRICO

Nascido e crescido em Bangu, zona oeste, seu reduto eleitoral, Dr. Jairinho formou-se em medicina. No entanto, acabou tornando-se herdeiro político do pai, o ex-deputado estadual e policial Coronel Jairo (Solidariedade), preso em novembro de 2018 na operação Furna da Onça, desdobramento da Lava Jato no Rio.

Na Câmara Municipal do Rio, o vereador foi 1º Secretário e líder do governo em mandatos anteriores do prefeito Eduardo Paes (PSD) e na última gestão do ex-prefeito Marcelo Crivella (Republicanos). Na disputa pela prefeitura no ano passado, trocou de lado e trabalhou pela eleição de Paes.

Com bom trânsito e em ascensão na política fluminense, Dr. Jairinho chegou a ser cotado para uma vaga no TCM (Tribunal de Contas do Município).

O vereador foi citado cinco vezes como líder de milícia em um estudo feito com moradores de áreas dominadas por esses grupos criminosos na zona oeste do Rio de Janeiro. Seu pai foi mencionado 13 vezes.

Coronel Jairo foi citado ainda no relatório da CPI das Milícias realizada na Assembleia do Rio, em 2008, mas não foi indiciado porque não havia provas. A Polícia Civil também investigou se o então deputado havia tido envolvimento com a tortura de uma equipe de reportagem do jornal "O Dia" na favela do Batan, na zona oeste.

Em texto publicado na revista "piauí" em 2011, o fotógrafo Nilton Claudino, torturado por sete horas, afirma que um vereador, filho de um deputado estadual, esteve presente na sessão de tortura.

O suplente de Dr. Jairinho é Marcelo Diniz (SD), presidente da Associação de Moradores da Muzema, comunidade na zona oeste do Rio controlada por uma milícia.

Em abril de 2019, dois prédios desabaram na comunidade, matando mais de 20 pessoas. Investigações do Ministério Público apontaram que a milícia constrói e vende imóveis irregulares na região.

Diniz foi chamado a depor na Polícia Civil para prestar esclarecimentos sobre a atuação da associação da Muzema. Havia suspeitas de que a instituição estivesse sendo utilizada como uma imobiliária clandestina para negociar os imóveis dos grupos paramilitares.

Durante a campanha eleitoral do ano passado, ele foi intimado novamente a depor pela Polícia Civil, por suspeita de ligação com a milícia, segundo noticiou o jornal Extra.

A corporação investigava de que forma grupos criminosos estavam influenciando o pleito —em determinadas regiões, apenas candidatos apoiados pelo tráfico ou pela milícia podem fazer atos de campanha.

RELEMBRE O CASO

Henry passou o fim de semana anterior à sua morte com o pai, o engenheiro Leniel Borel, que o deixou no condomínio da mãe e do namorado na noite de 7 de março, um domingo, sem lesões aparentes. Na mesma madrugada, Monique e Dr. Jairinho levaram o garoto às pressas para o hospital, onde ele já chegou morto.

Um exame de necropsia concluiu que as causas do óbito foram “hemorragia interna" e "laceração hepática" (lesão no fígado), produzidas por uma "ação contundente" (violenta). Ele tinha no total 23 lesões e hematomas pelo corpo.

Em depoimento, a mãe afirmou que estava assistindo a uma série com o namorado em outro quarto e despertou de madrugada com a TV ligada. Acordou o namorado, que havia tomado remédios para dormir, e foi até o quarto onde Henry estava dormindo. Chegando lá, teria visto o menino caído no chão, com os olhos revirados, as mãos e pés gelados e sem respirar.

A polícia ouviu dezenas de pessoas durante as investigações, entre elas a faxineira que limpou o apartamento no dia da morte (antes da perícia), uma ex-namorada do vereador que o acusou de agressões contra ela e sua filha, na época criança, a psicóloga do menino e as pediatras que o atenderam. Diversos celulares também foram apreendidos e periciados.

Após o conhecimento de mensagens trocadas entre a babá e Monique, que mostram que testemunhas mentiram nos depoimentos, os policiais prenderam o casal temporariamente.

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