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03/11/2004
-
10h58
FERNANDO DE BARROS E SILVA
Editor de Brasil da Folha de S.Paulo
O senador Eduardo Suplicy é um dos maiores responsáveis pela criação e divulgação do preconceito de que seria vítima a prefeita Marta Suplicy. Preconceito que é apontado dentro e fora do PT como uma das causas --se não a maior delas-- da derrota para o tucano José Serra no domingo.
Quem fala é um dos homens fortes da prefeitura petista e da campanha de Marta, o atual secretário de Abastecimento e Projetos Especiais, Valdemir Garreta.
Pouco conhecido fora do PT, Garreta, 39, é provavelmente, depois do marido, Luis Favre, e do candidato a vice, Rui Falcão, a pessoa mais próxima da prefeita no que se refere à política. Viveu a campanha muito por dentro. Dificilmente há alguém mais informado sobre o que se passou e passa na cozinha do PT municipal.
A entrevista que segue foi realizada ontem, na sede do comitê central de campanha. Um prédio vazio e carregado de tristeza na Vila Mariana. No que revela, Garreta acerta algumas contas. Além de alegar que Suplicy sempre se vitimizou, alimentando a fama da mulher má, diz que o PT nacional atrasou a parte que lhe cabia no pagamento da produtora de Duda Mendonça, que parou por cinco dias no segundo turno.
Fala ainda que pôs o "pé na porta" quando o PT nacional quis incluir Maluf na propaganda de TV e critica "a soberba" de alguns petistas assim que chegaram lá.
Folha - Como a campanha foi pensada e onde ela falhou?
Valdemir Garreta - Sabíamos que seria uma campanha muito difícil. O Datafolha em junho dava 62% para o Serra e 29% para a Marta na projeção de segundo turno. Isso, em votos válidos, queria dizer 68% a 31%. Começamos portanto 37 pontos atrás. E tínhamos noção dos problemas do governo: a forma de implementação das taxas e a questão da saúde. Essas coisas foram galvanizadas pelo preconceito contra a Marta. Um preconceito que foi construído ao longo de três anos e meio.
Folha - Quais são as motivações deste preconceito?
Garreta - Foi determinante a atitude do senador Eduardo Suplicy logo após a separação. Ele se colocou o tempo todo na mídia como vítima, transformando a Marta numa pessoa insensível, arrogante, indiferente ao que ele sentia.
Folha - O sr. pode exemplificar?
Garreta - Em vários momentos ele constrangeu a Marta. Pessoas civilizadas deveriam evitar isso. Ele preferiu aparecer em público, expor o problema. Fez isso em dois ou três momentos da campanha com muita clareza.
Folha - Por exemplo?
Garreta - Uma semana antes do segundo turno, a namorada dele [Mônica Dallari] deu uma entrevista à revista "Veja", da qual ele obviamente tinha ciência. Essa entrevista amplificava todos os preconceitos contra a Marta. E tem quem diga que foi oferecida primeiro a ele, que teria sugerido a Mônica no lugar. Não sei. São bastidores da imprensa.
Folha - Foi deliberado?
Garreta - O Suplicy tem como estratégia sempre se vitimizar. Ele não é uma pessoa ingênua. Tem quase 30 anos de mandatos consecutivos. Não se pode dizer que seja alguém despreparado para a política. Durante a campanha, ele ficou o tempo todo pedindo na produtora para gravar, aparecer. Confirma com o Duda [Mendonça, marqueteiro de Marta].
Quando as dificuldades ficaram mais claras, ele passou a dizer que não concordava com as críticas à ação do Serra, feitas pelo Mercadante [Aloizio Mercadante, líder do governo no Senado]. Ao fazer isso, ao pedir um tom mais propositivo, ele já estava pensando no seu futuro. Ele sabe que uma parcela da classe média que não votou na Marta é eleitora em 2006 para o Senado. Então, ele já está se diferenciando do PT, de olho no voto tucano. É a postura de algumas pessoas do partido: são do PT na hora boa. Na hora má, sempre têm uma crítica pública a fazer.
Folha - Isso é oportunismo?
Garreta - É uma ação calculada. O Eduardo pensa muito nele. Na última semana de campanha, ele ia a quase todos os comícios para repercutir na imprensa a polêmica da "Veja". Não parava de falar. Não acho que estivesse pensando na campanha nem na Marta. Ele reforça a idéia do preconceito. Transforma a Marta numa pessoa má e alimenta a resistência contra o PT. Isso vem de longe.
Folha - Pode fazer um histórico?
Garreta - Durante a campanha da Marta à prefeitura em 2000, quando eles ainda eram casados, ele chegou a marcar uma data para o lançamento da candidatura dele à Presidência. Eu e o Rui [Falcão, candidato a vice na chapa de Marta neste ano] tivemos que ter horas de conversa para demovê-lo. Mostramos a inoportunidade daquilo. No meio do primeiro turno, ele queria disputar com o Lula. Era inconcebível.
Imagina o impacto político disso no PT. Isso corrobora o que eu digo: ele via a eleição da Marta como um instrumento da candidatura presidencial dele. Mas a Marta é muito independente, muito autônoma. Ninguém manda nela. Ele queria um instrumento que na prática não teve. Desde então, o tempo inteiro ele tentou se vitimizar, sem medir as conseqüências para a imagem da Marta.
Folha - A prefeita ficou magoada ou abalada por isso?
Garreta - Não conversei com ela sobre isso. Falo por mim.
Folha - Mas o que o sr. diz é também o que outros pensam no partido. Quais as conseqüências que isso pode ter internamente?
Garreta - O PT é um partido democrático. Do mesmo jeito que o Lula passou por prévias, o Eduardo pode ter que passar. Agora, ele é o nome natural ao Senado, uma liderança expressiva e histórica do PT. Acho apenas que nós precisamos parar de achar que existem pessoas boas e pessoas más. As pessoas são complexas.
Folha - Ele apareceu pouco na propaganda de TV de vocês.
Garreta - Nas pesquisas qualitativas, quando a gente testava os comerciais com ele, as pessoas diziam: "Não usa isso não, vai relembrar a separação". Mas ele ficava lá, pedindo sempre para gravar.
Folha - Além do Suplicy, o que mais pesou na derrota?
Garreta - São Paulo é uma cidade historicamente conservadora e oposicionista. Vota em lideranças conservadoras. Basta citar o Maluf. Além disso, à exceção da eleição do Pitta, a cidade sempre votou na oposição. Mas, mesmo perdendo, a Marta e o PT saem do governo bem consolidados na periferia. Só não saem mais por causa do problema na saúde.
Folha - O sr. reconhece um equívoco do governo na área da saúde?
Garreta - Claro. Um ano depois que a Marta assumiu nós tínhamos o diagnóstico da incapacidade do Eduardo Jorge [ex-secretário de Saúde] para executar. Só fomos demiti-lo com dois anos.
Folha - Por quê?
Garreta - Porque ele era uma pessoa respeitada e querida. Ele é um bom teórico e muito pouco prático. Perdemos dois anos apostando que ele iria ser eficiente, ia dar certo. Além disso, pesou uma atitude quase cristã. As pessoas diziam "não podemos fazer isso com o Eduardo Jorge, ele é muito legal". Ele é mesmo respeitado, mas como executivo é uma tragédia.
Folha - Qual o grande mérito desta administração?
Garreta - Resgatar a cidadania para milhares, milhões de pessoas. Ontem [anteontem] eu estava na casa de uma amiga. Ela chegou para a faxineira dela e disse: "Você viu? A Marta perdeu". E a faxineira respondeu: "A Marta não perdeu nada. Ela continua rica, poderosa, bem casada. Quem perdeu fomos nós". Essa frase para mim resume o sentimento da periferia que votou na Marta.
Folha - Como o sr. vê a posição do Arselino Tatto, ameaçando acabar com as taxas do lixo e da luz?
Garreta - O Tatto foi mal-interpretado. A postura do PT é simples: se o Serra quiser rever as taxas amanhã, o PT votará a favor. Apesar de considerar que elas foram necessárias para permitir investimentos na cidade. É engraçado. Primeiro o Serra ia acabar com as taxas. Foi chegando a eleição e ele disse que ia rever. Agora já marcou a revisão para 2006. Ele precisa explicar às pessoas qual compromisso está valendo: o de abril, o de agosto ou o de outubro.
O mesmo vale em relação ao Orçamento. Acho que nós devemos chamar o prefeito eleito e nomear uma equipe para dialogar sobre o Orçamento de 2005. Para ele não poder dizer que o Orçamento não é dele. Quero que ele expresse prioridades. Que diga quanto vai investir no metrô. Quantos CEUs vai fazer.
Folha - Qual a avaliação sobre o programa do Duda Mendonça?
Garreta - O único problema que houve com o Duda foi o atraso em parte do pagamento da produtora. A Executiva Nacional e o Delúbio [Soares, tesoureiro do PT nacional] tinham que executar uma parte e não executaram. Isso fez com que a gente perdesse seis dias da campanha no início do segundo turno. Ficamos cinco dias sem produzir programas.
Folha - E o episódio da prisão do Duda na rinha de galo? Prejudicou?
Garreta - Nenhum impacto. Mas é claro que esse episódio carece de uma investigação mais profunda. A pessoa freqüenta o mesmo lugar há 17 anos, praticando contravenção. Na véspera da eleição, é presa com um aparato típico de quem vai prender um traficante perigoso. Havia lá 60 policiais armados com metralhadora, máscara ninja. Tudo dentro da lei, mas muito estranho.
Folha - Pesou na derrota alguma frustração com o governo Lula?
Garreta - Acho que é um fator secundário. O que não significa que os centros urbanos, São Paulo e Rio, possam ser desconsiderados. Acho que eles lá estão atentos. O governo Lula está no meio do caminho. Seria uma leviandade responsabilizá-lo pela derrota.
Folha - E o Maluf?
Garreta - O Maluf não queria apoiar o Serra de jeito nenhum. Responsabiliza o PSDB pela ação do Ministério Publico. Ele vive o estertor de sua liderança política. Nós fizemos aquilo que achamos razoável. Recebemos o apoio, a declaração de voto.
O pessoal da Executiva Nacional do PT queria vê-lo na televisão com a gente. Tinha gente que queria ele no nosso palanque. Tivemos que pôr o pé na porta.
Folha - A política de alianças da campanha foi muito criticada. Ora porque não trouxe o PMDB ora porque teria sido elástica demais.
Garreta - Veja o caso do Zé Eduardo [José Eduardo Martins Cardozo, deputado federal do PT]. Vi uma entrevista dele criticando as alianças. Mas foi com essas alianças que ele se elegeu presidente da Câmara Municipal duas vezes. As pessoas no PT não podem ser hipócritas.
Folha - O sr. parece muito irritado com certas pessoas no partido.
Garreta - Não é isso. Fico irritado com pessoas que privadamente são uma coisa e outra em público. No privado, vale o raciocínio pragmático. Na hora que acende a luzinha, faz um discurso para a TV. A soberba do poder é um dos problemas de uma parcela do PT.
Folha - Qual parcela?
Garreta - Uma parcela.
Folha - E a mídia?
Garreta - Eu só peço que a mídia trate o Serra com 50% do rigor com que tratou a Marta. A mídia esqueceu que houve o governo Pitta. Esqueceu da situação desastrosa da cidade quando assumimos. E a mídia foi um dos instrumentos de reforço do preconceito contra a Marta. Setores da mídia trataram a Marta com uma agressividade impressionante. Quero ver se os repórteres vão enfiar o gravadorzinho na cara do Serra e perguntar: "Prefeito, fomos no posto de saúde e tem gente jogada na fila". Isso serve para a Folha, serve para o "Estado", serve para o conjunto da mídia.
Folha - O PT deve ter qual atitude em relação ao Serra?
Garreta - O PT deve ajudar o Serra a cumprir tudo o que prometeu. E ele prometeu o céu na terra. A ampliação do Vai-e-Volta, a manutenção dos CEUs, a integração do bilhete único, o investimento no Metrô, o investimento no Rodoanel, a revisão das taxas, as 100 mil vagas em creches. O prefeito Serra terá total apoio do PT para esse conjunto de coisas. E a oposição radical do PT ao tentar destruir essas coisas.
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Quem fala é um dos homens fortes da prefeitura petista e da campanha de Marta, o atual secretário de Abastecimento e Projetos Especiais, Valdemir Garreta.
Pouco conhecido fora do PT, Garreta, 39, é provavelmente, depois do marido, Luis Favre, e do candidato a vice, Rui Falcão, a pessoa mais próxima da prefeita no que se refere à política. Viveu a campanha muito por dentro. Dificilmente há alguém mais informado sobre o que se passou e passa na cozinha do PT municipal.
A entrevista que segue foi realizada ontem, na sede do comitê central de campanha. Um prédio vazio e carregado de tristeza na Vila Mariana. No que revela, Garreta acerta algumas contas. Além de alegar que Suplicy sempre se vitimizou, alimentando a fama da mulher má, diz que o PT nacional atrasou a parte que lhe cabia no pagamento da produtora de Duda Mendonça, que parou por cinco dias no segundo turno.
Fala ainda que pôs o "pé na porta" quando o PT nacional quis incluir Maluf na propaganda de TV e critica "a soberba" de alguns petistas assim que chegaram lá.
Folha - Como a campanha foi pensada e onde ela falhou?
Valdemir Garreta - Sabíamos que seria uma campanha muito difícil. O Datafolha em junho dava 62% para o Serra e 29% para a Marta na projeção de segundo turno. Isso, em votos válidos, queria dizer 68% a 31%. Começamos portanto 37 pontos atrás. E tínhamos noção dos problemas do governo: a forma de implementação das taxas e a questão da saúde. Essas coisas foram galvanizadas pelo preconceito contra a Marta. Um preconceito que foi construído ao longo de três anos e meio.
Folha - Quais são as motivações deste preconceito?
Garreta - Foi determinante a atitude do senador Eduardo Suplicy logo após a separação. Ele se colocou o tempo todo na mídia como vítima, transformando a Marta numa pessoa insensível, arrogante, indiferente ao que ele sentia.
Folha - O sr. pode exemplificar?
Garreta - Em vários momentos ele constrangeu a Marta. Pessoas civilizadas deveriam evitar isso. Ele preferiu aparecer em público, expor o problema. Fez isso em dois ou três momentos da campanha com muita clareza.
Folha - Por exemplo?
Garreta - Uma semana antes do segundo turno, a namorada dele [Mônica Dallari] deu uma entrevista à revista "Veja", da qual ele obviamente tinha ciência. Essa entrevista amplificava todos os preconceitos contra a Marta. E tem quem diga que foi oferecida primeiro a ele, que teria sugerido a Mônica no lugar. Não sei. São bastidores da imprensa.
Folha - Foi deliberado?
Garreta - O Suplicy tem como estratégia sempre se vitimizar. Ele não é uma pessoa ingênua. Tem quase 30 anos de mandatos consecutivos. Não se pode dizer que seja alguém despreparado para a política. Durante a campanha, ele ficou o tempo todo pedindo na produtora para gravar, aparecer. Confirma com o Duda [Mendonça, marqueteiro de Marta].
Quando as dificuldades ficaram mais claras, ele passou a dizer que não concordava com as críticas à ação do Serra, feitas pelo Mercadante [Aloizio Mercadante, líder do governo no Senado]. Ao fazer isso, ao pedir um tom mais propositivo, ele já estava pensando no seu futuro. Ele sabe que uma parcela da classe média que não votou na Marta é eleitora em 2006 para o Senado. Então, ele já está se diferenciando do PT, de olho no voto tucano. É a postura de algumas pessoas do partido: são do PT na hora boa. Na hora má, sempre têm uma crítica pública a fazer.
Folha - Isso é oportunismo?
Garreta - É uma ação calculada. O Eduardo pensa muito nele. Na última semana de campanha, ele ia a quase todos os comícios para repercutir na imprensa a polêmica da "Veja". Não parava de falar. Não acho que estivesse pensando na campanha nem na Marta. Ele reforça a idéia do preconceito. Transforma a Marta numa pessoa má e alimenta a resistência contra o PT. Isso vem de longe.
Folha - Pode fazer um histórico?
Garreta - Durante a campanha da Marta à prefeitura em 2000, quando eles ainda eram casados, ele chegou a marcar uma data para o lançamento da candidatura dele à Presidência. Eu e o Rui [Falcão, candidato a vice na chapa de Marta neste ano] tivemos que ter horas de conversa para demovê-lo. Mostramos a inoportunidade daquilo. No meio do primeiro turno, ele queria disputar com o Lula. Era inconcebível.
Imagina o impacto político disso no PT. Isso corrobora o que eu digo: ele via a eleição da Marta como um instrumento da candidatura presidencial dele. Mas a Marta é muito independente, muito autônoma. Ninguém manda nela. Ele queria um instrumento que na prática não teve. Desde então, o tempo inteiro ele tentou se vitimizar, sem medir as conseqüências para a imagem da Marta.
Folha - A prefeita ficou magoada ou abalada por isso?
Garreta - Não conversei com ela sobre isso. Falo por mim.
Folha - Mas o que o sr. diz é também o que outros pensam no partido. Quais as conseqüências que isso pode ter internamente?
Garreta - O PT é um partido democrático. Do mesmo jeito que o Lula passou por prévias, o Eduardo pode ter que passar. Agora, ele é o nome natural ao Senado, uma liderança expressiva e histórica do PT. Acho apenas que nós precisamos parar de achar que existem pessoas boas e pessoas más. As pessoas são complexas.
Folha - Ele apareceu pouco na propaganda de TV de vocês.
Garreta - Nas pesquisas qualitativas, quando a gente testava os comerciais com ele, as pessoas diziam: "Não usa isso não, vai relembrar a separação". Mas ele ficava lá, pedindo sempre para gravar.
Folha - Além do Suplicy, o que mais pesou na derrota?
Garreta - São Paulo é uma cidade historicamente conservadora e oposicionista. Vota em lideranças conservadoras. Basta citar o Maluf. Além disso, à exceção da eleição do Pitta, a cidade sempre votou na oposição. Mas, mesmo perdendo, a Marta e o PT saem do governo bem consolidados na periferia. Só não saem mais por causa do problema na saúde.
Folha - O sr. reconhece um equívoco do governo na área da saúde?
Garreta - Claro. Um ano depois que a Marta assumiu nós tínhamos o diagnóstico da incapacidade do Eduardo Jorge [ex-secretário de Saúde] para executar. Só fomos demiti-lo com dois anos.
Folha - Por quê?
Garreta - Porque ele era uma pessoa respeitada e querida. Ele é um bom teórico e muito pouco prático. Perdemos dois anos apostando que ele iria ser eficiente, ia dar certo. Além disso, pesou uma atitude quase cristã. As pessoas diziam "não podemos fazer isso com o Eduardo Jorge, ele é muito legal". Ele é mesmo respeitado, mas como executivo é uma tragédia.
Folha - Qual o grande mérito desta administração?
Garreta - Resgatar a cidadania para milhares, milhões de pessoas. Ontem [anteontem] eu estava na casa de uma amiga. Ela chegou para a faxineira dela e disse: "Você viu? A Marta perdeu". E a faxineira respondeu: "A Marta não perdeu nada. Ela continua rica, poderosa, bem casada. Quem perdeu fomos nós". Essa frase para mim resume o sentimento da periferia que votou na Marta.
Folha - Como o sr. vê a posição do Arselino Tatto, ameaçando acabar com as taxas do lixo e da luz?
Garreta - O Tatto foi mal-interpretado. A postura do PT é simples: se o Serra quiser rever as taxas amanhã, o PT votará a favor. Apesar de considerar que elas foram necessárias para permitir investimentos na cidade. É engraçado. Primeiro o Serra ia acabar com as taxas. Foi chegando a eleição e ele disse que ia rever. Agora já marcou a revisão para 2006. Ele precisa explicar às pessoas qual compromisso está valendo: o de abril, o de agosto ou o de outubro.
O mesmo vale em relação ao Orçamento. Acho que nós devemos chamar o prefeito eleito e nomear uma equipe para dialogar sobre o Orçamento de 2005. Para ele não poder dizer que o Orçamento não é dele. Quero que ele expresse prioridades. Que diga quanto vai investir no metrô. Quantos CEUs vai fazer.
Folha - Qual a avaliação sobre o programa do Duda Mendonça?
Garreta - O único problema que houve com o Duda foi o atraso em parte do pagamento da produtora. A Executiva Nacional e o Delúbio [Soares, tesoureiro do PT nacional] tinham que executar uma parte e não executaram. Isso fez com que a gente perdesse seis dias da campanha no início do segundo turno. Ficamos cinco dias sem produzir programas.
Folha - E o episódio da prisão do Duda na rinha de galo? Prejudicou?
Garreta - Nenhum impacto. Mas é claro que esse episódio carece de uma investigação mais profunda. A pessoa freqüenta o mesmo lugar há 17 anos, praticando contravenção. Na véspera da eleição, é presa com um aparato típico de quem vai prender um traficante perigoso. Havia lá 60 policiais armados com metralhadora, máscara ninja. Tudo dentro da lei, mas muito estranho.
Folha - Pesou na derrota alguma frustração com o governo Lula?
Garreta - Acho que é um fator secundário. O que não significa que os centros urbanos, São Paulo e Rio, possam ser desconsiderados. Acho que eles lá estão atentos. O governo Lula está no meio do caminho. Seria uma leviandade responsabilizá-lo pela derrota.
Folha - E o Maluf?
Garreta - O Maluf não queria apoiar o Serra de jeito nenhum. Responsabiliza o PSDB pela ação do Ministério Publico. Ele vive o estertor de sua liderança política. Nós fizemos aquilo que achamos razoável. Recebemos o apoio, a declaração de voto.
O pessoal da Executiva Nacional do PT queria vê-lo na televisão com a gente. Tinha gente que queria ele no nosso palanque. Tivemos que pôr o pé na porta.
Folha - A política de alianças da campanha foi muito criticada. Ora porque não trouxe o PMDB ora porque teria sido elástica demais.
Garreta - Veja o caso do Zé Eduardo [José Eduardo Martins Cardozo, deputado federal do PT]. Vi uma entrevista dele criticando as alianças. Mas foi com essas alianças que ele se elegeu presidente da Câmara Municipal duas vezes. As pessoas no PT não podem ser hipócritas.
Folha - O sr. parece muito irritado com certas pessoas no partido.
Garreta - Não é isso. Fico irritado com pessoas que privadamente são uma coisa e outra em público. No privado, vale o raciocínio pragmático. Na hora que acende a luzinha, faz um discurso para a TV. A soberba do poder é um dos problemas de uma parcela do PT.
Folha - Qual parcela?
Garreta - Uma parcela.
Folha - E a mídia?
Garreta - Eu só peço que a mídia trate o Serra com 50% do rigor com que tratou a Marta. A mídia esqueceu que houve o governo Pitta. Esqueceu da situação desastrosa da cidade quando assumimos. E a mídia foi um dos instrumentos de reforço do preconceito contra a Marta. Setores da mídia trataram a Marta com uma agressividade impressionante. Quero ver se os repórteres vão enfiar o gravadorzinho na cara do Serra e perguntar: "Prefeito, fomos no posto de saúde e tem gente jogada na fila". Isso serve para a Folha, serve para o "Estado", serve para o conjunto da mídia.
Folha - O PT deve ter qual atitude em relação ao Serra?
Garreta - O PT deve ajudar o Serra a cumprir tudo o que prometeu. E ele prometeu o céu na terra. A ampliação do Vai-e-Volta, a manutenção dos CEUs, a integração do bilhete único, o investimento no Metrô, o investimento no Rodoanel, a revisão das taxas, as 100 mil vagas em creches. O prefeito Serra terá total apoio do PT para esse conjunto de coisas. E a oposição radical do PT ao tentar destruir essas coisas.
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