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sul da bahia
05/08/2004
Projeto Índio quer Paz resgata e preserva cultura indígena

"A nossa realidade é difícil e constrangedora. A população não dá o respeito que é preciso e merecemos. Nos tratam como bichos. Isso já acarretou muitos danos para a nossa comunidade. Desde 1988, mesmo com a Constituição, perdemos mais de 15 lideranças em mortes bárbaras. Muitas vezes, nem sabemos quem matou porque eles foram assinados a caminho da aldeia".

O depoimento é da índia Margarida Rocha de Oliveira, do povo Pataxó-hã-hã-hãe -comunidade indígena da família lingüística maxacali, tronco macro-jê, habitantes do Sul da Bahia, mas especificamente dos municípios de Prado, Porto Seguro, Santa Cruz de Cabrália, Pau Brasil, Itajú da Colônia e Itabuna. Margarida, que é professora, faz um retrato da situação do índio no Brasil, principalmente em regiões em que o domínio pela terra é mais evidente.

Nos últimos anos, a rivalidade étnica a que ela se depara diariamente se agravou, provocando conflitos constantes na região entre índios e não índios, principalmente com a população de Pau Brasil. Com a proposta de transformar essa realidade e de melhorar a relação entre as comunidades indígenas e brancas, buscando o respeito mútuo à cultura e à educação, a organização não-governamental Thydêwá desenvolveu o projeto "Índio Quer Paz", que conta com o apoio institucional da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), e patrocínio da Brazil Foundation.

A Thydêwá trabalha para o resgate, a preservação, a defesa e a valorização da cultura indígena. A iniciativa pretende criar uma nova cultura de paz na região e acabar com o preconceito. "Sabemos que não será de forma rápida que iremos conseguir mudar essa realidade. Historicamente, os índios sempre foram vistos como escravos e têm muitos problemas com os donos das terras, pois estas não são demarcadas e também devido ao poder e dinheiro envolvidos. Mas os Pataxós são um povo necessitado de respeito e estão buscando os seus direitos", assegura Sebastian Gerdic, presidente da organização e coordenador do projeto.

Para alcançar essa nova mudança de postura e convivência pacífica, o projeto, que se inicia no mês de agosto, irá capacitar 32 professores e 10 lideranças indígenas para atuarem como agentes da paz e mediadores de conflito. O grupo irá tratar de questões como os direitos universais e buscar alternativas para se resolver os conflitos com o diálogo.

Primeiramente, será realizado um trabalho entre os índios para fortalecer a união dos Pataxós, pois contam com seis etnias e cerca de 2500 índios. Em seguida, os índios irão fazer visitas às escolas para falar sobre sua realidade, costumes e perdas. A meta é atingir cerca de 10 mil alunos. "Acredito que o projeto veio em ótimo momento. Esse contato é um dos melhores meios para se quebrar as barreiras existentes. Por isso, nas nossas escolas, já procuramos trabalhar, além da nossa cultura, também a realidade da sociedade lá fora", ressalta Margarida.

No projeto, que terá duração de um ano, serão realizadas ainda atividades que promovam a integração entre os diversos atores sociais da comunidade, como reuniões entre índios e moradores da região, encontros de sensibilização com autoridades locais e a criação de conselhos. A arte e a cultura também serão ferramentas importantes para a promoção do intercâmbio entre os povos. A iniciativa prevê a realização de eventos culturais, em que os moradores possam conheçam as aldeias, e os índios visitem teatros e museus. "A idéia é que todos caminhem juntos nisso, pois são ações não só em benefício do índio, mas de toda a sociedade. Afinal, os moradores também sofrem com estes problemas. A região é vista como um lugar perigoso", comenta Sebastian.

Índio quer respeito
O projeto é um dos resultados da "Campanha Índio quer Respeito", coordenada pela Thydêwá e executado pelos Tupinambás, em Ilhéus (BA), durante uma semana no mês de março de 2003. Na ocasião, foram promovidas dinâmicas de conscientização com os índios com o tema direitos humanos, palestras sobre as formas pacíficas de retomar a terra e o respeito às diferenças culturais. A campanha contou também com visitas às escolas da região, em que os índios trocavam idéias com os alunos e apresentavam cantos e danças sagrados. As atividades tiveram ainda a participação de autoridades locais e da Funai (Fundação Nacional do Índio). Segundo os organizadores da Campanha, mais de 20 mil alunos se envolveram no evento.

A cacique Tupinambá Jamopoty lembra que, apesar de os índios terem sido bem recebidos pelos estudantes, muitos deles não sabiam que as aldeias estavam a apenas 18 km dali. Os "palestrantes" procuraram apresentar aos alunos o que é ser índio, quais os costumes, valores e sofrimentos do povo. "Procuramos dizer a eles que desejamos respeito a que temos direito e como queríamos nos relacionar. Mostramos o quanto a terra é essencial para a nossa vida, mas que não estamos aqui para roubá-las", conta.

De acordo com a cacique, a campanha já trouxe para a região mudanças de atitudes e posturas. "Antes éramos vaiados o tempo todo na cidade. Isso melhorou 100%. Tínhamos muitos problemas com a prefeitura local e os fazendeiros da região. Acredito que com as atividades nos aproximamos mais dos moradores e isso abriu muitas portas para nós", destaca Jamopoty.

A ONG Thydêwá realiza ainda diversas outras ações com os índios da Bahia para garantir a preservação da cultura e a convivência pacífica com a população local, como o projeto "Índios na Visão dos Índios", uma coleção de sete livros, com fotos e depoimentos, escritos por eles mesmos. A idéia, de acordo com Sebastian, é mostrar à sociedade que não são apenas os grandes pesquisadores e historiadores que podem escrever sobre a questão indígena. "Os índios também podem contar a sua própria história".

É também da Thydêwá o projeto "Irmãos em um Mundo", uma série de vídeos documentários que mostram o intercâmbio entre membros de duas comunidades sob a perspectiva e visão dos próprios índios.

Uma atividade que vem sendo desenvolvida com sucesso, desde 2001, é o projeto Índio On-Line. São mais de sete comunidades dos Estados da Bahia, de Pernambuco e de Alagoas, com cerca de 4 mil índios cada, interligadas pela Internet. As comunidades formaram um grupo de estudo e trabalho a fim de buscar o seu desenvolvimento e melhoria na educação, saúde, alimentação. Além disso, os índios têm a possibilidade de mostrar ao mundo a sua cultura. "E quando eles fazem isso, geram um novo conhecimento, buscando um entendimento diferente. Uma nova realidade", explica Sebastian.



DANIELE PRÓSPERO
do site setor3

 
 
 

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