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Retorno obrigatório das aulas presenciais em SP reforça disparidades entre redes pública e privada

Instituições particulares exploram áreas externas, enquanto estaduais mantêm formato tradicional, dentro das salas

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São Paulo

A volta obrigatória às aulas presenciais em São Paulo nesta segunda (18) expôs mais uma face da disparidade do ensino no estado.

Para as particulares, o retorno trouxe a oportunidade de estimular uma nova forma de ensino, com atividades em áreas externas e liberdade para os alunos aprenderem fora da sala. Nas públicas, porém, as aulas continuam no mesmo modelo, com os estudantes enfileirados nas carteiras.

Sala de aula na escola estadual Eliza Rachel Macedo de Souza, na zona leste da capital
Sala de aula na escola estadual Eliza Rachel Macedo de Souza, na zona leste da capital - Zanone Fraissat/Folhapress

Na semana passada, o governador João Doria (PSDB) determinou que a frequência às aulas presenciais volte a ser obrigatória em todas as escolas estaduais e particulares do estado. O rodízio de alunos, que em geral permanecia apenas nas públicas, como medida de combate à Covid, será suspenso a partir de 3 de novembro, quando também deixa de existir a regra de distanciamento de um metro nas unidades de ensino.

A maioria das escolas particulares da capital desde agosto já recebe quase a totalidade dos alunos. Por isso, as novas diretrizes estaduais não implicaram grandes mudanças. Há mais de dois meses adaptados às atividades presenciais para grande parte dos estudantes, os colégios dizem ter encontrado um novo formato de ensino ao qual todos já se familiarizaram.

Por outro lado, as escolas públicas receberam menos alunos do que o esperado. Mesmo com a nova determinação, em certas unidades, houve salas de aula ainda vazias nesta segunda.

A estratégia de privilegiar atividades em áreas abertas é apontada por especialistas como uma das principais formas de evitar o contágio do coronavírus. A mudança, no entanto, é um desafio para unidades em que há limitação de espaço.

Segundo dados da própria secretaria estadual de Educação, apenas 24% das escolas estaduais conseguem atender os alunos simultaneamente com a regra de distanciamento de um metro.

Não há nenhum dado específico sobre a metragem de áreas externas nas unidades escolares do país, mas, segundo o Censo Escolar 2020, 35% das unidades estaduais de São Paulo nem sequer têm quadra esportiva.

No colégio particular Humboldt, em Interlagos, zona sul da capital paulista, mais de 90% dos 1.200 alunos retornaram em agosto para as atividades presenciais. Poucas foram as mudanças estruturais necessárias, uma vez que a unidade tem 60.000 m² e todas as salas já tinham boa ventilação.

As alterações apenas incentivaram um novo uso dos espaços abertos. A escola espalhou mesas e cadeiras em um pátio externo para que as crianças pudessem ter aulas ali.

Sala com pé-direito alto e mesas de madeira clara bem espaçadas. Duas crianças sentam em cada mesa, usando máscara
Sala do colégio Humboldt, em São Paulo, adaptada para a volta às aulas com medidas anti-Covid - Karime Xavier / Folhapress

“Era um espaço que elas usavam só para brincar, correr. Decidimos mobiliar para que houvesse a oportunidade de um novo uso”, diz Fábio Martinez, diretor da unidade. Na manhã chuvosa de segunda, quando a Folha visitou o colégio, os alunos também se apropriavam de outros espaços, como os corredores.

O colégio transformou ainda locais mais amplos em sala de aula, para evitar que os alunos fiquem muito próximos. Uma sala de dança, por exemplo, recebeu mesas e cadeiras.

“Temos uma escola com muito mais movimento agora. Os alunos podem ter qualquer aula fora da sala e, com isso, se sentem mais livres. É uma novidade boa, porque eles estão se apropriando mais da escola”, conta Tânia Lindemann, coordenadora pedagógica.

No também particular Santa Cruz, no Alto de Pinheiros, na zona oeste da cidade, as salas de educação infantil foram reformadas para que todas tivessem sacadas com ligação direta ao pátio. A mudança garantiu maior ventilação e também acesso facilitado para atividades em área externa.

Já no colégio Pueri Domus, também da rede privada, em Santo Amaro, zona sul, as carteiras foram separadas por placas de acrílico. A direção, no entanto, estimula que sejam feitas atividades em áreas abertas, como pátio, parquinho e quadras.

No Santa Maria, também na zona sul, as salas de aula da educação infantil são considerados espaços apenas de referência aos alunos, onde encontram os professores e deixam seus materiais. Mais de 90% do tempo é passado em áreas externas, segundo a direção.

Diferentemente do observado nas escolas particulares, nas unidades da rede estadual paulista os alunos assistem às aulas prioritariamente dentro das salas. Na EE Eliza Rachel Macedo de Souza, na Vila Odete, e na EE Lívio Xavier, no Itaim Paulista, ambas na zona leste da capital paulista, por exemplo, o modelo presencial de ensino não mudou.

O professor segue à frente da sala, com a caneta ou o giz na mão, e os alunos continuam sentados em carteiras individuais ou em pequenas mesas de duas a quatro pessoas.

Letícia Rocha, 16, voltou para a escola no início do ano, quando o governo liberou o ensino presencial pela primeira vez. Naquela época, mesmo com a possibilidade de manter o ensino remoto, ela preferiu assistir às aulas na EE Eliza Rachel, pois sentiu que 2020 foi um ano perdido.

“Eu não aprendo quase nada com as aulas online”, resume.

Embora a expectativa do governo fosse que as escolas recebessem mais alunos nesta segunda-feira, Letícia conta que nenhum rosto novo na sua sala voltou, mesmo diante do retorno obrigatório.

Isadora Oliveira, 14, observou algo semelhante na EE Lívio Xavier. Vieram mais pessoas do que ela imaginava mas, ainda assim, poucas. Sua principal expectativa com o retorno total é recuperar o tempo perdido.

“Ainda estou muito perdida nas matérias. A gente não entende muito porque [o professor] faz a aula online, mas, por exemplo, não tem como a gente perguntar e ele dar um exemplo que a gente entenda melhor”, diz.

Em nenhuma das duas unidades públicas visitadas a Folha encontrou alunos que tivessem voltado para a escola nesta segunda. Alguns funcionários atribuíram ao dia chuvoso. Já o subsecretário de articulação regional da secretaria de Educação, Patrick Tranjan, tem a expectativa que os alunos voltem dia 3 de novembro, quando será finalizado o rodízio.

“Nessas duas semanas a secretaria vai começar um trabalho de contato com as famílias. Até porque as crianças tomam falta se não vierem para as escolas. Agora as aulas são obrigatórias. A secretaria vai fazer um trabalho com as famílias para garantir que no dia 3 a gente tenha todo mundo de volta”, diz.

Como será o retorno obrigatório das aulas presenciais em SP

18 de outubro
A partir desta data, a presença em sala de aula é considerada obrigatória a todos os estudantes. No entanto, não significa que todos deverão voltar à escola no mesmo dia, já que as unidades ainda poderão continuar com esquema de rodízio.

3 de novembro
Deste dia em diante, o governo do estado deixa de exigir que as escolas garantam o distanciamento de um metro entre os estudantes. Assim, o rodízio de estudantes também estará suspenso.

Exceções à obrigatoriedade
Estudantes que fazem parte do grupo de risco, sem o quadro vacinal completo e com atestado médico podem continuar no ensino remoto.

​Segundo a secretaria de Educação, estão neste grupo: alunos com mais de 12 anos com comorbidades e que ainda não receberam as duas doses da vacina; menores de 12 anos de grupos de risco; grávidas e puérperas; e alunos com comprovada prescrição médica para permanecer em casa.

Redes
A determinação vale para escolas estaduais, particulares e municipais de cidades que não possuem conselho de educação próprio. Em municípios com conselho próprio, como é o caso da capital paulista, há autonomia para definir se irão seguir ou não a regra estadual.

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