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Com sombra e água quente, moradores de rua se refrescam como dá em São Paulo

Estocar líquidos em diversas garrafas ajuda a não faltar durante a noite e na madrugada, quando comércios e parques estão fechados

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São Paulo

Seis garrafas de água, quase todas elas quentes. Foi assim que o artesão Claudinei Solano, 39, tentou se refrescar do calor de mais de 30°C nesta terça-feira (19) em São Paulo. A temperatura do líquido não foi uma escolha, mas uma necessidade de matar a sede como podia, bebendo água em um parque municipal na avenida Paulista ou pedindo em comércios da região.

"Você imagina, eu viver de artesanato e pagar R$ 4 em uma água gelada, que até pagando, às vezes, não vem gelada", diz para a reportagem.

Solano relata que, além do refresco com a água, ele busca se refugiar do sol na sombra de uma árvore entre um trabalho ou outro. Na terça, a demanda estava fraca, o que pouco contribuiu, servindo para a compra de apenas 1 das 6 garrafinhas de água que ele havia consumido até as 20h, além de comida.

O artesão Claudinei Solano, 39, toma a sexta garrafinha de água no dia para se refrescar; ele, no entanto, diz que boa parte delas estava quente
O artesão Claudinei Solano, 39, toma a sexta garrafinha de água no dia para se refrescar; ele, no entanto, diz que boa parte delas estava quente - Marlene Bergamo/Folhapress

Tomar banho é outra tarefa difícil, para a qual depende de uma igreja na região dos Jardins, na zona oeste.

O sol bate forte entre a avenida Paulo VI e a rua Henrique Schaumann, quando a carroceira Ana Paula de Castro, 42, ergue um galão de cinco litros de água até a boca. O líquido foi obtido momentos antes em um lava-rápido, um dos locais que aceitam contribuir com os sem-teto que vivem na região. Vez ou outra, vizinhos também aparecem com garrafões.

A revolta de Castro, que estava acompanhada do marido, um homem de 30 anos, é a passagem do serviço de limpeza da prefeitura todos os dias, o que os obriga a desmontar a barraca às 5h e montá-la novamente às 19h, deixando-os sem um local para se esconder do sol em meio as árvores do canteiro central.

O banho também não é uma tarefa fácil. Enquanto a mulher afirma se banhar à noite dentro da barraca, quando o movimento na rua é menor, o companheiro, que prefere não ser identificado, diz procurar por um abrigo nas proximidades. Os dois ainda podem pagar R$ 15 por mês para tomar banho em uma cooperativa de recicladores nas proximidades em que vivem.

É possível notar que os moradores de rua possuem diversos recipientes para estocar água dentro ou fora de barracas. A explicação é simples: armazenar para não faltar à noite ou na madrugada, quando comércios e parques públicos estão fechados.

Castro e o marido deixam sob troncos de árvore a água obtida, para manter o líquido o mais fresco possível.

Ana Paula Castro, 42, se refresca com água obtida em um lava-rápido na região do Sumaré, na zona oeste de São Paulo
Ana Paula Castro, 42, se refresca com água obtida em um lava-rápido na região do Sumaré, na zona oeste de São Paulo - Marlene Bergamo/Folhapress

A tática também é utilizada por um homem de 41 anos que mora nas proximidades do parque Ibirapuera, em Moema, na zona sul. Ele, que preferiu não se identificar, diz que viver nas ruas é um teste de sobrevivência. Algo semelhante, conforme ele, ao programa À Prova de Tudo, apresentado pelo aventureiro britânico Bear Grylls. Uma bica que ficava nas proximidades da rua Sena Madureira foi tapada, o que o faz buscar água por diversas vezes ao dia no parque.

Por ter a pele sensível ao sol, ele relata que se protege dos raios solares com um guarda-chuva.

Há também pessoas que vivem nas ruas e que conseguem suportar a onda de calor com mais facilidade.

O carroceiro Osvaldo da Silva, 53, conta que não enfrenta perrengues para obter água. Vivendo em uma barraca colada ao parque Tenente Siqueira Campos - Trianon, na avenida Paulista, ele diz que um bar fornece água sempre que ele precisa. Ele também mantém sua reserva em recipientes.

"Ando com garrafa no carrinho. Acabou, eu peço em um bar."

O escultor Geraldo Viana, 63, diz que não bebe água diversas vezes ao dia. Mas o calor dentro da barraca o faz ficar mais tempo fora dela, na entrada e usando um colete aberto para tomar ar no peito e nos braços.

"Você não aguenta ficar na barraca. Estou aprendendo a tomar água, sou um cara que toma pouca água. Sou um cara acostumado a fazer jejum. Eu não sinto sede. No calor eu fico à vontade, minha energia aumenta", completa Viana.

Na manhã desta terça (19), a Prefeitura de São Paulo anunciou que vai fornecer água para moradores de rua durante a onda de calor que atinge a cidade. A distribuição será realizada a partir desta quarta (20) em dez tendas espalhadas pela capital.

Conforme o comunicado, os centros de acolhimento criados para Operação Altas Temperaturas terão ambulâncias disponíveis para atendimento. À noite, a gestão Ricardo Nunes soltou um novo texto que declarou que a ação só vai ser acionada quando a capital atingir 32° C. As tendas vão funcionar entre 10h e 16h.

Onde ficam as tendas da prefeitura

  • Praça da República e praça Marechal Deodoro, centro
  • Praça Floriano Peixoto, 54, em Santo Amaro e praça José Boemer Roschel, em Capela do Socorro, ambas na zona sul
  • Av.Cruzeiro do Sul, 3.180, em Santana e praça Novo Mundo, na Vila Maria, zona norte
  • Praça Presidente Getúlio Vargas, em Guaianases; avenida Musgo de Flor com a avenida Imperador, nos baixos do viaduto Jacu Pêssego, em Itaquera, e praça Cid José da Silva Campanella, na Mooca, todas elas na zona leste
  • R. do Curtume, na altura da rua Guaicurus, na Lapa, zona oeste
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