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03/09/2004 - 05h00

Hominídeo de 6 milhões de anos era bípede

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CLAUDIO ANGELO
Editor de Ciência da Folha de S.Paulo

O fóssil de ancestral humano mais controverso do mundo volta a causar polêmica. Um estudo publicado hoje afirma que o Orrorin tugenensis já andava sobre dois pés há 6 milhões de anos. Se confirmada, a descoberta recuará em 1,5 milhão de anos a origem da família humana. Mas há cientistas que duvidem dela.

Encontrado nos montes Tugen, Quênia, em 2000, o Orrorin causou furor quando foi apresentado à imprensa naquele ano. A espécie, representada por fragmentos de dente, ossos da perna e mandíbulas, seria o ascendente mais antigo da humanidade.

Seus descobridores, os franceses Martin Pickford, do Collège de France, e Brigitte Senut, do CNRS (Centro Nacional para a Pesquisa Científica), o apelidaram de "Homem do Milênio", e só viriam a descrever oficialmente os fósseis no ano seguinte. A pressa em trombetear a descoberta antes de fazê-la passar pelo crivo de outros cientistas gerou desconfiança na comunidade acadêmica.

"Eles sempre negaram a outros pesquisadores acesso ao fóssil", disse à Folha o paleontólogo Daniel Lieberman, da Universidade Harvard (Estados Unidos).

Mesmo assim, Pickford e Senut insistiam em afirmar que as características anatômicas do Orrorin o aproximavam mais do homem moderno do que os australopitecos, grupo do qual teria evoluído o gênero Homo.

A dupla francesa nunca havia conseguido convencer os paleoantropólogos de seus argumentos. Hoje, um estudo no periódico científico "Science" (www.sciencemag.org) começa a mudar a história. Uma tomografia computadorizada feita no único pedaço de fêmur mais ou menos completo do Orrorin tugenensis indica que o animal, do tamanho de um chimpanzé, era provavelmente um bípede.

Pescoço revelador

O exame foi feito por uma equipe norte-americana, liderada por Robert Eckhardt, da Universidade do Estado da Pensilvânia. Olhando por dentro da cabeça do fêmur (parte do osso em forma de bola que se encaixa na bacia) e do "pescoço" que a liga ao restante do osso, a equipe de Eckhardt descobriu um detalhe fundamental: o tal pescoço é mais espesso na parte de baixo do que na de cima.

Dito assim, parece bobagem. Mas esse detalhe é o que separa primatas bípedes, como o homem e seus ancestrais, de semibípedes ou quadrúpedes como chimpanzés e gorilas. Isso porque o ponto máximo de tensão num animal que anda sobre duas pernas é na parte inferior da junção do fêmur, que precisa de um reforço. "Em chimpanzés e gorilas, a espessura das partes superior e inferior do osso são iguais", disse Eckhardt. "Em humanos, o osso em cima é mais delgado que embaixo a uma razão de um para quatro ou mais. A razão nesse fóssil é de um para três", diz. "Eu poderia ver uma linha ligando o Orrorin aos humanos atuais."

Caso encerrado? De jeito nenhum. "A espessura do fêmur é indicativo de bipedalismo, não diagnóstico", diz Lieberman. Segundo ele, as tomografias realizadas são de "péssima qualidade", o que pode comprometer a análise.

Eckhardt reconhece que a tomografia não é perfeita. "É o que você esperaria de espécimes quebrados de 6 milhões de anos. É maravilhoso que tenhamos podido observar tanta coisa."

Lieberman trabalha com o arquirrival de Senut, o também francês Michel Brunet, que em 2002 descreveu outro suposto ancestral humano antigo, o Sahelanthropus, de 7 milhões de anos.

A equipe de Brunet deve publicar em breve uma análise de seu fóssil, que
tentará responder também à questão do bipedalismo, o que pode rebaixar o Orrorin a apenas mais um galho na árvore genealógica humana.

Especial
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