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21/02/2002 - 14h23

Vacina combate toxoplasmose em roedor

REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

Pesquisadores americanos aproveitaram-se de uma aparente vantagem evolutiva do Toxoplasma gondii, micróbio que causa a toxoplasmose, para criar um novo princípio de vacina contra ele. De quebra, o estudo aponta um novo caminho para derrotar parentes distantes e muito mais terríveis do protozoário, como o plasmódio, causador da malária.

A fraqueza explorada é a capacidade parcial do parasita de produzir o próprio DNA sem a ajuda de seu hospedeiro. Alterando o código genético do Toxoplasma gondii, os cientistas impediram que ele fizesse sua síntese de DNA, tornando-o inócuo, mas capaz de imunizar camundongos.

O biólogo David Bzik, autor principal do estudo que sai hoje na revista científica "Nature" (www.nature.com), começou a estudar o parasita como um modelo para criar novas estratégias contra a malária e acredita no potencial da pesquisa nesse campo. "Nossos achados devem ser aplicáveis em outros protozoários, especialmente no da malária. É possível que desativar a enzima da síntese também crie cepas inofensivas dele", disse Bzik à Folha.

Ao longo de sua bem-sucedida carreira evolutiva, durante a qual o T. gondii se adaptou às células de boa parte dos mamíferos (incluindo o homem, as ovelhas e os gatos), o parasita deixou de lado a produção autônoma das purinas, um dos tipos de base (tijolos químicos) que formam o DNA e o RNA. O micróbio ainda é capaz de produzir por si só as pirimidinas, que formam a outra classe de bases do código genético.

Entretanto, o T. gondii também criou um esquema que recolhe do meio em que vive a uracila, uma pirimidina, e a armazena para utilizá-la ou para construir as outras bases dessa classe, a citosina e a timina (as letras C e T do DNA).

Com essa proteção dupla, tudo estaria às mil maravilhas para o invasor se não fosse por um detalhe: Bzik e Barbara Fox, da Escola Médica de Dartmouth (EUA), notaram que o suprimento livre de uracila, a peça para a síntese de pirimidinas do T. gondii, não é abundante nas células animais.

Isso explica porque o microrganismo precisou manter ativo o próprio sistema de síntese pirimídica. E deu aos cientistas a idéia de desativar o gene do micróbio que comandava a síntese.

Parasita alterado

O famigerado gene codifica a produção da enzima CPSII, desencadeadora da produção das bases pirimídicas. Com esse trecho do código genético posto para dormir, o T. gondii teve sua capacidade de síntese de DNA grandemente golpeada, ficando dependente de um suprimento de uracila fornecido pelos pesquisadores para continuar se multiplicando.

Entretanto, a situação in vivo (ou seja, dentro do corpo dos camundongos) era bem diferente: sem matéria-prima, a síntese de pirimidinas do T. gondii caía, e o parasita não conseguia realizar sua reprodução assexuada.

"Não dá para saber a razão, mas é assim. Os mamíferos estabeleceram um metabolismo de nucleotídeos [as unidades mínimas da molécula de DNA] no qual a uracila aparentemente não é importante", disse Bzik. Seja lá como for, a cepa capenga do T. gondii foi capaz de imunizar camundongos saudáveis, e mesmo roedores com baixa resposta do sistema de defesa do organismo.

Caminho à frente

Heitor Franco de Andrade Júnior, da Faculdade de Medicina da USP, diz que a pesquisa de Bzik é interessante e produziu um bom modelo de imunização, mas que tem como defeito a necessidade de introduzir o parasita no organismo. "O fato de injetarem o Toxoplasma gondii, quando nós sabemos que a infecção acontece por via oral, é uma limitação", afirma o pesquisador.

Andrade explica que o causador da toxoplasmose, embora infecte cerca de 60% dos adultos no Brasil, é um parasita bem-sucedido por raramente causar a morte do hospedeiro humano. Na grande maioria dos casos ele fica silencioso no organismo, sobrevivendo em pequeno número, sem causar os sintomas da doença.

De acordo com Andrade, já existe uma vacina contra o T. gondii usada em ovelhas e porcos na Nova Zelândia. A carne desses animais, contaminada pelo parasita e consumida por seres humanos, é uma das principais fontes da infecção. A outra fonte de infecção são fezes de gato, que é o hospedeiro final do micróbio.
 

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