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17/12/2003 - 21h30

Análise: As raízes do secularismo francês

HENRI ASTIER
da BBC, em Londres

A França não é um único país ocidental a insistir na separação entre Igreja e Estado --mas é o que o faz de forma mais militante.

O secularismo é o que existe de mais semelhante a uma religião estatal entre os franceses. Foi a base da Revolução Francesa e tem sido o princípio do pensamento progressista do país desde o século 18.

Qualquer coisa que se aproxime de reconhecimento oficial de uma religião --como a permissão de uso de véus em escolas-- é um "pecado" para muitos franceses.

Mesmo os que se opõem à proibição do uso de véus, o fazem em nome de uma forma mais moderna e flexível de secularismo.

Esta tradição pode ser vista como um subproduto do catolicismo francês --progressistas sempre viram o púlpito como o inimigo, o que não acontece em alguns países protestantes.

Pensadores iluministas franceses como Voltaire, Diderot e Montesquieu afirmavam que a religião era algo intolerante e que trazia a discórdia.

Revolução

Durante a Revolução Francesa, bens da Igreja foram confiscados e padres foram obrigados a jurar lealdade à República.

Durante a Revolução e depois, no período Imperial, o Vaticano resistiu à ordem republicana que Paris tentava impor por toda a Europa.

Os franceses responderam invadindo Roma em 1798 e 1809.

Napoleão Bonaparte decretou uma trégua trazendo a igreja para o abrigo do Estado, mas não interferia em questões espirituais.

O arranjo durou até 1905, quando a Terceira República declarou a separação da Igreja e do Estado.

Com isso, o governo francês não poderia permitir nenhum tipo de proselitismo em prédios públicos. As escolas se transformariam então em uma área sem religião.

A insistência na proteção das escolas vai de encontro ao fato de que a República reconhecia indivíduos, e não grupos: um cidadão francês é leal à nação e não tem uma identidade étnica ou religiosa oficialmente reconhecida.

Em 1937, o então ministro da Educação instruiu diretores de escola a retirar todos os símbolos religiosos dos prédios, o que não causou polêmica em uma sociedade majoritariamente secular.

Desafio

Nas décadas de 60 e 70 ocorreu a imigração em massa das ex-colônias do norte da África.

Isto não levou ao questionamento imediato do secularismo e muitos desses primeiros imigrantes se chocam ao ver seus filhos adotarem práticas islâmicas conservadoras, e estão na vanguarda dos movimentos de proibição dos véus nas escolas.

Mas a segunda ou terceira geração de imigrantes não encara os fatos da mesma forma.

Esses viveram apenas na França, a maioria em áreas mais pobres. Para muitos a militância e os véus são formas de expressar a raiva e afirmar sua identidade.

Isso gerou uma divisão no país. Os tradicionalistas afirmam que a República deve se ater aos seus princípios seculares.

Segundo estes tradicionalistas, véus não podem ser tolerados em escolas porque são instrumentos de propaganda de uma versão intolerante do Islã e símbolo de opressão das mulheres.

Os modernisadores afirmam que a proibição vai fortalecer os militantes e afirmam que os princípios do secularismo podem acomodar exceções.

O status legal do uso do véu nas escolas ainda não está claro e continua sendo motivo de discussões entre tradicionalistas e modernisadores.

A mais alta corte da França decidiu, em 1989, que a proibição de símbolos religiosos nas escolas era ilegal. Mas, argumentou que um aluno poderia ser expulso por usar um sinal que indicasse tentativa de conversão.

Em 1994, o ministro da Educação afirmou que sinais "ostensivos" poderiam ser proibidos, deixando para os diretores de escola a interpretação da declaração.
 

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