Candidatos
não têm políticas de apoio à pesquisa tecnológica
Os candidatos
à Presidência da República ainda não
conseguiram apresentar uma proposta clara e eficiente para resolver
um problema fundamental da ciência brasileira: integrar a
indústria e a universidade para desenvolver, de forma mais
eficiente, a pesquisa tecnológica. A opinião é
de Sérgio Henrique Ferreira, um dos mais celebrados cientistas
do país.
O farmacólogo
Ferreira, 67, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto, da USP, foi eleito recentemente para a prestigiosa Academia
Nacional de Ciências dos EUA, sendo o quarto brasileiro a
fazer parte dela, graças a seus trabalhos na pesquisa da
dor e da hipertensão. Segundo ele, os candidatos afirmam
que é necessário promover a associação
entre universidade e indústria. No entanto, nenhum deles
fez essa proposta de forma clara, dizendo que o desenvolvimento
é de responsabilidade industrial e do governo.
Com experiência,
critica o que se faz na Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp): "investir
para que uma universidade execute o desenvolvimento de um produto
para uma indústria é uma deseducação
do sistema". Ele alega que não se pode pôr um
estudante que vai fazer uma pós-graduação para
desenvolver uma patente da qual ele não será proprietário.
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mais:
- Cientista critica política de presidenciáveis
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Cientista
critica política de presidenciáveis
Os candidatos
à Presidência da República ainda não
conseguiram apresentar uma proposta clara e eficiente para resolver
um problema fundamental da ciência brasileira: integrar a
indústria e a universidade para desenvolver, de forma mais
eficiente, a pesquisa tecnológica. A opinião é
de Sérgio Henrique Ferreira, um dos mais celebrados cientistas
do país.
O farmacólogo
Ferreira, 67, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto, da USP, foi eleito recentemente para a prestigiosa Academia
Nacional de Ciências dos EUA, sendo o quarto brasileiro a
fazer parte dela, graças a seus trabalhos na pesquisa da
dor e da hipertensão.
Ex-presidente
da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência),
ele concedeu entrevista à Folha durante a 54ª Reunião
Anual da entidade, realizada na semana passada, em Goiânia.
Apesar de reconhecer
que os projetos genoma no país, especialmente em São
Paulo, tiveram méritos, Ferreira critica essa atividade:
"Fazer genoma não é ciência, é meia
ciência". Leia, a seguir, trechos da entrevista.
O senhor já
avaliou as propostas dos candidatos à Presidência para
a área de Ciência e Tecnologia? O que achou delas?
Sérgio Henrique Ferreira - Já ouvimos os candidatos
falando e já deu para perceber que não encontramos
nenhuma novidade nas suas propostas. Todos dizem que ciência
é importante e que é necessário promover a
associação entre universidade e indústria.
Mas nenhum deles fez essa proposta de forma clara, dizendo que o
desenvolvimento é de responsabilidade industrial e do governo,
que deve estimular por meio de seus órgãos de fomento
e dos ministérios o desenvolvimento tecnológico. Não
basta forçar a união da universidade com a indústria
de e achar que isso vai resolver.
Não adianta,
por exemplo, a Fapesp (Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo) investir para que uma universidade
execute o desenvolvimento de um produto para uma indústria.
Isso é uma deseducação do sistema. Não
se pode pôr um estudante que vai fazer uma pós-graduação
para desenvolver uma patente da qual ele não será
proprietário.
Mas há
casos de universidades que esbarram, até sem querer, em um
composto que é interessante e querem patenteá-lo.
Ferreira - Isso ocorre frequentemente. Muitas idéias estão
na universidade, mas não é ela que faz o desenvolvimento.
A universidade chega a um protótipo. Ela chega a uma idéia
de como se faz o raio laser ou um novo analgésico. Essa é
a visão do desenvolvimento científico universitário.
Pegar esse possível medicamento e fazer com que ele chegue
ao mercado é função de um sistema que saiba
indicar o desenvolvimento tecnológico. É o que a indústria
tem.
Resolver a questão
da integração harmônica entre a universidade
e a indústria é mesmo um problema simples?
Ferreira - É um problema simples, mas de decisão estratégica.
Não basta dizer que o Ministério da Ciência
e Tecnologia fará esse desenvolvimento. É preciso
envolver outros órgãos de governo. O Ministério
da Saúde deve pensar em desenvolvimento de fármacos
a partir de plantas. Uma fração pequeníssima
de investimento desse ministério seria uma verba maior do
que a do CNPq.
O governo atual
não tentou ampliar essa associação por meio
dos fundos setoriais de investimento em pesquisa?
Ferreira -Esse governo imaginou os fundos setoriais como sendo o
processo que reorganizaria o investimento em ciência. Mas
o maior problema que nós temos de compreender é o
que se quer com a associação entre universidade e
empresa. O que caracteriza uma indústria inovadora é
ter laboratórios. Isso não acontece como política
de desenvolvimento tecnológico no Brasil. Pode ocorrer somente
na Petrobras, na Embraer e na Vale do Rio Doce, que são instituições
que já cresceram dentro de um prisma de visão nacionalista,
refletindo idéias nacionalistas do governo militar.
Não é curioso que hoje a SBPC, que sempre combateu
o regime militar, veja hoje aspectos positivos dessa época?
Ferreira - As coisas sempre têm seu ponto negativo e positivo.
O interessante no caso do regime militar é a gente analisar
porque eles caíram na América Latina. Na minha opinião,
foi porque os Estados Unidos perceberam que os militares latino-americanos
eram nacionalistas. O mercado jamais seria aberto com um governo
nacionalista. Os militares, mesmo estando errados em alguns casos
na proteção ao mercado, não iam abrir facilmente
a economia.
Muitos cientistas são chamados de pessimistas quando reclamam
da estrutura da universidade pública brasileira, que concentra
as pesquisas. Como explicar que um sistema tão criticado
tenha sido capaz de desenvolver um projeto como o genoma?
Ferreira - Fazer genoma não é ciência,
é meia ciência. É o desenvolvimento de uma técnica
que não requer nenhuma hipótese. Desenvolver é
resolver problemas. Se o objetivo dessa rede [financiada pela Fapesp
para sequenciar o genoma da bactéria causadora da praga do
amarelinho, que ataca laranjas" era resolver o problema do
amarelinho, essa rede falhou.
Exemplificando,
é como se uma fábrica, para resolver o problema de
um indivíduo que não consegue entrar em casa porque
perdeu a chave, produzisse 3,8 milhões de chaves diferentes
e entregasse a ele como solução para o problema. Você
tem de fazer o oposto: descobrir o problema e procurar o gene que
o causa. Será que é preciso decifrar o genoma de tudo
para resolver um problema? Essa é a falácia da direção
da Fapesp. Isso não quer dizer que o projeto não tenha
sido importante, já que alguns setores puderam aproveitar
muito da experiência e do desenvolvimento de softwares da
área. Mas a visão da bola de neve que isso está
tendo é problemática. Quando isso vai terminar?
(Folha de
S. Paulo)
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